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Ações do Fed e suas projeções continuam divergentes.
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Powell precisa tornar os títulos mais atraentes para sustentar a economia dos EUA.
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Ao mesmo tempo, uma forte alta nas taxas de juros dificulta ainda mais o equilíbrio que o Fed busca.
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Doze membros do Fed preveem mais um aumento de juros, em comparação com sete que projetam que não haverá mais aumentos. Curiosamente, um membro do Fed prevê uma taxa de 6,125% no final de 2024.
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As projeções mostram que os dirigentes do Fed continuam esperando mais um aumento de juros este ano. As projeções para 2024 e 2025 indicam um aumento de meio ponto percentual, o que sinaliza a crença do Fed em taxas de juros mais altas por um período prolongado.
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A previsão do Fed sugere que a inflação atingirá 2,6% em 2024. Além disso, a projeção mediana para o crescimento econômico em 2023 subiu de 1% em junho para um sólido 2,1%. Os dirigentes do Fed reduziram significativamente suas previsões de desemprego, agora esperando uma taxa de desocupação máxima de 4,1%, abaixo da estimativa anterior de 4,5%.
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Essas mudanças resultaram em alterações nos mercados de juros futuros. Agora, não há mais previsão de cortes até setembro de 2024.
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Para contextualizar, apenas três meses atrás, os juros futuros estavam precificando quatro cortes de juros em 2023. Agora, as taxas de juros permanecerão estáveis por pelo menos um ano.
Algumas semanas atrás, depois do discurso do presidente do Federal Reserve (Fed), Jerome Powell, no simpósio econômico de Jackson Hole, afirmei que o foco da política monetária americana era impedir que os especuladores dominassem o mercado de juros, o que poderia comprometer o cenário de “pouso suave” em que muitos, inclusive o próprio Fed, apostavam.
No entanto, para fazer isso e ao mesmo tempo conter a inflação, escrevi que o Fed precisava manter as expectativas do mercado acionário sob controle, afastando o capital especulativo do mercado de trabalho.
"O Fed se encontra em uma situação delicada em relação ao caminho futuro. Isso porque duas forças contrárias e interligadas estão influenciando os mercados: a expectativa do fim do ciclo de alta das taxas de juros e a probabilidade de uma recessão no curto prazo. Diante desse cenário, Powell entendeu que pode administrar as forças resultantes de qualquer um dos fatores mencionados, mantendo os mercados de ações e de títulos sob alto risco de forma consistente. Isso significa que, independentemente de o Fed decidir subir os juros novamente ou não, as condições permanecerão bastante restritivas em toda a faixa de juros e na economia em geral."
Agora, avançando para o presente, com um resultado do IPC pior do que o esperado e da alta dos preços das commodities, como petróleo e alimentos, o cenário não mudou, mas os riscos estão ainda maiores.
É por isso que Powell, mais do que nunca, precisa ganhar tempo. E como fazer isso? Bem, vendendo títulos desta vez.
A economia dos EUA, altamente dependente da dívida, não pode funcionar sem mais emissões de títulos. No entanto, as taxas persistentemente altas têm mantido os riscos dos títulos do Tesouro americano em níveis elevados, levando à venda que estamos vendo agora.
Estimativas indicam que, se o ritmo atual de crescimento da dívida continuar, o endividamento federal aumentará de US$ 32 trilhões para cerca de US$ 140 trilhões até 2050. Sob a suposição de que o Federal Reserve continue sua prática de monetizar 30% das emissões de dívida, isso implica que seu balanço se expandirá para mais de US$ 40 trilhões durante o mesmo período.
Por isso, eu acredito que a estratégia de Powell é tornar os títulos mais atraentes novamente para os investidores.
Na verdade, o diferencial entre o título de 10 anos e o S&P 500 atualmente está em níveis que já levaram os investidores a comprar títulos no passado.
As condições mudaram em todo o mundo
Se analisarmos os resultados da semana decisiva dos bancos centrais do ponto de vista estrito das decisões de juros, podemos concluir que estamos mais perto do que nunca da mudança na política monetária global que os investidores esperam ansiosamente.
Na verdade, as surpresas menos previsíveis vieram sob uma forma “dovish”, com o Banco do Japão (BoJ) mantendo as taxas negativas e o Banco da Inglaterra (BoE) mantendo os juros básicos inalterados, devido a uma surpresa positiva na inflação na semana anterior.
Na Europa, após indicações de que o BCE já fez seu último aumento neste ciclo, o Riksbank e o Norges Bank também sinalizaram que encerraram as mudanças em suas políticas.
No entanto, nada disso pareceu importar diante dos comentários mais firme de Powell e das conclusões do gráfico de projeções:
Agora, ou o cenário futuro será muito mais desafiador do que o previsto, ou o Fed pode se ver obrigado a agir de maneira contrária à sua retórica.
De fato, as menções à inflação no mais recente Livro Bege foram as menos frequentes desde janeiro de 2022. Em contrapartida, as menções à recessão aumentaram para os níveis mais altos desde pelo menos 2018.
Essa mudança notável, com o termo "recessão" agora aparecendo com frequência em um contexto em que estava praticamente ausente apenas um ou dois anos atrás, fornece uma visão importante das preocupações predominantes no Fed atualmente.
Dado que 2024 é um ano de eleições, o Fed pode endurecer o discurso tanto quanto quiser. No entanto, assim que a economia começar a desacelerar, a pressão para flexibilizar as condições financeiras pode se tornar insuportável.
Curva de juros
Durante a coletiva de Powell, as taxas dos títulos do governo dos EUA subiram amplamente, com a de 2 anos atingindo seu nível mais alto desde 2006, enquanto a taxa de 30 anos alcançou um nível não visto desde 2011.
Na verdade, nos dias seguintes à reunião do Fed, toda a curva de juros passou por um aumento, caracterizado por um acentuado aumento nas taxas de juros de longo prazo, resultando no reajuste de ativos de longo prazo, como hipotecas, que viram suas taxas subirem para até 7,6%. Os mercados de dívida corporativa também estão passando por efeitos semelhantes de reajuste.
O aperto nas condições financeiras ocorre em um momento de incerteza sem precedentes em relação à trajetória futura do crescimento do PIB dos EUA. As projeções para o crescimento econômico no curto prazo variam consideravelmente, com o Fed de Atlanta projetando um sólido crescimento do PIB de 4,9% no 3º trimestre de 2023, enquanto o Fed de Nova York é mais conservador, com uma previsão de 2,1%. A média das previsões privadas é ainda mais baixa, em apenas 1,4%. Disparidades tão significativas na perspectiva econômica são raras, exceto em crises importantes ou circunstâncias excepcionais.
Há uma crescente desconexão entre as taxas de crescimento esperadas para a economia dos EUA e as taxas de política projetadas pelo Federal Reserve. Mesmo que as projeções do Fed se mostrem precisas, as taxas de crescimento nominal do PIB dos EUA estão rapidamente se aproximando de 4%, o que é significativamente inferior às taxas de política esperadas, que estão se aproximando de 5,5%.
Conclusão
Dizem que não se deve bater de frente contra o Fed. Bem, desta vez, o Fed está dizendo claramente: comprem títulos.
Ele não está fazendo isso por outro motivo senão para sustentar seu erro de política de longo prazo. No entanto, diante das atuais perspectivas para o mercado de ações, estou protegendo parte dos meus retornos com alguns títulos atrativos.
(Tradução de Julio Alves)
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Aviso: o autor tem uma posição comprada em títulos de 10 anos dos EUA.