Mudamos de novo a narrativa: agora, estamos no “trade da recessão”. Investidores batem nas commodities (exceção feita ao petróleo, por conta do corte de produção da Opep) e em outros cíclicos globais para comprar o que pode se beneficiar da queda das taxas de juro. Há tempos já, vivemos um mercado muito temático. Veio a pandemia e só o combo “stay at home” (fique em casa) tinha valor. De repente, as vacinas estavam a caminho e, então, era a hora de comprar a abertura. Empresas ligadas ao e-commerce se multiplicaram por 3x, para depois cair 85%. Mais recentemente, arrisco dizer que tudo dentro de 2023, fomos do “soft landing” para o “no landing”, até chegar ao atual “hard landing”. Começamos com a ideia de um pouso suave; então, fomos surpreendidos por bons dados de atividade com sinais (ainda que incipientes) de inflação abrandando. Um pouco mais tarde, a turma resolveu olhar os PMIs e os ISMs no detalhe, seguidos de um relatório Jolts mostrando uma tendência ruim para o emprego norte-americano, que viria a ser corroborada pelo ADP Employment e suas poucas vagas criadas no mercado de trabalho privado. A esta altura, parece mesmo improvável que consigamos escapar de uma recessão nos EUA, ainda que não seja possível desenhar sua extensão e profundidade. Nem me arrisco. Acho que as pessoas perdem muito tempo tentando antecipar a realidade futura, uma tarefa impossível por definição, e se dedicam pouco a tentar mensurar como os vários cenários potenciais podem impactar seu portfólio e sua vida. Caímos de novo na máxima de Nassim Taleb: X não é F(X). X é a realidade. F(x) é como essa realidade impacta seu portfólio. Muitas vezes, é bem mais difícil desenhar o mundo do que vislumbrar como seus investimentos vão se comportar à frente. Exemplo elementar: se você está quase integralmente exposto a títulos pós-fixados brasileiros, não precisaria se preocupar tanto com o futuro do PIB dos EUA. Já se está lotado de Petrobras (BVMF:PETR4) e Vale (BVMF:VALE3) a coisa muda de figura. Eis o ponto preocupante: enquanto os mercados se mostram bastante preocupados com uma recessão futura nos EUA, o apreçamento dos índices de ações por lá, sobretudo quando se pensa em termos agregados, parece não condizer com a realidade objetiva. Em outras palavras, em se confirmando o cenário de recessão norte-americana e se a história pode servir de guia, o S&P 500 oferece uma combinação risco-retorno pouco atraente nesses níveis. Dito ainda de uma maneira diferente, investidores parecem muito otimistas com o futuro dos juros nos EUA, enquanto não vislumbram um impacto tão relevante da recessão sobre os lucros corporativos. Em relatório recente, o Bank of America (NYSE:BAC) Merrill Lynch escreveu: “as pessoas estão muito otimistas com fortes quedas de juros e pouco pessimistas com a recessão.” O mesmo banco lembrou um alerta importante: em 8 das últimas 10 recessões, o S&P 500 sofreu quedas superiores a 20%. O gráfico abaixo resume o argumento. |
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Outro ponto relevante: ainda que, de fato, os juros menores justifiquem, mesmo ex-ante, múltiplos maiores para as ações (o chamado re-rating), essa dinâmica, na verdade, reflete uma economia em pior situação, com lucros à frente. E a coisa fica ainda pior porque não há garantia de que o Fed vá mesmo cortar sua taxa básica já neste ano, porque a inflação é persistente e o mercado de trabalho como um todo ainda gera mais de 200 mil novas vagas por mês. O Fed quer ver a taxa de desemprego acima de 4% e isso deve acontecer mais à frente. Se a recessão está mesmo a caminho, qual o play book a seguir? Quais estratégias podem funcionar bem?
No final do dia, a economia vive de ciclos. Estamos terminando um deles. Sempre prefiro um fim terrível a um terror sem fim. |