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Oportunidade: O Verdadeiro Custo de Investir na Bolsa Brasileira

Publicado 15.09.2021, 16:41
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Nesses tempos de Ibovespa em queda contínua, acumulando um total de -3% em 2021, o mercado financeiro nacional parece se esforçar mais do que o normal para vender otimismo a quem investe. É uma reação natural, dado o grau de enraizamento da ideia de que quando a bolsa cai, é um bom momento para comprar, porque ela irá se recuperar no futuro. É uma meia verdade: vale para a bolsa dos EUA, mas não para a bolsa brasileira.

Entender esse fato, que é bastante simples, é um desafio muito maior do que parece. Em primeiro lugar, porque corretoras, casas de análise, agências autônomas e “assessores” (o termo correto é “agentes”, porque agem em nome de uma corretora), dependem da venda de ativos nacionais para gerarem lucro. Em segundo lugar, porque o descolamento entre mercado financeiro e o mundo acadêmico é bastante profundo, o que não é exclusividade do mercado tupiniquim.

Esses dois fatores se ligam, finalmente, ao chamado “home country bias”, ou viés do país de origem. Trata-se de um viés cognitivo, que nada mais é do que uma falha de raciocínio lógico, no qual tendemos a alocar muito mais capital em ativos nacionais do que deveríamos. Isso porque presumimos, erroneamente, que nossa familiaridade (um outro viés cognitivo) com o mercado local nos permite ter uma noção muito melhor do retorno futuro desses ativos

Na realidade, o que acontece é o exato oposto. Estimamos muito mal o potencial de retorno desses ativos, alocamos muito mais do que seria minimamente razoável. Embora esse fenômeno seja global, no Brasil ele é muito mais forte do que em outros países, onde temos uma das maiores proporções de alocação doméstica no mundo. Em síntese, trata-se do popular: “será que os gringos não estão vendo que o MSCI  (NYSE:MSCI) e Mercer (NASDAQ:MERC) realizaram um cálculo da exposição ao mercado nacional de ações, enquanto percentual da alocação em renda variável, no caso dos fundos de pensão de diversos países, com dados até 31 de dezembro de 2019. No caso do Brasil, chegou-se ao assustador patamar de 94%, perdendo apenas para a Indonésia. Ficamos muito a frente, por exemplo, da Colômbia (46%), México (42%), Chile (31%) e Peru (27%). De forma simplificada, cerca de 94% do capital está alocado num universo que representa menos de 1% das oportunidades disponíveis no mundo.  


Brasil está “barato” porque é loteria


Esses dados bastariam para derrubar prontamente a tese de que faz sentido concentrar seu capital no Brasil, mas a situação piora bem mais quando introduzimos o fator cambial. Fiquei um pouco surpreso ao ver profissionais do mercado usando o rendimento do Ibovespa em dólares como argumento para comprar ativos da bolsa brasileira, sob a impressão de que isso significa que ela estava mais barata do que nunca – em dez anos, ela perdeu cerca de 40% do seu valor. Não vou sequer comentar a performance em reais, visto que no período ela rendeu menos até que a poupança. Essa noção de barato ou caro é um pouco complicada. Presume-se que os míticos “fundamentos” estão presentes e que o preço se deslocou deles. Por isso, temos a oportunidade de comprar “barato” e ganhar com a valorização futura. Em nenhum momento parece ocorrer que o preço na verdade reflita uma piora nos fundamentos, algo que faz muito mais sentido se considerarmos que o mercado seja minimamente eficiente.

Isto é, quando olhamos para a bolsa brasileira pela ótica de um mercado global, ela não está “barata”, está desvalorizada, muito desvalorizada. Não por alguma distorção gigantesca que apenas nós, brasileiros e brasileiras, conseguimos ver. É porque trata-se de um investimento de altíssimo risco. Isto é: há um alto potencial de retorno, mas a probabilidade disso se concretizar é baixíssima, o que afasta nossa bolsa do campo do investimento e a insere no campo da especulação.

Daí que o mundo encare a bolsa brasileira como uma loteria, depositando aqui apenas aquilo que nosso mercado representa em termos globais para efeito de diversificação geográfica. O que entra em excesso não é nada mais do que uma aposta, como aquele troco que você compra em raspadinha na casa lotérica – pode ser que seus cinco reais virem cinquenta mil, mas como isso é muito improvável, gasta-se nisso apenas aquilo que podemos e estamos dispostos a perder.


O custo da moeda


O trecho acima explica porque, em termos globais, a bolsa brasileira está “barata”, mas o impacto que isso tem para quem reside no Brasil é muito maior. O fator cambial é, talvez, aquele que tem o maior impacto em termos de custo de oportunidade para investidores/as brasileiros/as. Ironicamente, é sistematicamente ignorado ou sobre o qual existe o maior grau de desinformação, em larga medida propalada É bom notar que o termo “risco cambial”, quando aplicado a economias ditas “emergentes”, tem um significado muito diferente daquele dos países ricos. Isto porque a taxa de câmbio entre moedas fortes tende, no longo prazo, à neutralidade. Isto é: não se comportam como ativos, no sentido de que tendem (ou espera-se que tendam) a valorizar no longo prazo. Portanto, no longo prazo, existe a possibilidade hipotética de longos períodos de desvalorização cambial, que corrói os ganhos – embora pesquisas mostrem que esse impacto não chega a ser relevante.

 Não é isso que ocorre com moedas emergentes, como no caso do real brasileiro. O real, quando comparado ao dólar, se comporta como um ativo, tanto é que em outros países latino-americanos é comum trocar a moeda local por dólares para fugir da inflação. Isso é facilmente constatável, ainda, ao considerarmos que em 1995, quando no início do Plano Real, nossa moeda era praticamente pareada com o dólar dos EUA. Em 26 anos, esse valor mais do que quintuplicou, deixando claro que a ideia de “risco cambial” está muito mais próxima de um “prêmio cambial”.


O que isso significa na prática?

De forma bastante direta, significa que quando você opta por investir em ativos nacionais ao invés de ativos dolarizados, você precisa que esses ativos compensem ainda o ganho você teria tido ao se proteger da desvalorização cambial. Como sabemos que, no médio e longo prazo, não só as bolsas de países ricos oferecem um rendimento absoluto maior, como ainda embutem um prêmio cambial, atrelar seus ganhos a bolsa brasileira é um investimento duplamente ruim para investidores nacionais – e isso ainda é piorado pelos fatores citados acima. Vamos ver o impacto disso na prática com um simples exemplo. Considerando uma série histórica iniciada em março de 2013, o dólar gerou um retorno de aproximadamente 163%, enquanto o Ibovespa gerou modestos 106% e o CDI, 96%. Vale lembrar, dólar não é investimento, estamos simplesmente trocando de moeda. Nesse meio tempo, o ilustríssimo Verde Asset FIC FIM, considerado um dos fundos de maior sucesso da história nacional, algo em torno de 199%.

Muito disso vem do simples fato de que aplicam em investimentos dolarizados e atrelados a bolsa americana, não de alguma capacidade sobrenatural de gestão. Sabem como sei disso? Por que no mesmo período o fundo Western Asset Us Index 500 Fundo De Investimento Multimercado rendeu 380%, cobrando módicos 1% ao ano e zero taxa de performance. A estratégia é simples: comprar contratos futuros do S&P500. Que fique bastante claro: não se trata de especular com contratos futuros, nem de operar ou fazer trade envolvendo esse derivativo. Não é um fundo de gestão ativa, trata-se simplesmente de comprar os contratos futuros para replicar o rendimento do S&P 500 em reais, tanto que a taxa de correlação com o fundo é de 0,95. Isto é, os ativos andam no mesmo sentido (sobem ou descem) em 95% do tempo, o que faz bastante sentido considerando que o fundo da Western tem aproximadamente 5% alocado em títulos públicos federais.

 Falando em títulos públicos federais, isso nos traz a uma última consideração bastante importante sobre o custo de oportunidade envolvido em investir na bolsa brasileira. Trata-se do efeito do risco nos seus investimentos, tendo em vista que o câmbio, diferente do que pensam alguns economistas jurássicos, não resulta da simples diferença entre taxas de juro. Deixe-me repetir para ficar bem claro: a taxa de câmbio não varia simplesmente em função da diferença entre taxas de juro.


Embora a taxa de juros explique uma parte oscilação cambial, especialmente entre economias ricas, no caso dos “emergentes” ela explica uma parte minoritária desses movimentos. Aquilo que explica a maior parte dessas oscilações são a percepção e apetite de risco internacional, que está intimamente relacionada, também, ao rating de crédito e ao próprio diferencial de taxas de juros entre dois países.
Isso explica porque, para quem está minimamente em dia com as pesquisas acadêmicas, não houve surpresa alguma quando o aumento da taxa Selic não resultou num arrefecimento da taxa de câmbio. Isto porque ela não tem a ver com “os fundamentos do carry trade” (quando você investe no diferencial entre duas taxas de juros), nem com a manutenção do diferencial entre taxas de juro, mas com a precificação do risco.

O viés doméstico ou home country bias é tão enraizado no mercado brasileiro que parecemos presumir que o resto do mundo também tem olhos apenas para o Brasil, o que claramente não é o caso. Logo, presumir que bastaria “corrigir” a taxa básica de juros para que tudo voltasse a ser como era é uma grande bobagem: existem opções muito melhores do que o Brasil para se fazer o mesmo tipo de operação com muito menos risco. Para quem está aqui dentro, a taxa de câmbio é um fator fundamental para que você consiga medir o grau de desconfiança e de expectativas com o mercado nacional. Isso é a razão pela qual, do ponto de vista puramente racional, você deveria ter o mínimo possível atrelado ao real, porque nos momentos de crise nacional (que é a regra, não a exceção) e de crise global, a taxa de câmbio é que vai te salvar conforme o resto do mundo tira dinheiro do Brasil. No resto do tempo, tende a trazer no máximo uma performance um pouco pior a curto prazo nos curtos períodos de real forte.


Opções para se proteger do Brasil

Ao contrário do que se pensa, é muito fácil atrelar seus investimentos em renda variável ao dólar. O Western Asset US Index é uma alternativa simples para quem não tem costume de acessar a bolsa diretamente. Para quem não tiver essa restrição, há diversos ETFs que replicam os índices dos EUA e demais mercados desenvolvidos, como os ETFs IVBB11 (S&P500) e NASD11 (Nasdaq 100). BDRs de ETFs são uma outra opção atraente, dentre os quais destaco BIVB11 (IVV, maior ETF do mundo, que replica o S&P500), BIEF39 (IEFA, mercados desenvolvidos excluindo EUA), BIJR39 (IJR, índice de small caps dos EUA).

Todas essas são opções viáveis e muito baratas para construir seu portfólio de renda variável da maneira correta, começando com 100% em mercados desenvolvidos e eventualmente abrindo algum espaço para a bolsa brasileira. Todos esses ETFs de BDRs podem ser comprados no home broker da sua corretora, e fundos como o Western estão disponíveis na maior parte delas. Em nenhum dos casos, você precisa abrir conta no exterior nem converter seus reais para dólares, o que torna o processo bem simples.


Enfim, gostaria de lembrar que esse texto tem cunho puramente educacional e não deve ser considerado uma recomendação de investimento.  
             
             
           

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