Por Ricardo Brito
BRASÍLIA (Reuters) -A Procuradoria-Geral da República (PGR) informou nesta segunda-feira que vai abrir apurações preliminares para investigar offshores ligadas ao ministro da Economia, Paulo Guedes, e ao presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, citadas em reportagens do caso Pandora Papers.
A PGR confirmou à Reuters que haverá uma Notícia de Fato, espécie de averiguação inicial do caso em que ainda não se aponta qualquer indício de cometimento de crime por parte de qualquer autoridade.
Segundo a assessoria do órgão, o procedimento vai apurar se autoridades brasileiras teriam mantido contas com algum indício de irregularidade em paraísos fiscais.
Uma das questões a ser verificadas é se essas pessoas, em tese, teriam alguma limitação em função dos cargos que ocupam para manter essas contas, informou a PGR.
Na prática, ambas as autoridades não são formalmente investigadas, o que só ocorreria se a PGR decidir pedir ao Supremo Tribunal Federal (STF) abertura de inquérito caso considere haver indícios de crime.
Guedes e Campos Neto foram citados pela investigação Pandora Papers entre autoridades de vários países que teriam envolvimento com empresas em paraísos fiscais.
O caso foi revelado pelo Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (CICJ), uma rede de repórteres e organizações de mídia sediada em Washington.
Em nota, o Ministério da Economia disse que toda a atuação e Guedes no setor privado antes de assumir a pasta foi declarada à Receita Federal, à Comissão de Ética Pública e aos demais órgãos competentes.
"Sua atuação sempre respeitou a legislação aplicável e se pautou pela ética e pela responsabilidade", disse o ministério. "Desde que assumiu o cargo de ministro da Economia, Paulo Guedes se desvinculou de toda a sua atuação no mercado privado, nos termos exigidos pela Comissão de Ética Pública, respeitando integralmente a legislação aplicada aos servidores públicos e ocupantes de cargos em comissão."
Campos Neto, por sua vez, disse em nota distribuída pela assessoria de imprensa do Banco Central que as empresas apontadas na investigação jornalística foram constituídas há mais de 14 anos e que o patrimônio foi declarado à Receita, à Comissão de Ética Pública e ao BC com recolhimento da tributação devida.
"Não houve nenhuma remessa de recursos às empresas após minha nomeação para função pública. Desde então, por questões de compliance, não participo da gestão ou faço investimentos com recursos das empresas. Por exigência legal, todas essas informações foram prestadas também ao Senado Federal", disse Campos Neto.
No final da tarde, em live promovida pelo jornal Valor Econômico, o presidente do BC disse que não fez nenhuma remessa para offshore "em nenhum momento" desde que entrou no governo, e que é importante esclarecer o tema para seguir em diante com agenda.
"Está tudo declarado, inclusive tinha um acesso público pelo site do Senado", afirmou. "Eu não fiz nenhuma remessa para empresa em nenhum momento desde que cheguei ao governo e não fiz nenhum investimento financeiro em nenhuma empresa. Então eu acho que a gente colocou isso numa mensagem, está bastante claro. E é importante explicar, esclarecer obviamente e seguir em diante com nossa agenda".
DESDOBRAMENTOS
O caso também teve desdobramentos no mercado de câmbio e no Congresso Nacional.
Na B3 (SA:B3SA3), o dólar futuro, cujos negócios vão até as 18h (horário de Brasília), acelerou a alta para mais de 5,48 reais, após a PGR informar que vai abrir apuração preliminar.
Partidos de oposição se movimentavam no Congresso para convocar o ministro da Economia e o presidente do Banco Central para explicar as revelações.
"É um caso gravíssimo. A conduta do ministro Paulo Guedes viola frontalmente o artigo 5º do Código de Conduta da Alta Administração Federal e, por isso, já deveria ter levado à demissão do ministro. Nós da oposição entramos com requerimento de convocação do ministro Paulo Guedes, para que ele venha à Câmara dos Deputados tentar se explicar", disse o líder da Oposição na Câmara, deputado Alessandro Molon (PSB-RJ).
Texto publicado no site do PSOL informa que a sigla também apresentou pedidos de convocação de Guedes e Campos Neto. Em tese, esses dois pedidos precisam ser aprovados por colegiados na Câmara, onde os oposicionistas são minoria.
O CICJ teve acesso a mais de 11,9 milhões de registros, que representam cerca de 2,94 terabytes de dados, numa investigação que ganhou o nome de Pandora Papers.
O consórcio disse que os arquivos estão ligados a cerca de 35 líderes nacionais atuais e antigos e mais de 330 políticos e autoridades públicas de 91 países e territórios.
A entidade não disse como os arquivos foram obtidos, e a Reuters não conseguiu verificar de forma independente as alegações ou os documentos detalhados pelo consórcio.
(Edição de Pedro Fonseca)