Como em um desenho animado da Disney, o ouro de repente parece ter se transformado com um simples movimento de varinha mágica.
Da condição de porto seguro que parecia tudo menos “seguro” há apenas algumas semanas, o metal amarelo caiu nas graças dos investidores novamente, que buscam sair das negociações no dólar.
Evidentemente, um estudo mais pormenorizado do ouro revelará que o que está acontecendo não é mágica, mas a ciência de uma inflação iminente. Toneladas de dinheiro barato serão despejadas nos mercados americanos. A estimativa é que sejam trilhões de dólares por dia. Na última conta previam-se US$ 6 trilhões, de acordo com o economista da Casa Branca, Larry Kudlow.
Em um sinal de que esse dinheiro será liberado, a Casa Branca fechou um acordo no início desta quarta-feira (25) com os democratas e republicanos do Senado para o plano de estímulo, a fim de responder ao choque econômico da disseminação do coronavírus. A votação do plano será feita em breve.
Mas, antes disso, os futuros do ouro com entrega em abril na COMEX de Nova York ficaram a apenas 85 centavos de repetir o patamar de US$ 1.700 atingido há duas semanas.
Abrupta mudança de destino
Em apenas dois dias, os contratos futuros se valorizaram US$ 176, ou 11%, uma abrupta mudança de destino depois de perder US$ 254, ou 15%, desde as máximas de sete anos a US$ 1.704,30, no dia 8 de março, até as mínimas de quatro meses a US$ 1.450,90 no dia 16 de março.
Se o ouro avançar sem parar a partir de agora, seus testes subsequentes serão uma série de máximas estabelecidas em 2012, a começar por US$ 1.722,30 em dezembro, depois US$ 1.750 em novembro, US$ 1.785,30 em setembro e US$ 1.794,80 em outubro.
A volatilidade tomou conta do ouro nas duas últimas semanas da restrição de caixa nos mercados, das ações ao crédito. O mais interessante é que o desfalecimento do ouro coincidiu com a perda épica de 5.000 pontos no Dow nas duas semanas até 23 de março.
“Há tanto estímulo monetário sendo injetado nos mercados que era possível que isso acontecesse com o ouro em algum momento”, declarou Eli Tesfaye, estrategista de metais preciosos na RJO Futures, de Chicago, em uma entrevista ao Investing.com na terça-feira (24).
“É importante ressaltar que a correção nos mercados, tanto em Wall Street quanto nas commodities, está em modo de espera neste momento, o que impediu que os ganhos no ouro fossem usados para cobrir perdas em outros ativos, permitindo que ele disparasse com base na sua condição de porto seguro."
Retomada da flexibilização quantitativa vista em 2008
Como notou o Goldman Sachs na terça-feira, a recente liquidação no ouro foi muito parecida com a ocorrida em 2008, quando o metal precioso inicialmente não atuou como porto seguro, despencando cerca de 20% por causa da força do dólar e da corrida por caixa. O ponto de virada ocorreu com a flexibilização quantitativa de US$ 600 bilhões anunciada em novembro daquele ano pelo Federal Reserve (Fed, banco central dos EUA).
“Estamos começando a ver a emergência de um padrão similar", declarou uma instituição de Wall Street, reafirmando seu alvo de 12 meses a US$ 1.800 para o ouro spot. O ouro à vista não se aproximava desse nível desde 2011, quando estabeleceu máximas recordes acima de US$ 1.900.
Larry Kudlow, economista do governo Trump, afirmou que a flexibilização quantitativa desta vez incluiria US$ 4 trilhões em poder de crédito para o Fed, além de um pacto de auxílio de US$ 2 trilhões que está sendo articulado no Congresso.
Os detalhes do pacote acordado pelo Congresso na quarta-feira (24) não foram disponibilizados imediatamente. Mas os negociadores disseram que o projeto prevê bilhões em assistência a companhias, estados e cidades, bem como cheques a serem destinados à maioria dos americanos, além de empréstimos e auxílios para que pequenas empresas mantenham suas folhas de pagamento. Também está previsto um seguro-desemprego mais abrangente, renúncias tributárias e diversas outras medidas.
Ação do Fed gera volatilidade
Separadamente, o Fed declarou que inundaria os mercados com dinheiro ilimitado para comprar ativos e conduzir operações de recompra no mercado financeiro.
“Isso é o que se chama de bazuca", afirmou a TD Securities em nota. “Nesse contexto, as expectativas de desinflação finalmente encontraram um piso, interrompendo a disparada nas taxas reais, haja vista que as taxas de juros já estão próximas de zero.”
A empresa disse ainda que hedge funds interromperam seus programas de venda no ouro e começaram a aumentar suas posições líquidas para impulsionar ainda mais o rali.
Ed Moya, da plataforma de negociação online OANDA, concorda:
“A volatilidade no ouro não vai desaparecer no curto prazo, mas tudo indica que o Fed foi capaz de acabar com sua maior dor de cabeça: a busca ferrenha por liquidez.”