A maioria das pessoas (eu e você incluídos) tende a ter expectativas mais extremas do que a realidade dos fatos. O que causa isto? Ansiedade. Baldes de ansiedade causada por um mundo intrinsicamente incerto que nos cerca. E um atalho mental que costumamos usar para diminuir a sensação de incerteza: a “heurística da confirmação”. Vamos tentar entender melhor esse mecanismo que infla nossas expectativas em relação a eventos futuros.
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Geralmente, tomamos decisões com base em estimativas, dada a incerteza inerente ao futuro. Para estimar, é comum se criar cenários de como as coisas poderiam ocorrer. O problema é que tais cenários costumam ser pintados por nós com cores fortes, muito mais radicais (positiva ou negativamente) do que o desenrolar real dos acontecimentos.
Funciona mais ou menos assim: um cenário inicial é criado dentro de nosso cérebro, dentre as diferentes possibilidades. Como seres humanos não gostam de incerteza, nossa imaginação, depois da escolha desse cenário inicial, se “apaixona” por ele e começa a criar ideias que o reforcem (a heurística da confirmação funcionando). E o cenário vai se radicalizando sem darmos conta.
Isto é um problema? Pode até não vir a ser, mas muitas vezes será, com diferentes impactos psicológicos e práticos para nossas vidas.
Se o cenário pintado for negativo, pode ocorrer algo útil: vamos nos preparar melhor para enfrentar uma situação que julgamos difícil pela frente. Quem nunca chegou em uma prova tão preparado que até se decepcionou com a facilidade que encontrou? Bem, talvez eu tenha sido um aluno um pouco mais ansioso que a média, mas esse foi um fato muito corriqueiro em meus anos de estudante.
Outro exemplo: Eu me lembro quando precisei fazer aquela famosa entrevista para renovar o visto na Embaixada Americana. Levei uma série de documentos para provar que tinha uma vida bem estabelecida no Brasil, até mesmo saldos bancários. Na hora da entrevista, a funcionária da embaixada, ao ler “professor" na minha ficha, apenas perguntou sorrindo: “Seus alunos são legais?”. Eu balbuciei: “São…” e saí de lá com o visto em poucos segundos.
O risco aqui, então, é apenas o de perder tempo com uma preparação desnecessária. Mas se o desenrolar do evento em questão for importante para nossas vidas, acho que está valendo o excesso de zelo. Neste caso a expectativa exagerada atua como um motivador para uma preparação mais cuidadosa. Entretanto, se exageramos demais, podemos criar em nossa cabeça um cenário tão assustador que causará a sensação de impotência perante eventos futuros, insônia, angústia extrema e a incapacidade de lidar com a situação. Nada bom.
Por outro lado, quando nosso cérebro se fixa em construir e potencializar um cenário irrealisticamente positivo, também podem acontecer duas coisas: ou vamos chegar mal preparados para algo que merecia mais atenção, ou vamos nos frustrar com o desenrolar de fatos aquém da epifania que aguardávamos ansiosamente. Anticlímax total.
Em relação aos nossos investimentos financeiros, este é um viés bem preocupante. Expectativas exageradamente otimistas podem desanimar investidores apressados, quando os resultados não se materializarem na velocidade esperada. A chance de sair antes do tempo é enorme. Em crises, expectativas exageradamente pessimistas também podem levar a movimentações imprudentes, realizando prejuízos que poderiam ser evitados com um pouco mais de calma. Outras vezes, quem tem expectativas pessimistas não espera retorno, não acredita e, por isso, não investe, perdendo boas oportunidades. Será que você se encaixa em alguma dessas categorias?
Nossas estimativas do futuro carecem de maior realismo e podem acabar apontando para direções erradas. Além disso, podemos não ter toda a informação pertinente ou, pior, partir de informações erradas. Quando o cenário futuro estiver ligado de alguma forma à nossa autoestima, as chances de exageros (positivos ou negativos) ficam ainda maiores. Em suma, maior incerteza agrava a situação, bem como a percepção de potencial para vergonha ou culpa.
Assim, na próxima apresentação que você tiver que fazer para algum público importante (por exemplo, apresentar aquele seu projeto para a diretoria) tente construir cenários mais ponderados. Você terminar a apresentação sendo demitido é tão pouco provável quanto terminar carregado em euforia e apontado para suceder o presidente de sua empresa. Prepare-se na medida adequada e evite excessos de ansiedade.
Como eu faço no meu próprio dia-a-dia? Se noto que estou ficando muito pessimista ao imaginar acontecimentos futuros, tento parar e me perguntar: “e se as coisas derem certo?”. Por outro lado, quando pareço estar usando lentes “cor-de-rosa” em minha visão do que vai acontecer, começo a pensar no que realmente pode dar errado.
Funciona? Às vezes. Ansiedade e até uma noite mal dormida ocasional continuam fazendo parte da minha vida, bem como excessos de preparação. Como todo conselho, é mais fácil falar do que fazer. Mas, sem dúvida dá para fazer melhor do que se continuarmos completamente alheios ao viés das “expectativas exageradas”. É importante estar preparado para falhar e para encarar a frustração caso as coisas não ocorram da maneira como você espera. Não deixe que o medo te paralise.
Tente praticar ficar mais consciente quanto a isso ao menos por uma semana!
P.S: Ao escrever este texto, me equilibrei entre a percepção que estaria escrevendo para absolutamente ninguém ler e o devaneio que seria imediatamente convidado para escrever um best-seller sobre o assunto. Persisti e se alcançar meus dezessete leitores habituais já terá valido a pena. Se você gostou e quiser ler sobre outros vieses que nos fazem tomar decisões erradas, me conte.
*Luís Antônio Dib é professor do quadro permanente do COPPEAD, consultor e palestrante. Ele é mestre e doutor em Administração, além de possuir certificações da Harvard Business School. Dib já criou e coordenou diversos cursos de pós-graduação e ministra disciplinas nas áreas de Julgamento e Tomada de Decisão, Estratégia, Negociação e Internacionalização. Sua experiência profissional inclui cargos executivos na Shell, Telefônica e TIM, além de vários anos como consultor de alta gestão pela Booz-Allen.