Publicado originalmente em inglês em 12/03/2021
Chegou. O estímulo que os EUA esperavam há três meses.
Nas próximas semanas, veremos como os diferentes mercados respondem ao pacote de US$ 1,9 trilhão do governo Biden para vacinar o país, financiar estados e empresas, colocar dinheiro no bolso dos americanos e fazer os desempregados voltarem ao trabalho.
No mercado do ouro especificamente, as atenções estarão voltadas à reação do metal às preocupações com a inflação daqui para frente.
Há décadas considerado como ativo de proteção contra as pressões de preço, o ouro não tem conseguido exercer esse papel pelos bancos de Wall Street, hedge funds e outros atores que mantêm posições de venda no metal enquanto impulsionam os rendimentos dos títulos americanos e o dólar.
O bitcoin, ativo com valor intrínseco precário, também subiu em detrimento do ouro.
Finalmente com a aprovação do Plano de Resgate Americano do presidente Joseph Biden, na quinta-feira, os cheques de US$ 1400 chegarão às contas de americanos elegíveis já na próxima semana, o que deve gerar uma alta da inflação no curto prazo.
Em janeiro, a renda pessoal nos EUA cresceu 10%, superando as projeções, enquanto os gastos dos consumidores subiram 2,4%, abaixo das expectativas, após os cheques de US$ 600 emitidos pelo governo Trump à maioria dos americanos, com base no pacote de estímulo de US$ 900 bilhões contra a Covid-19.
Apesar disso, os preços do ouro caíram 2,7% em janeiro e continuaram derrapando 6% em fevereiro. Em março, houve uma desvalorização de mais 1% no acumulado do mês.
No mesmo período, os rendimentos do título americano de 10 anos atingiram as máximas pré-pandemia sob o argumento de que a recuperação econômica nos próximos meses poderia gerar um superaquecimento, gerando uma espiral inflacionária, com o Fed insistindo em manter os juros perto de zero.
O [Índice Dólar, que logicamente tombaria em um ambiente de maiores temores com a inflação, atingiu picos que não eram vistos desde novembro, graças à mesma lógica da recuperação econômica e do seu status como moeda de reserva.
Na janela asiática de negociação desta sexta-feira, tanto os rendimentos do treasury de 10 anos quanto o dólar registravam valorização. Os mercados futuros de ações em Wall Street também subiam após os recordes da quinta-feira no Dow e S&P 500.
Novamente o ouro caía, com seu preços à vista girando em torno de US$1710 por onça. Nesse patamar, sua desvalorização é de quase 10% no ano e 18% desde o recorde de US$ 2.073 em agosto.
Ouro deve se recuperar com monetização do estímulo
Uma recuperação do ouro até US$ 1.785 é plenamente possível, já que o trilionário pacote de estímulo deve impulsionar os títulos públicos e fazer cair o rendimento de 10 anos, além de elevar os preços reais, como gasolina e alimentos, e pressionar o dólar.
Esse alvo aparece em diversos gráficos técnicos como resistência média para o ouro, de onde pode tentar um retorno até a marca de US$ 1800 perdido no mês passado.
Os níveis de teste de Fibonacci do Investing.com para a alta do ouro encontra-se em 1743, 1761 e 1789.
O analista técnico Sunil Kumar Dixit adota um modelo similar em seus gráficos para uma possível direção do ouro caso ele se firme como proteção contra a inflação.
Segundo Dixit:
“Existe um conjunto de resistências na média exponencial de 5 meses a 1782, bem como na MME de 50 semanas a 1786 e de 50 dias a 1792.”
“A continuidade do movimento de alta pode testar a média simples de 20 semanas a 1832.”
O analista também citou outro favor em favor dos aspectos técnicos do ouro: o Índice de Força Relativa (IFR) sobrevendido, com o gráfico semanal mostrando 4.5/4.5 e o mensal, 1.8/8.1, o que pode atrair compras.
“A volatilidade pode voltar com tudo”, complementou.
Outros analistas, como Jeffrey Halley, estrategista da corretora OANDA, acreditam que o ouro esteja entrando em outra fase de fraqueza capaz de colocar o bitcoin como seu antagonista.
Halley disse o seguinte ao se referir à luta do ouro nos níveis de 1710 no pregão asiático desta sexta:
“A sessão noturna deveria ter gerado condições férteis para um rali sustentável no ouro. Dizer que a ação dos preços no overnight foi desapontadora seria um eufemismo. A recuperação asmática do ouro já deve ter perdido o fôlego em comparação com o comportamento do bitcoin no mesmo período. Não dá para deixar de achar que as criptos estão se alimentando da desvalorização monetária. A expectativa é de mais dor e novas mínimas no ouro nas próximas semanas”.
Déficit e endividamento nos EUA destaca ouro como proteção
Uma análise mais detida do déficit fiscal e da relação dívida-PIB nos EUA deveria ser suficiente para ressaltar a importância de ativos de reserva de valor no portfólio de qualquer investidor.
O último balanço patrimonial divulgado pelo Tesouro americano na quarta-feira mostrou um déficit orçamentário de US$ 1,05 trilhão nos primeiros cinco meses do ano fiscal de 2021, com US$ 311 bilhões somente em fevereiro. E isso se refere ao estado das contas antes do estímulo de US$ 1,9 trilhão chegar à economia.
A dívida bruta federal nos Estados Unidos cresceu 107,6% do PIB em 2020 e 106,9% em 2019. A dívida nacional americana em si já se aproxima de US$ 28 trilhões.
Se o rendimento da nota de 10 anos ficar a 2%, aliado a uma dívida nacional de US$ 30 trilhões, o serviço anual da dívida somaria cerca de US$ 660 bilhões. Os déficits anuais continuarão fazendo a dívida nacional subir ainda mais.
E, embora os Estados Unidos pareçam estar nos estágios relativamente iniciais de um ciclo de expansão monetária, a base monetária ainda pode aumentar substancialmente e fazer o país voltar aos dias da crise financeira de 2008-09.
Com a diluição do sistema monetário fiduciário, a inflação mais alta com certeza está a caminho.
De fato, é possível que a economia americana apresente uma retomada mais rápida neste ano do que o Federal Reserve espera.
Se isso acontecer, sem dúvida é possível que a inflação também aumente e, com ela, o ouro, que historicamente sempre manteve forte correlação no longo prazo com a expansão da base monetária.
Aviso de isenção: Barani Krishnan utiliza diversas visões além da sua para oferecer aos leitores uma variedade de análises sobre os mercados. A bem da neutralidade, ele apresenta visões e variáveis de mercado contrárias. O analista não possui posições nos ativos e commodities sobre os quais escreve.