Os juros em patamares baixos vêm contribuindo para o crescimento do mercado de galpões logísticos, que caiu nas graças do investidor de FIIs. O movimento é positivo, mas não a qualquer custo.
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Ao longo de 2020, vimos um intenso debate sobre até onde o Banco Central poderia cortar a Selic sem prejudicar a economia, o chamado “lower bound”.
Alguns analistas de mercado insistiram durante boa parte do ano que o BC foi longe demais no corte de juros, colocando a estabilidade da nossa moeda em risco.
Outros entenderam que a recessão sem precedentes pela qual passamos exigiu da autoridade monetária um patamar temporário de juros extraordinariamente estimulativo – para perseguir a meta de inflação no horizonte relevante para a política monetária.
Sempre compartilhei da opinião do último grupo, mas entendo que o mercado é assim mesmo, dificilmente há consensos em determinados temas.
Até porque, se houvesse, não teríamos negócios…
Mas talvez um dos poucos assuntos unânimes no mercado é o benefício que o juro em patamar baixo, quando crível, proporciona à economia real.
Não preciso ir muito longe para trazer um exemplo de como o juro baixo vem impactando diretamente um segmento do mercado de Fundos Imobiliários.
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Crescimento do mercado de Galpões
Com um território de mais de 8,5 milhões de quilômetros quadrados, é mais do que sabido que o Brasil possui dimensões continentais.
Essa condição geográfica somada à busca de aumento de eficiência de custos e operações por parte das empresas, além do crescimento do e-commerce, impulsionado ainda mais pela pandemia, vêm aumentando a demanda corporativa por espaços logísticos pelo país.
Fonte: Log Commercial Properties (SA:LOGG3) e Ebit | Nielsen Webshoppers 42. Gráfico mostra número de consumidores que fizeram compras online no período (milhões de consumidores).
O problema é que, do estoque total de 145 milhões de metros quadrados de galpões espalhados pelo Brasil, cerca de 80 por cento estão concentrados na região Sudeste, e quase 90 por cento são considerados ultrapassados.
Fonte: Log Commercial Properties e Colliers International. Gráfico mostra galpões logísticos por classe 1T20². Galpões Classe A: 10,7% Galpões obsoletos: 89,3%
Para se ter uma ideia do quanto estamos para trás em termos de qualidade de imóveis logísticos, embora o México conte com uma área equivalente a apenas 25% do nosso território, a sua área de galpões logísticos de boa qualidade (classe A) é quase cinco vezes superior à nossa.
Parte importante desse legado é resultado do nosso passado recente de juros altos.
Afinal, com uma Selic de dois dígitos ao ano remunerando o investidor, havia pouquíssimos incentivos para se construir novos galpões pelo país, concorda comigo?
Mas os tempos estão mudando...
Os analistas de mercado até podem divergir entre si sobre a magnitude ideal para a taxa Selic, mas fato é que estamos vivenciando um momento único na história do nosso país.
Com os juros de curto e longo prazo em patamares baixos, o custo da dívida das empresas cai e investimentos até então impensáveis passam a ser viáveis.
Custo nominal da dívida (verde claro) e Yield on Cost (verde escuro). Fonte: Log Commercial Properties.
O crescimento no mercado de galpões logísticos nos últimos anos é um reflexo dessa dinâmica.
É possível notarmos, por exemplo, um importante aumento na quantidade de novos estoques de galpões entregues no Estado de São Paulo ao longo dos últimos trimestres.
Como a demanda das empresas pelos espaços segue alta, a absorção líquida desse mercado segue positiva para a região, reduzindo a taxa de vacância dos galpões.
Gráfico mostra galpões logísticos em São Paulo, do 2T15 ao 3T20. Fonte: BTG Pactual (SA:BPAC11) e Buildings.
Caso se perpetue, a atual dinâmica do mercado de galpões logísticos tenderá a continuar beneficiando os investidores de Fundos desse segmento, mas é preciso cautela com um ponto em específico.
Custe o que custar?
Sabendo do momento favorável e da predileção dos investidores pelo segmento, muitas incorporadoras/construtoras de galpões vêm aumentando a sua presença no mercado de FIIs.
O movimento é positivo, mas precisamos nos atentar a possíveis conflitos de interesses na venda de imóveis logísticos dessas empresas para os Fundos que elas prestam serviço de consultoria imobiliária.
Nem todo conflito de interesse (como o mencionado) é necessariamente ruim para os cotistas, mas exige que o investidor se mantenha vigilante em relação aos valores praticados nas transações.
Afinal, uma venda de determinado imóvel logístico a um preço acima do praticado atualmente no mercado pode beneficiar o vendedor, mas certamente prejudicará permanentemente a geração de renda do Fundo.
Abraços e um excelente Natal para você!