Por Ana Julia Mezzadri
Investing.com - Todas as características mais marcantes de uma bolha estão presentes hoje nos mercados financeiros: financiamento barato, acesso fácil a investimentos, incentivo a engajar em atividades especulativas e faíscas tecnológicas ou políticas.
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Ainda assim, segundo o UBS, em relatório distribuído nesta sexta-feira (15), argumenta que os mercados financeiros não estão, como um todo, em uma bolha. O banco ressalta, no entanto, que uma série de movimentos devem ser observados, e que identificar as bolhas enquanto elas ainda estão ocorrendo é muito desafiador.
Mercado de ações
As ações dos EUA tiveram 21% de retorno em 2020. No mundo todo, esse retorno foi de 16%. Tudo isso faz com que as ações pareçam muito caras sob a ótica de Preço/Lucro. Desde 1880, a relação preço/lucro ajustada ciclicamente (Cape) dos EUA só esteve maior em 1929 e 1999-2000: ou seja, logo antes de crashes do mercado.
Além disso, o rali recente dos papéis coincidiu com a entrada de novos investidores nos mercados. Nos Estados Unidos, os investidores de varejo hoje correspondem a 20% do mercado.
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A atividade de opções e o crescimento no mercado de SPACs (Special Purpose Acquisition Company) indicam uma disposição do mercado a “comprar futuro”, apontando para um sentimento otimista.
Ainda que reconheça que todas essas razões possam levantar preocupação, o UBS não acredita que as ações, como um todo, estejam em uma bolha.
Isso porque, primeiramente, a alavancagem permanece contida, apesar de poder crescer rapidamente a qualquer momento. A alta volatilidade do mercado ajudou a prevenir o endividamento.
Em segundo lugar, grande parte do mercado não está cara na comparação histórica: nos EUA, se desconsideradas as ações FAAMNG - Facebook (NASDAQ:FB) (SA:FBOK34); Amazon (NASDAQ:AMZN) (SA:AMZO34); Apple (NASDAQ:AAPL) (SA:AAPL34); Microsoft (NASDAQ:MSFT) (SA:MSFT34); Netflix (NASDAQ:NFLX) (SA:NFLX34); Google (NASDAQ:GOOGL) (SA:GOGL34) - o S&P 500 subiu apenas 6% no ano passado. Além disso, o Cape está perto ou até abaixo das médias de longo prazo em todos os principais mercados exceto os EUA, onde os valuations foram distorcidos pelas ações de mega capitalização.
Finalmente, a taxa de juros em patamares baixíssimos ajuda a justificar os valuations dos índices de ações.
Títulos do governo
Apesar de essa não ser uma discussão nova, a impressão de mais de US$ 8 trilhões em 2020 por bancos centrais ao redor do mundo para apoiar a recuperação econômica aumentou os temores de uma bolha no mercado de títulos.
De fato, aponta o UBS, também esse mercado apresenta uma série de fatores característicos de uma bolha, como o ingresso de novos participantes no mercado (bancos centrais), alavancagem (nos balanços dos bancos centrais), especulação (que a flexibilização irá funcionar), compromissos futuros e preços em altas recorde.
No entanto, as bolhas tendem a estourar depois de mudanças repentinas no sentimento dos compradores, falta de novos fundos ou mudanças regulatórias — o que não é o caso, visto que os bancos centrais têm capacidade quase ilimitada de manter suas políticas.
O fator catalisador, então, teria de ser o recuo dos bancos centrais, sobretudo o Federal Reserve. Isso, na visão do UBS, não deve ocorrer tão cedo, pois não há ameaça de inflação.
Criptomoedas
O mercado mais perto de uma bolha, na visão do banco, é o de criptomoedas.
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Avaliar as criptomoedas de uma maneira tradicional pode ser desafiador, na visão do UBS. Porém, é possível identificar uma série das características de bolha no recente rali cripto. Em primeiro lugar, elas podem ser consideradas uma “compra futura”, pois seus usos ainda estão sendo desenvolvidos.
Além disso, o ingresso de novos participantes no mercado é impressionante. Dados mostram que um milhão de novas carteiras foram criadas nos últimos três meses — a mesma quantidade criada em todo o ano anterior. Isso significa, para o UBS, que muitos deles foram atraídos pelos preços crescentes.
Houve crescimento também na atividade especulativa. É possível identificar um aumento significativo no número de usuários diários.
Nesse sentido, com volatilidade semanal do Bitcoin excedendo a volatilidade anual das ações, o banco alerta: “Dito isso, com preços parecendo estar sendo guiados mais por especulação do que por fundamentos, os investidores que buscam proteger e aumentar sua riqueza devem ter cautela extrema”.
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IPOs e SPACs
Finalmente, o ano de 2020 viu um boom nas atividades de IPOs e SPACs. “Nos EUA, um recorde de mais de US$ 65 bilhões foi levantado em IPOs em 2020. O mercado chinês de IPOs foi ainda mais aquecido, com cerca de US$ 100 bilhões levantados. Lembretes da era dotcom são claros.”
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Segundo o UBS, no entanto, esse mercado ainda é pequeno demais para ter consequências sistêmicas, mesmo que o sentimento mude e o mercado desacelere. O total do mercado de IPOS é de algumas centenas de bilhões, enquanto o mercado de ações vale US$ 34 trilhões. Além disso, a alavancagem usada para esses investimentos é limitada.