Até a primeira metade do século passado, a atratividade dos investimentos era julgada basicamente pela expectativa de ganhos a serem obtidos. Embora o conceito de risco fosse conhecido, o desvio padrão, uma medida simples mas com várias propriedades interessantes, não era usualmente empregado no ramo das finanças para medir o risco. Isso começou a mudar especialmente depois de 1952, com o surgimento da Moderna Teoria de Portfolio. Diversos avanços surgiram desde então, e neste relatório focaremos em um deles, o Índice de Sharpe. Essa medida tem a vantagem de incorporar um componente de risco para estimar a atratividade de um investimento, permitindo uma comparação mais justa entre alternativas de aplicações de nosso suado patrimônio.
Para o cálculo do Sharpe, são necessários dois conjuntos de dados: os retornos de um investimento em um período, e retornos de um investimento considerado “livre de risco”. O ativo livre de risco costuma ser um titulo do governo, por ser o menos arriscado do país, no período analisado igual ao investimento com risco. Vemos assim que o período escolhido têm relevância.
Nesse primeiro relatório sobre a comparação do Sharpe em diversos investimentos, foi utilizado o período de 2016 até último dado disponível de julho. Por que essa escolha? Este período é suficientemente longo para nossa análise, e não coincide com o início da forte alta nos preços do Bitcoin (outubro de 2015), retirando da análise um período que favoreceu de sobremaneira o retorno do Bitcoin. Finalmente, foram utilizados dados mensais por se tratar da frequência padrão, mas nada impede que futuramente utilizemos outras frequências, como semanal ou diária, em nossas futuras análises.
Com base nesses dados, são calculadas a média dos retornos do investimento, que é uma estimativa – embora imperfeita de sua volatilidade, medida pelo desvio padrão. O Sharpe simplesmente divide o retorno médio que o ativo com risco obteve acima do livre de risco pela sua volatilidade. O resultado dessa divisão nos dá uma boa ideia de como cada unidade do risco tomado é remunerada, ou seja, como se espera que um investimento vá remunerar seu detentor por ter incorrido no risco de perder dinheiro superior ao do ativo livre de risco.
Assim, calculamos o Sharpe do Bitcoin no período em 0,48. Ok, e o que isso quer dizer na prática, além de que cada unidade de risco foi recompensada por 0,48 unidades de retorno? É preciso contextualizar tal dado, comparando-o com outros investimentos considerados de risco, como as ações. Assim, vale como primeira abordagem comparar com o Sharpe do mais famoso índice dos Estados Unidos, o S&P500, que fornece uma média das variações de ações das 500 principais empresas daquele país: 0,41. A diferença entre eles foi de cerca de 18% a favor do Bitcoin. Além disso, escolhemos algumas ações queridinhas dos investidores globais, com foco no setor de tecnologia, além de duas das maiores empresas representantes das indústrias tradicionais, que vemos abaixo, com o retorno médio já descontado do rendimento livre de risco nos EUA:
Esta escolha por ações estrangeiras não foi apenas coincidência, mas trataremos disso em artigos futuros. Aproveitando o suspense gerado, iremos também oportunamente abordar medidas alternativas, que buscam tratar alguns pontos em que o Sharpe deixa a desejar para nosso propósito geral, que é, lembrando, avaliar e comparar a atratividade de investimentos. Mas por enquanto, podemos ver na tabela que nenhuma ação remunerou melhor o investimento, mesmo quando ajustado pelo risco; nem mesmo as poderosas empresas de tecnologia como Apple (NASDAQ:AAPL) ou Amazon! Algumas ações tradicionais, como a GE ou Ford, tiveram Sharpe negativo no período: quem colocou dinheiro nelas não só correu risco como perdeu dinheiro, mesmo numa janela de investimento de 3 anos!
Concluímos assim que não apenas o Bitcoin teve o melhor retorno médio no período por longa margem, mas que recompensou melhor seus investidores mesmo quando consideramos o risco de cada investimento. Ou seja, as ações tiveram um retorno médio bem inferior ao do Bitcoin, e embora o risco também tenha sido menor, não foi tão menor de forma a superar o Bitcoin em termos de retorno ajustado pelo risco. Neste primeiro estudo, buscamos de maneira bastante criteriosa, desmistificar o argumento de que investir em Bitcoin traz retorno, mas traz ainda mais frio na barriga (volatilidade). Proporcionalmente, isto não é verdade! Ao contrário, pudemos ver que o risco corrido foi mais que compensado, mesmo quando comparado com as melhores ações do mercado dos EUA.