Conforme discutido no último texto, há diversas perspectivas que podem ser adotadas ao se tratar de criptoativos. Uma das abordagens possíveis, chamada evolutiva na teoria das organizações, consiste em focar apenas no processo de mercado. Nesse caso, os criptoativos vencedores a longo prazo importam relativamente pouco, o que é possível avaliar é o contexto do mercado como um todo. As respostas a diferentes contextos, no entanto, poderiam ser usadas como um critério da maior probabilidade de um ativo ser bem-sucedido: como anda a inovação, riscos globais, adaptatividade dos desenvolvedores, qualidade e número de participantes na comunidade. De maneira geral, essa abordagem leva a grande diversificação e, dando insights sobre o papel dos desenvolvedores, não deve ser desconsiderada.
Entretanto, a que creio mais importante é a da Ação Coletiva. Essa abordagem, seguindo a abordagem proposta por Astley e Van de Ven, procura entender o que mantém uma organização coesa – sendo uma perspectiva voluntarista – sem necessariamente enfatizar ou superestimar o papel de líderes. A organização é entendida como uma rede de participantes que se estrutura de maneira semiautônoma. Os participantes barganham entre si, e, por mais que haja uma estrutura de papeis razoavelmente definida (mineradores, investidores e desenvolvedores), há também um processo político que besunta as relações dessa organização.
Isso parece fazer sentido ao discutir Bitcoin e Ethereum. Esses criptoativos são desenvolvidos muito por desenvolvedores independentes que ficam sugerindo, discutindo e programando propostas de melhoria. Mesmo a EOS, recente e com Dan Larimer como líder claro do projeto, possui excelentes parceiros independentes ao redor do mundo, inclusive no Brasil. As barganhas nesses projetos são claras: quando houve a falha da Parity, houve a preocupação de se evitar um possível fork, conforme sugerido pela proposta de Alex Van de Sande que pode ser conferida nesse link.
Entretanto, nessa função líderes têm um poder limitado. Eles constantemente dependem da participação de gente talentosa e motivada para garantir que os projetos sejam concretizados e auditados constantemente. Conseguir atrair essas pessoas é uma tarefa difícil e uma liderança eficiente pode garantir isso. A capacidade que, por exemplo, Vitalik Buterin tem de desenvolver novas ideias para o mundo dos criptoativos não é desprezível e mobiliza desenvolvedores. Os conflitos que uma criptomoeda dinâmica como a Ethereum tem podem culminar em forks – como ocorrido no caso do TheDAO, com a criação do Ethereum Classic – ou em novos projetos com objetivos similares, mas preferencias técnicas distintas (EOS e Tron, por exemplo). A moeda se manter uma das maiores a longo prazo é, em parte, atributo de líderes talentosos e coesos.
O que faz a liderança talentosa, no entanto? Não creio ser uma perspectiva “estratégica” como a que defendem ser o papel dos CEOs em empresas normais. Há uma negociação constante, um processo de geração de novas ideias que deve ser democrático e transparência nos vetos de sugestões. Em outras palavras, o projeto deve ter princípios claros e ser organizado de maneira a experimentar soluções críveis para seus problemas. Para um analista, portanto, dessa escola de pensamento organizacional podemos extrair que o projeto precisa de diversos desenvolvedores talentosos e propondo novas técnicas. É bom analisar dois aspectos: o quanto o projeto precisa avançar – por exemplo, Ethereum precisa muito dados os problemas de escalabilidade – e o quanto ele possui frentes capazes de avançar nessas questões.
Evidentemente, essa recomendação é difícil de balancear, porém creio que ela oferece dois prismas importantes para qualquer analista: entender o presente e as chances futuras da tecnologia. A coesão ao redor de um projeto, com um core ativo politicamente e núcleos descentralizados, determinam em certa maneira as chances da tecnologia se desenvolver a longo prazo e se manter sem grandes forks ou competidores criveis. Nesse caso, por exemplo, apesar dos desafios da Ethereum e isso levar a uma grande possibilidade de falha, confio razoavelmente em seus desenvolvedores. Não sou grande entusiasta do Plasma, por exemplo, mas a PoS via Casper e outras soluções parecem adequadas, com um time forte seguindo seu desenvolvimento. Diversos criptoativos podem ser avaliados por uma análise completa do seu time e perfil democrático de seus participantes, sendo isso algo a ser observado por investidores.