Por Kathy Lien, diretora executiva de estratégia de câmbio da BK Asset Management
A teleconferência do G7 acabou ficando em segundo plano com a decisão do Federal Reserve (Fed, banco central dos EUA) de reduzir as taxas de juros em 50 pontos-base. Esse corte inesperado foi o primeiro realizado entre reuniões desde a crise financeira mundial. Embora a discussão do G7 provavelmente tenha contribuído para a decisão de afrouxamento do Fed, o momento foi uma surpresa completa: apenas duas horas depois da divulgação do anúncio do G7.
Ficou bastante claro que os banqueiros centrais estão preocupados não só com o impacto econômico do Covid-19, mas também com as perdas no mercado acionário. De acordo com o presidente do Fed, Jerome Powell, que realizou uma coletiva de imprensa para esclarecer a decisão, a disseminação do coronavírus perturbou a economia de diversos países, e essas medidas pesarão sobre a atividade por algum tempo. A magnitude e a persistência do impacto são incertas, mas houve uma mudança significativa nos riscos para a perspectiva do banco central americano, a ponto de justificar um movimento de suporte à economia. Powell disse ainda que os países do G7 tomarão outras ações, além da possibilidade de realizarem uma coordenação formal. Em outras palavras, pode ser haja mais flexibilização por parte de outros bancos centrais além do Fed se a liquidação das ações se acentuar e a desaceleração mundial piorar.
O dólar estadunidense afundou após o anúncio, caindo forte contra o euro, o iene japonês e outras moedas importantes.Esse movimento está de acordo com as expectativas, pois a ação do Fed foi bastante agressiva, reduzindo imediatamente a vantagem do rendimento do dólar contra outras moedas. A liquidação nas ações, por outro lado, pode ser mais difícil de compreender. Logo após o anúncio, as ações dispararam em alívio, mas, ao final do pregão em Nova York, o Dow Jones havia despencado mais de 169 pontos.
O problema para o Fed e outros bancos centrais é que os cortes de juros não conseguem resolver uma crise de saúde. Embora o Fed acreditasse que uma flexibilização precoce e agressiva pudesse dar segurança aos investidores, acabou, na verdade, tendo o efeito contrário, ao ressaltar a extensão da preocupação do banco central americano. Os investidores esperam outro movimento em abril, e alguns não descartam um corte adicional de 25 pontos-base em 18 de março. Por enquanto, a real questão é quem atuará em seguida.
Anteontem à noite, o Reserve Bank da Austrália (RBA) reduziu as taxas de juros em 25 pontos-base. Ao contrário do Fed, o banco central australiano optou por um movimento menos agressivo, pois acreditou que era cedo demais para determinar a persistência dos efeitos do vírus. Dito isso, o RBA admitiu que o impacto na economia até o momento era significativo, com um enfraquecimento provavelmente acentuado do PIB trimestral. A instituição está preparada para uma flexibilização maior se necessário.
O Banco do Canadá tem um anúncio de política monetária na quarta-feira. Os dados no país não têm sido terríveis, mas o mercado já descontou completamente um corte de 25 pontos-base. Será interessante ver se o governador Stephen Poloz, que estava estritamente comprometido com os dados, será condescendente. Os preços do petróleo caíram forte, e os valores das ações estão erodindo. Seria um erro do banco central canadense ignorar todos os riscos que estão se acumulando. Esperamos pelo menos um corte de 25 pontos-base por parte do Banco do Canadá, acompanhado do mesmo compromisso de fazer mais se necessário.
O Banco do Japão e o Banco da Inglaterra deixaram claro que estão prontos para elevar o estímulo, mas não ouvimos muito por parte do Banco Central Europeu. Operadores estão precificando uma chance de 90% de que haverá um corte de juros maior em território negativo. Esses bancos centrais não têm muito espaço de manobra (o que explica parte da força do euro), mas não ficarão de fora, deixando os outros fazerem todo o trabalho. Em vista da reação do mercado à iniciativa do Federal Reserve, é provável que haja mais perdas nas ações norte-americanas e no dólar. É bom ficar de olho em um rompimento dos 107 no USD/JPY durante o pregão asiático.