Durante alguns anos da minha vida, trabalhei com a criação e implementação de programas de fomento ao desenvolvimento econômico de países emergentes, financiados pelo governo do Reino Unido. Como responsável pela área de mercado financeiro e economia, me dedicava a estudar como o desenvolvimento e modernização de ferramentas financeiras poderiam contribuir para questões socioeconômicas, como a redução da pobreza e da desigualdade.
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Para quem já acompanhou essa agenda de perto, sabe que a inclusão financeira da população tem um poder extraordinário de transformação econômica na sociedade. Isso porque (de maneira simplificada), indivíduos incluídos no sistema financeiro formal passam não somente a ter “uma conta no banco”, mas, principalmente, a ter acesso a duas questões centrais: crédito e segurança.
Imagine a diferença que transações, mesmo que pequenas, que passam a ser registradas e seguras, não fazem para um pequeno trabalhador informal, que até então registrava o que gastava e o que comprava em papéis (ou, muito provavelmente, nem registrava nada). Imagine ter que guardar todo seu dinheiro do trabalho em espécie, não ter acesso a nenhum tipo de crédito ou financiamento, e tentar construir uma casa, comprar uma geladeira ou mesmo um celular?
Imagine viver nessa “bolha”, fora de todo o sistema financeiro formal, com lenço e documento, mas sem nenhuma garantia de segurança ao seu suado dinheirinho?
A vida real e os dados comprovam que essa bolha não faz bem a ninguém. Diversos estudos empíricos, com informações reais indicam a relação positiva entre inclusão financeira e redução de pobreza. Em outras palavras: a inclusão financeira ajuda a reduzir a pobreza.
Um estudo realizado em Gana demonstra que a inclusão financeira reduz em 27% a probabilidade de uma família se manter na linha de pobreza, além de prevenir em 28% a exposição à pobreza no futuro - especialmente se tratando de famílias geridas financeiramente por mulheres.
É justamente esse um dos desafios que o Banco Central teve como objetivo enfrentar ao criar o PIX, a ferramenta de pagamento instantâneo que acaba de completar seu aniversário de um ano.
É claro que, como vocês devem saber, o PIX não é um programa de “bancarização” em si. Ou seja, ele não cria contas em bancos ou outras instituições financeiras para ninguém.
Porém, ele faz algo quase tão eficiente quanto: ele cria incentivos. A existência do PIX cria um estímulo para que pessoas abram suas contas em instituições financeiras. Afinal, com uma conta que dê acesso ao PIX, todos podem realizar transações mais seguras, transparentes, rápidas – e o melhor, sem custo algum (para pessoas físicas).
Tem dado certo? Os números, novamente, não mentem: desde sua criação no ano passado, o PIX registra mais de 110 milhões de usuários. Lembrando que: o Brasil tem um total de 212,6 milhões de habitantes (considerando que a mesma pessoa pode ter até cinco chaves PIX registradas com diferentes instituições), o número deixa claro que o brasileiro está de fato está abraçando essa ideia.
Já em número de transações, considerando o mesmo período de um ano, aproximadamente 6 bilhões de operações foram efetuadas via Pix. E quanto esse total representa em dinheiro? Mais de R$ 3,75 trilhões. Tudo isso circulando por meios formais - aumentando assim, o nível de inclusão financeira no país.
É claro que o sistema do PIX também não é imune aos desafios e críticas. Dos principais, podemos citar as inúmeras fraudes bancárias e “golpes” que cresceram exponencialmente nos últimos meses, utilizando da facilidade e rapidez do sistema para transferência de recursos roubados. Tentando estancar os impactos negativos, o Banco Central determinou, por exemplo, um limite de R$ 1.000 para transferências realizadas entre 20h e 6h.
Outro desafio para que a inclusão financeira facilitada pelo PIX alcance ainda mais brasileiros é o acesso à internet. Hoje, o sistema só funciona por meio de plataformas de instituições financeiras, conectadas pela internet – o que acaba por, infelizmente, impedir o acesso de parte relevante da população do país.
Porém, mesmo com as adversidades, uma coisa é fato: o PIX deu e está dando um verdadeiro primeiro furo na bolha de milhares de brasileiros em direção à inclusão financeira e ao mundo dos investimentos.