Por Ricardo Brito
BRASÍLIA (Reuters) - A Polícia Federal encontrou indícios de que o ex-presidente Jair Bolsonaro tinha conhecimento de um plano para assassinar o então presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva como parte de um golpe de Estado após a eleição de 2022, disseram nesta quinta-feira duas fontes com conhecimento direto das investigações.
A conclusão consta do relatório final das apurações da PF para investigar a suposta tentativa de golpe de Estado após a derrota eleitoral de Bolsonaro, que foi entregue ao Supremo Tribunal Federal (STF) nesta quinta, de acordo com as fontes.
Uma das fontes da PF detalhou à Reuters os indícios que envolvem Bolsonaro, mencionando que o então presidente estava no Palácio do Planalto no mesmo momento em que o plano para matar Lula e o então vice-presidente eleito, Geraldo Alckmin, foi impresso em um gabinete do palácio presidencial.
Há ainda conversas de terceiros que levam a essa compreensão, entre outros elementos de prova, acrescentou a fonte.
O relatório final da PF após quase dois anos de investigações, segundo uma das fontes, tem mais de 800 páginas e pede que o ex-presidente -- tido como peça-chave na trama golpista -- seja responsabilizado criminalmente pelos crimes de golpe de Estado, abolição violenta do Estado democrático de direito e organização criminosa.
Além de Bolsonaro, importantes pessoas do primeiro escalão do governo dele também foram responsabilizadas, como o companheiro de chapa na disputa presidencial de 2022 e ex-ministro da Casa Civil, general da reserva Braga Netto, e o ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) general da reserva Augusto Heleno, em um total de 37 pessoas.
Procurado, o advogado Paulo Cunha Amador Bueno, principal representante da equipe de defesa de Bolsonaro, disse que vai aguardar o relatório para se manifestar.
Em publicação na rede social X, Bolsonaro disse que aguardará seu advogado para tratar do indiciamento, ao mesmo tempo que criticou o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), acusando o magistrado de fazer "tudo o que não diz a lei".
"O ministro Alexandre de Moraes conduz todo o inquérito, ajusta depoimentos, prende sem denúncia, faz pesca probatória e tem uma assessoria bastante criativa. Faz tudo o que não diz a lei", escreveu Bolsonaro na rede social.
"Tem que ver o que tem nesse indiciamento da PF. Vou esperar o advogado. Isso, obviamente, vai para a Procuradoria-Geral da República. É na PGR que começa a luta. Não posso esperar nada de uma equipe que usa a criatividade para me denunciar."
O advogado de Augusto Heleno disse que não vai se manifestar, enquanto a defesa de Braga Netto não respondeu de imediato a pedido de comentário.
A finalização das investigações sobre Bolsonaro e demais envolvidos sobre a suposta tentativa de golpe de Estado para impedir a posse de Lula foi enviada ao STF para Moraes, que repassará o caso ao procurador-geral da República, Paulo Gonet.
Caberá a Gonet, como chefe do Ministério Público Federal (MPF), decidir se denuncia criminalmente, se arquiva a apuração por falta de provas ou se pede diligências complementares. De acordo com uma fonte do MPF, o procurador-geral vai esperar o relatório sobre a suposta tentativa de golpe para analisar em conjunto com outras investigações em andamento contra o ex-presidente, mas não há um prazo para isso.
As acusações formais da PF seriam um novo golpe nos planos de Bolsonaro de concorrer à Presidência em 2026. Aliados dele querem anular decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de torná-lo inelegível devido aos seus ataques à legitimidade do sistema de votação do país em 2022, mas o avanço das investigações deve complicar a situação do ex-presidente.
PLANO DE ASSASSINATO
A iniciativa da PF de apresentar o pedido de indicamento de Bolsonaro ocorre dois dias depois de a corporação ter deflagrado uma operação em que prendeu um policial e quatro militares do Exército -- um deles um general que foi ministro interino de uma pasta no Palácio do Planalto sob Bolsonaro -- por terem supostamente arquitetado um plano para assassinar Lula e seu então candidato a vice Alckmin, além do ministro Moraes, do STF.
De acordo com as investigações da PF, em ao menos duas circunstâncias, nos dias 9 de novembro e 6 de dezembro de 2022, o documento com planos para assassinar Lula, Alckmin e Moraes foram impressos no Palácio do Planalto em momentos em que o então presidente Bolsonaro se encontrava no local.
Essa constatação foi detectada com o cruzamento da localização do celular do general da reserva Mario Fernandes, preso na operação de terça-feira, e o histórico de impressão da impressora do Planalto utilizada na ocasião.
Bolsonaro se tornou investigado pelo STF no caso da suposta tentativa de golpe, a pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR), cinco dias após os ataques de 8 de janeiro de 2023 por bolsonaristas radicais às sedes dos Três Poderes, em Brasília, com o objetivo, segundo a PF, de derrubar o governo Lula.
Além da investigação sobre a tentativa de golpe de Estado, Bolsonaro já foi indiciado pela PF em outros dois casos: a suspeita de fraude no cartão de vacinação contra a Covid-19 e na investigação sobre apropriação indevida de joias recebidas como presente de Estado do governo saudita.
(Reportagem adicional de Lisandra Paraguassu)