Os jornalistas ficaram visivelmente frustrados com o presidente do Federal Reserve (Fed), Jerome Powell, diante da sua insistência em dizer que a inflação — apesar de todas as evidências em contrário — atingiria em breve a meta de 2% almejada pelo banco, durante a coletiva de imprensa realizada na quarta-feira, após o anúncio da decisão do Fed sobre a taxa de juros.
Diante do bom desempenho da economia, com a clara retomada do crescimento, baixo desemprego, criação de postos de trabalho mais do que adequada para absorver os novos candidatos no mercado e a inflação fora de preocupação, tudo está "de acordo com a posição [do Fed] de continuar paciente na avaliação de outros ajustes na política monetária”, declarou Powell em seu pronunciamento de abertura, após a reunião de dois dias do Comitê Federal de Mercado Aberto (FOMC, na sigla em inglês), que votou por manter a política monetária inalterada.
Com isso, Powell deu um pouco de consolo ao presidente dos EUA, Donald Trump, e a todos aqueles que esperavam ver um corte nas taxas de juros no curto prazo. “Realmente acreditamos que a nossa política é apropriada neste momento", declarou Powell, que disse ainda: “Não vemos razões convincentes para seguir em qualquer direção”.
Muitos investidores especulavam que o próximo movimento do Fed seria um corte na taxa de juros e, por isso, acabaram vendendo suas ações com a divulgação da notícia.
O aspecto mais importante do posicionamento de Powell foi sua convicção de que a inflação em 2% está muito perto de ser atingida. “Nossa perspectiva básica continua a mesma, com um forte mercado de trabalho e crescimento contínuo; a inflação retornará para 2% com o tempo e ficará praticamente simétrica ao redor do nosso objetivo de longo prazo”, declarou Powell.
Os repórteres tentaram várias vezes, em vão, fazê-lo ir além dessas declarações. Observando que a inflação poucas vezes superou os 2% nos últimos sete anos, eles queriam saber em que condições o Fed atuaria caso a inflação continuasse persistentemente baixa. Outra indagação feita era o que o Fed poderia fazer para elevar a inflação se chegasse à conclusão de que precisava fazer algo?
Powell evitou responder a essas questões. Afinal, o comitê acredita piamente que a inflação alcançará, em algum momento, os 2% ou ficará inclusive acima disso com a bênção do Fed para que sua meta seja "simétrica", ou seja, em alguns momentos abaixo de 2%; em outros, acima desse valor.
Os formuladores da política do FOMC observaram que a inflação desde o início do ano se mostrou “de certa forma mais fraca” do que esperavam, reconheceu Powell, mas os membros do comitê “suspeitam que alguns fatores transitórios podem estar ocorrendo”.
Os jornalistas queriam saber quais eram esses fatores transitórios. As taxas de gestão de portfólio, por exemplo, seriam mais baixas no primeiro trimestre, refletindo a queda nos valores dos ativos ao final do ano passado. E... os preços do setor de vestuário. Powell sugeriu que a mudança no cálculo desses preços impactou a taxa de inflação.
O impacto disso teria que ser bastante significativo para que a inflação geral fosse de apenas 1,5% e a inflação básica, excluindo os preços voláteis do setor de alimentos e energia, surpreendentemente fosse de 1,6%. Essa é a medida preferida do Fed, o índice de despesas com consumo pessoal, que também ficou em 1,3% na comparação trimestral da inflação básica no primeiro trimestre.
Para o Fed, ao que parece, o que mantém a inflação baixa são sempre fatores transitórios. Powell se recusou a responder à pergunta sobre a quantidade de fatores transitórios que estão contribuindo para que a inflação continue persistentemente baixa.
Mas ele satisfez um pouco a curiosidade de todos aqueles jornalistas frustrados. Se os dados do gasto com consumo pessoal realmente servem de base para os argumentos do Fed, o que dizer da “taxa de inflação média truncada desse segmento”? Essa medida, rastreada pelo Fed de Dallas, avalia grandes movimentos de alta e baixa para calcular a inflação “média”. Com base nessa medida, a inflação não caiu em março, embora também tenha permanecido abaixo de 2%, tal como se comportou na maior parte dos últimos anos.
Em retrospectiva, um jornalista fez a seguinte pergunta: “O senhor acha que se não tivesse elevado as taxas de juros no ano passado, a inflação teria atingido a meta?”.
Powell iniciou sua resposta dizendo: “Se você se lembrar, naquele momento...”, ignorando o aspecto “em retrospectiva” da questão. Naquele momento, segundo Powell, a elevação dos juros parecia ser uma boa ideia para neutralizar as pressões inflacionárias que poderiam se intensificar, muito embora não houvesse qualquer evidência disso. Quem sabe, em alguma coletiva futura, Powell diga: “Naquele momento, parecia ser uma boa ideia deixar os juros inalterados”.