Uma empresa imobiliária chinesa ameaça quebrar e levar junto vários setores, como construção civil, produtores de insumos para a construção e o setor imobiliário, credores variados, investidores, clientes que compraram imóveis e não receberam, etc. Ao que parece, a China encara agora o risco do estouro de uma “mega bolha imobiliária”.
1. Milton Friedman, numa visita em 1980 à China, se confrontou com uma obra de uma grande hidrelétrica. Vendo o canteiro, com vários operários disse que uma retroescavadeira resolveria o problema. Respondeu então o burocrata chinês, “mas imagina o número de desempregados que isso geraria!”. Ao que ele respondeu. Se o problema é emprego então dê a cada um uma colher para escavar a terra. Tem-se aqui a questão chave.
Para crescer uma economia precisa ter produtividade de fatores. Produzir cada vez mais, gastando cada vez menos. Isso não se aplica a China no seu “capitalismo de Estado”.
2. No momento, a China possui uma dívida de 280% do PIB, boa parte dela na mão do setor privado. Desarmar esta bomba é um dos desafios do líder Xi Jinping. Nos últimos anos, o governo chinês destinou US$ 1,4 trilhão para o setor imobiliário. Somando tudo, os imóveis chineses valem hoje cerca de Us$ 51 trilhões, 70% de toda riqueza do país. O problema é que não há renda suficiente para tudo isso. Dito isso, há excesso de moradias no país, 21% delas vagas (65 milhões).
Ter residência é considerado uma “reserva de valor” por lá, com 96% dos chineses tendo ao menos uma casa. Isso tudo representa 57% do crédito imobiliário global! O problema é que pelo excesso de ofertas, a rentabilidade destes ativos acaba minguando. Em Beijing não passa dos 2%.
3. Tudo isso tem gerado um problema sério de má alocação de recursos. Excesso de ofertas acaba por gerar uma perda de renda para o futuro, num país que não possui sistema previdenciário. Estudos indicam que os chineses possuem 78% do seu patrimônio em imóveis, contra 35% dos americanos. O problema é que a população chinesa está envelhecendo rápido, tal qual o Brasil, em muito, pelo passado da política de “filho único”. Em 2050, 39% dos chineses devem estar com idade para se aposentar. Sem programas públicos, como o INSS ou Social Security americano, os chineses possuem uma forte cultura de “poupança”. Poupam tudo que podem, pensando na velhice.
4. Em paralelo, o governo chinês sempre estimulou as províncias a comprarem terras e ao surgimento de empresas chinesas, privadas e globais. Isso fez com que o PIB crescesse de forma desproporcional, mesmo não havendo renda suficiente entre a população. O que impulsionou o PIB, nos “anos de ouro”, nos anos 90 e 2000, foram os investimentos públicos e privados, foram as obras públicas e privadas, estimuladas por programas de governo. Lembremos de várias cidades fantasma surgidas, sem gente para morar.
5. No caso China Evergrande Group (HK:3333), muitos acham que o governo deve intervir, outros que deve deixar quebrar. A agência S&P, por exemplo, não espera que o governo chinês dê qualquer suporte à gigante imobiliária. Por outro lado, pelos estragos, “efeito contágio”, muitos esperam que o Banco Popular da China intervenha com força, visto que esta empresa “é muito grande para quebrar” (too big to fail). Cálculos variados indicam que o setor imobiliário chinês represente 25% do PIB do país.
6. Desde agosto de 2020 o governo chinês tem atuado para regular vários mercados, evitar bolhas futuras, reduzir o excesso de alavancagem das construtoras e normalizar os preços das casas pelo país (hoje o mais caro do mundo pelo nível de renda das pessoas).
7. O Banco Popular da China busca também segue esta toada, normalizando o “risco de crédito” no país. As taxas de juros dos bonds corporativos sempre operam com spread muito apertado, dado que as empresas possuem garantias do governo. O objetivo é corrigir esta distorção. Os bonds devem refletir de fato o risco de crédito da empresa. E o moral hazard, na qual muita intervenção pública acaba gerando alguma leniência dos investidores diante de qualquer risco.
8. O governo deve intervir? Sim, mas para manter a mínima liquidez deste mercado e não salvar a Evergrande e seus credores/acionistas. Primeiro, por causa do conceito de moral hazard em que excesso de socorros públicos acabam gerando negócios irresponsáveis sem leitura de risco. Segundo, porque a China segue num ciclo de muita regulação. Já o fez nas bigtechs, no mercado de gamers, etc.
9. No ano que vem, a China recebe os Jogos Olímpicos de Inverno e em outubro, o 20º Congresso Nacional do Partido Comunista, talvez com Xi Jinping reconduzido ao posto de secretario geral do partido e presidente do País. Será o seu terceiro mandato. Neste ambiente, é por bem o governo buscar um ambiente de estabilidade econômica.
10. Algumas medidas devem ser anunciadas, como: (1) socorro aos bancos credores mais envolvidos com a Evergrande; (2) linhas de crédito para as empresas fornecedoras mais envolvidas; (3) Apoio a empresas estatais comprando participação em empresas mais encalacradas.
11. Para o Brasil, uma forte desaceleração da China terá efeitos desastrosos. Estimativas indicam crescimento entre 7% e 7,5% neste ano e no próximo. Segundo a instituição Wells Fargo, pelas suas métricas de avaliação, o Brasil é um dos mais vulneráveis, pois depende fortemente de exportações, preços altos das commodities, fortemente integrados ao sistema financeiro chinês. Só para observarmos, a Vale (SA:VALE3) já perdeu US$ 40 bilhões do seu valor de mercado, pelo colapso do minério de ferro, com a crise chinesa.
Ainda sobre o Brasil, hoje tem início a reunião do Copom, e nos EUA a FOMC FED. No Congresso, o tema da PEC dos precatórios é tratado com a máxima responsabilidade. Acham os atores envolvidos, Rodrigo Pacheco, do Senado, Arthur Lira do Congresso e Paulo Guedes, que o tema deve ser finalizando nesta semana. Hoje é dia do presidente proferir discurso inaugural na plenário das Nações Unidas em NY. Vamos ver o que vai sair dali. Nos EUA, o debate versa sobre a elevação do teto da dívida pública, também um problema por lá.
Mercados
O derretimento dos mercados globais segue na ordem do dia.
Nesta madrugada (05h05), dia 21/09, na Ásia, o temor de colapso da gigante Evergrande segue afetando os mercados. Nikkei -2,17%, a 29.839 pontos; KOSPI, na Coréia do Sul, +0,33%, a 3.140 pontos; Shanghai Composite, +0,19%, a 3.613 pontos, e Hang Seng,+0,55%, a 24.231 pontos.
Nesta madrugada do dia 21/09, na Europa (04h05), nos futuros os mercados operavam em alta. DAX (Alemanha) avançando 0,57%, a 15.217 pontos; FTSE 100 (Reino Unido), +0,70%, a 6.952 pontos; CAC 40 (França), +0,94%, a 6.516 pontos, e EuroStoxx50 +0,77%, a 4.074 pontos.
Nos EUA, as bolsas de NY no mercado futuro, operavam às 05h05, dia 21/09, da seguinte forma: Dow Jones avançando 1,07%, a 34.210 pontos, S&P 500, +0,94%, a 4.389 pontos, e Nasdaq +0,96%, a 15.157 pontos. No mercado de Treasuries, US 2Y avançando 2,73%, a 0,2219, US 10Y +2,60%, a 1,343 e US 30Y, +1,60%, a 1,877. No DXY, o dólar recuava 0,05%, a 92,207. Petróleo WTI, a US$ 71,30 (+1,65%) e Petróleo Brent US$ 74,93 (+1,37%).
Na agenda desta terça-feira, destaque para as reuniões de política monetária do Fed e do Copom. Na quinta-feira temos o Banco da Inglaterra. Nesta terça-feira ainda temos a OCDE divulgando as projeções de crescimento das economias do G-20, e ainda, os indicadores PMI dos EUA e Zona do Euro.