Na quinta-feira (22), tivemos a notícia da intenção do presidente Joe Biden em elevar alguns impostos nos EUA. Em meio a tanta desinformação que vemos por aí, entendo que vale aqui explicar qual o impacto disso para os seus investimentos.
Entendendo: primeiro ponto é que estamos falando de uma proposta e não de uma lei sancionada. A Bloomberg News informou na tarde de quinta-feira que Biden está planejando um aumento nos impostos sobre ganhos de capital para até 43,4% para americanos ricos. A proposta aumentaria a taxa de ganhos de capital para 39,6% para aqueles que ganham US$ 1 milhão ou mais, contra 20% atualmente, de acordo com a Bloomberg News, citando pessoas familiarizadas com o assunto. Então o que temos até agora é a intenção declarada da Casa Branca na elevação de alguns impostos.
Esperado: Essa notícia não deveria surpreender o mercado, uma vez que foi parte recorrente da campanha do presidente Joe Biden. Ele se elegeu falando que iria reverter os tax cuts do presidente Trump e elevar impostos sobre fortunas. Nesse sentido, inclusive, já pontuei que os aumentos de impostos seriam um potencial risco ao mercado americano. Logo, apesar da notícia ter repercutido essa semana, não é novidade alguma essa intenção. Talvez por isso, já na sexta-feira vimos as bolsas americanas encerrarem o dia em alta. Poucos diretamente afetados. A proposta se refere aos investidores americanos e em nenhum momento trata de investidores estrangeiros. Além disso, 75% dos investidores no mercado americano não se enquadram nos critérios para essa taxação.
São aqueles que investem através de planos especiais de aposentadoria (os quais tem regimes tributários próprios), fundos de Endownments de Universidades, investidores estrangeiros. A análise interna da Receita Americana de 2018 mostra que os milionários eram pouco mais de 500 mil investidores, ou que detinham pouco mais de 0,4% do valor do mercado. Logo, no caso de uma forte realização do mercado de ações poderíamos ver muitos investidores inclusive se aproveitando das quedas e dando sustentação aos preços uma vez que não são diretamente afetados por essa notícia.
Muito ruim?
A meu ver temos aqui 2 faces da moeda.
Por um lado, o aumento de impostos sobre as empresas tenderia a encarecer os produtos americanos e até reduzir a competitividade americana; e o aumento de imposto sobre fortunas ou para aqueles com ganhos elevados poderia levar a uma migração dos mais ricos para outras praças.
Por outro lado, o objetivo dos aumentos de impostos é o financiamento de diversas medidas que pode justamente trazer mais competitividade para os EUA no logo prazo, além de já injetar crescimento no curto prazo. Além dos cheques de incentivo à economia, tivemos anúncio de um pacote de infraestrutura o qual tende a melhorar a logística americana, tornar energias renováveis mais baratas e uma internet mais rápida disponível a uma maior gama de agentes. Esses são fatores essenciais para crescimento da economia e produtividade. Outro pacote, também financiado pelo aumento de impostos, é focado na melhoria da produtividade do trabalhador, através de cursos de capacitação profissional e pesquisas. Esse também é outro fator preponderante para crescimento sustentado de longo prazo. Uma economia que cresce gera mais oportunidades para todos, mais lucros para empresas e consequentemente suas ações tenderiam a refletir isso.
E o mercado de ações?
Apesar de parecer ou soar negativo, olhando o passado, dá para dizer que não vemos um impacto tão forte assim para o mercado de ações. Historicamente, os aumentos nos impostos sobre ganhos de capital não prejudicaram as ações. A coluna do John Authers na Bloomberg nos traz alguns insights interessantes sobre a forma como o mercado lidou com o último grande aumento da impostos sobre ganhos de capital no final de 2012 – quando a alíquota subiu 9 pontos percentuais. À medida que ficou claro que impostos mais altos sobre ganhos de capital estavam chegando, o S&P 500 enfraqueceu e ficou de lado nos últimos meses do ano – a explicação seria a que alguns investidores de fato estavam realizando lucros antes dos aumentos de impostos. Em 2013 já com a nova alíquota tivemos um ano de forte valorização com o S&P encerrar com ganhos de 30%.
Indo além na história, você não encontra correlação óbvia entre aumentos ou reduções de impostos sobre ganhos de capital e a performance do mercado. O gráfico abaixo pontua todos os pontos de aumento de alíquotas (linhas vermelhas) e reduções de alíquotas (linhas verdes).
Análise do Goldman Sachs, dos últimos três aumentos de 1987, 1988 e 2013 também corrobora a ideia de um impacto reduzido no mercado e ainda, mas que compensado no futuro. Algumas ações consideradas de momentum é que seriam as mais afetadas no curto prazo.
Será que passa?
Para que a proposta se torne efetiva é necessária a discussão nas duas casas (Câmara e Senado). Nesse sentido, apesar da maioria na Câmara dos Representantes e maioria técnica no senado, existem diversas divergências sobre o escopo e abrangência desse aumento de impostos. Como exemplo, o senador democrata do estado da Virginia Joe Manchin, é visto como contrário a um aumento dessa magnitude. Outros senadores se mostram menos favoráveis a um aumento de impostos tão agressivo assim.
Analistas do Goldman Sachs sugerem que o aumento deve ser definido numa alíquota bem menor, saindo dos atuais 20% para 28%. Essa também é a visão do banco suíço UBS, que escreveu em nota aos seus clientes: “Our base case is for the top rate to increase to 28%, with lawmakers pushing back at the near doubling suggested by the administration.” Logo, me parece hoje pouco provável que a proposta da Casa Branca avance sem mudanças. Parece mais um movimento de poker de blefar para depois barganhar por um aumento mais brando.
Resumindo.
O investidor brasileiro não deve ser confundido por narrativas equivocadas e incompletas que são difundidas no noticiário de mercado. Os pontos que trouxe aqui, foram com o objetivo de tranquilizar os investidores face as recentes notícias. Não acredito que tais eventos levariam a uma migração de capitais para fora dos EUA. Já vimos eventos como esses no passado e o resultado, como mostrado aqui não foi a da migração de capitais. Fatores como crescimento econômico, níveis de confiança dos investidores, emprego, renda e juros são mais importantes para determinar o desempenho do mercado de ações.
RESULTADOS CORPORATIVOS
Voltando aquilo que é o principal driver das ações nos logo prazo: vamos falar dos seus lucros!
Em linhas gerais até aqui os números apresentados pelas companhias americanas têm apresentado ampla surpresa positiva. A Earnings Scout informa que entre 61 empresas que divulgaram seus números essa semana, 90% bateram as estimativas do mercado para lucros, os quais foram, aproximadamente 22% maiores que o esperado. Ainda em nível agregado o crescimento da receita até aqui se mostrou de cerca de 8.6% e dos lucros em 46.1%. Abaixo uma tabela completa com os números consolidados até agora.
Foco total dessa semana fica por conta dos resultados, afinal temos uma miríade de nomes conhecidos!
Temos Tesla (NASDAQ:TSLA) (SA:TSLA34) na segunda; Microsoft (NASDAQ:MSFT) (SA:MSFT34), Google (NASDAQ:GOOGL) (SA:GOGL34), Visa (NYSE:V) (SA:VISA34), Starbucks (NASDAQ:SBUX) (SA:SBUB34), GM (NYSE:GM) (SA:GMCO34) e 3M (NYSE:MMM) (SA:MMMC34) na terça; quarta-feira é a vez da Apple (NASDAQ:AAPL) (SA:AAPL34), Facebook (NASDAQ:FB) (SA:FBOK34), Qualcomm (NASDAQ:QCOM) (SA:QCOM34), Boeing (NYSE:BA) (SA:BOEI34), Ford (NYSE:F) (SA:FDMO34); quinta-feira a Amazon (NASDAQ:AMZN) (SA:AMZO34), Mastercard (NYSE:MA) (SA:MSCD34), Comcast (NASDAQ:CMCSA) (SA:CMCS34), McDonald’s (NYSE:MCD) (SA:MCDC34), Shell (NYSE:RDSa) (SA:RDSA34) e Caterpillar (NYSE:CAT) (SA:CATP34); e sexta-feira temos a Exxon Mobil (NYSE:XOM) (SA:EXXO34), Chevron (NYSE:CVX) (SA:CHVX34), AstraZeneca (NASDAQ:AZN) (SA:A1ZN34) e Colgate-Palmolive (NYSE:CL)(SA:COLG34). E isso porque citei apenas algumas…muitas outras empresas divulgarão balanços.
Era isso.
Aquele abs e boa semana!