Com as recentes quedas das bolsas globais muitos investidores têm se perguntando, o que está acontecendo? A resposta a essa pergunta envolve alguns pontos e pode parecer complexa em um primeiro momento, entretanto, as palavras chaves são: alta da inflação global, escalada dos juros pelos Bancos Centrais e possível desaceleração das principais economias.
No Brasil, o índice oficial de inflação, IPCA, está na casa dos dois dígitos e cravou em 11,89% nos últimos 12 meses. Nos EUA, a inflação ao consumidor, CPI, chegou a 9,1% na comparação anual, esse patamar não era visto desde o início da década de 80. Na Europa não é diferente, o CPI anual atingiu 8,6%, maior valor já registrado na série histórica.
A inflação, na maioria das vezes, supera o reajuste dos salários e, como consequência, há uma perda do poder de compra da população assalariada. O efeito imediato é a redução do consumo — os bens essenciais passam a ser prioridade na hora da escolha. As trocas são a força vital da economia, bem como da sociedade.
Para conter o movimento inflacionário, os Bancos Centrais precisam elevar os juros para retornarem com a inflação para a meta.
No Brasil, o Banco Central iniciou o aperto monetário em março do ano passado, já foram onze altas seguidas, desde então a Selic saiu da mínima histórica de 2% a.a para os atuais 13,25% a.a. A projeção do mercado, de acordo com o último Boletim Focus, é que a taxa de juros encerre o ano em 13,75% a.a.
Nos Estados Unidos, o Fed (Banco Central americano) começou a elevar os juros em março deste ano, quase um ano após o BC do Brasil. Esse foi o primeiro aumento de juros na maior economia do mundo desde 2018. Até o momento, foram três altas consecutivas e a expectativa é que o movimento continue nas próximas reuniões.
O BCE (Banco Central Europeu) também elevou a taxa de juros em 0,50 ponto percentual na última reunião, realizada no dia 21 de julho. Foi a primeira alta de juros na zona do euro desde 2011.
De modo geral, juros mais altos representam aumento do custo do dinheiro, o que desestimula a economia. O crédito fica mais caro para os consumidores, os juros para captação de recursos por parte das empresas sobem e também eleva o custo de oportunidade, já que os investimentos em renda fixa, considerados de menor risco, ficam mais atrativos; todos esses eventos significam menos dinheiro em circulação.
Os dois pontos, perda do poder de compra e menos dinheiro circulando — dinheiro é o meio de trocas geral em uma sociedade, além de unidade de conta e reserva de valor — geram um receio por parte dos investidores de uma possível recessão econômica global. E isso vem sendo precificado nos ativos de renda variável.
De dezembro até o final de julho, o desempenho é negativo para o mercado global de ações, os principais índices dos EUA, S&P 500 e Nasdaq, caem 17% e 25,5%, respectivamente. A Europa acumula uma queda de 19,5%. O Ibovespa recua 5% em reais e em dólares fica próximo da estabilidade no período, a queda começou cerca de três meses depois por aqui. Do início de abril até o momento a perda do principal índice brasileiro é de quase 18%. Já o VT, ETF neutro global, apresenta uma desvalorização de 17,5% no período e demonstra a tendência de baixa geral do mercado.
Por fim, o cenário atual é bastante turvo para fazer qualquer tipo de previsão. Se realmente teremos uma recessão global, qual será a sua intensidade e quanto tempo permanecerá? Um fato já evidenciado é o desconto de parte desse evento nas cotações dos ativos.
De toda forma, o ato de investir demanda capacidade de lidar com essas dúvidas diante da volatilidade do mercado, algo intrínseco aos sistemas complexos. Como pontua o autor Nassim Taleb: “a antifragilidade é uma propriedade de todos aqueles sistemas naturais (e complexos) que sobreviveram, privar esses sistemas de volatilidade, aleatoriedades e agentes estressores os prejudicará. Eles enfraquecerão, morrerão ou serão destruídos.”
Assim, de fato, momentos de maiores incertezas fazem parte da dinâmica da economia global e, também, da trajetória do investidor.