Por Jessica Bahia Melo
Investing.com – Após reunião de dois dias, o Comitê de Política Monetária (Copom) anunciou na noite desta quarta-feira (08) uma alta na taxa básica de juros (Selic) em 1,5 ponto percentual, de 7,75% ao ano para 9,25%. Foi a sétima alta seguida da taxa Selic, em continuidade ao ciclo de aperto monetário que se iniciou em março quando a taxa de juros estava no patamar mínimo histórico de 2%.
A decisão foi unânime. No balanço de riscos, o Copom avaliou que fatores influenciam a inflação em ambas as direções. Enquanto há uma previsão de reversão do quadro de aumento nos preços das commodities, a política fiscal preocupa, diante das medidas relacionadas à pandemia de covid-19. "Apesar do desempenho mais positivo das contas públicas, o Comitê avalia que questionamentos em relação ao arcabouço fiscal elevam o risco de desancoragem das expectativas de inflação, mantendo a assimetria altista no balanço de riscos. Isso implica maior probabilidade de trajetórias para inflação acima do projetado de acordo com o cenário básico", diz o comunicado.
A previsão é de outro aumento da mesma magnitude na próxima reunião. "O Copom considera que, diante do aumento de suas projeções e do risco de desancoragem das expectativas para prazos mais longos, é apropriado que o ciclo de aperto monetário avance significativamente em território contracionista. O Comitê irá perseverar em sua estratégia até que se consolide não apenas o processo de desinflação como também a ancoragem das expectativas em torno de suas metas", detalha o documento.
Camila Abdelmalack, economista-chefe na Veedha Investimentos, afirma que a decisão veio em linha com o esperado pelo mercado. “Tanto as apostas dos economistas quanto para a curva de juros, a gente não deve ver nenhum momento muito agressivo ou acentuado na curva, inclusive porque a gente caminha para um desfecho da PEC dos precatórios”, acredita. Segundo a economista, os comentários do Copom foram enfáticos ao demonstrar uma política monetária contracionista, mas faltaram informações sobre o arrefecimento da atividade econômica no terceiro trimestre e uma possível alteração da política monetária norte-americana.
De acordo com André Perfeito, economista-chefe da Necton, o tom do comunicado foi duro. "A combinação de expectativas menos piores na margem, somado a perspectiva de queda da inflação em 12 meses já no primeiro trimestre de 2022 apontam que o mercado deve jogar ainda mais para baixo a parte longa da curva de juros. Mantemos nossa projeção de Selic em 11,5% ao final do ciclo em maio do ano que vem. Vale notar que apesar do Copom ter indicado uma alta de 150 pontos acreditamos que as condições econômicas no entorno da reunião irão forçar uma alta menor, seja por conta do IPCA mais comportado, do câmbio mais estável ou pela atividade ainda fraca", completa.
Étore Sanchez, economista-chefe da Ativa Investimentos, também esperava um aumento dessa magnitude. "O comunicado, na minha avaliação, é hawksh, como não poderia deixar de ser frente as expectativas de inflação condicionais da autoridade. Em linha com o projetado na Ativa Investimentos, as expectativas subiram para 4,7% e 3,2%, para 2022 e 2023. Seguimos avaliando que a Selic será elevada em 150bps novamente nas duas reuniões iniciais de 2022, interrompendo o ciclo em 12,25%", destaca.
Efeitos na economia
A elevação dos juros novamente vem em um momento de expectativa de descumprimento da meta de inflação nesse ano e provavelmente no próximo, pois o indicador medido pelo IPCA passou a marca de 10%. Considerando a diminuição no poder de compra e problemas na organização da economia, o objetivo do Copom é tentar diminuir a inflação – dessa vez de forma mais brusca.
No entanto, o aumento da Selic é uma medida contracionista e prejudica a atividade econômica, que não vem apresentando bons resultados. No terceiro trimestre, o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro caiu 0,1% ante o trimestre anterior e o país entrou em recessão técnica. Os dados foram divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Confira o comunicado do Copom na íntegra:
Em sua 243ª reunião, o Comitê de Política Monetária (Copom) decidiu, por unanimidade, elevar a taxa Selic para 9,25% a.a.
A atualização do cenário básico do Copom pode ser descrita com as seguintes observações:
- No cenário externo, o ambiente se tornou menos favorável. Alguns bancos centrais das principais economias expressaram claramente a necessidade de cautela frente à maior persistência da inflação, tornando as condições financeiras mais desafiadoras para economias emergentes. Além disso, a possibilidade de nova onda da Covid-19 durante o inverno e o aparecimento da variante Ômicron adicionam incerteza quanto ao ritmo de recuperação nas economias centrais;
- Em relação à atividade econômica brasileira, indicadores divulgados desde a última reunião mostram novamente uma evolução moderadamente abaixo da esperada;
- A inflação ao consumidor continua elevada. A alta dos preços foi acima da esperada, tanto nos componentes mais voláteis como também nos itens associados à inflação subjacente;
- As diversas medidas de inflação subjacente apresentam-se acima do intervalo compatível com o cumprimento da meta para a inflação;
- As expectativas de inflação para 2021, 2022 e 2023 apuradas pela pesquisa Focus encontram-se em torno de 10,2%, 5,0% e 3,5%, respectivamente; e
- No cenário básico, com trajetória para a taxa de juros extraída da pesquisa Focus e taxa de câmbio partindo de USD/BRL 5,65*, e evoluindo segundo a paridade do poder de compra (PPC), as projeções de inflação do Copom situam-se em torno de 10,2% para 2021, 4,7% para 2022 e 3,2% para 2023. Esse cenário supõe trajetória de juros que se eleva para 9,25% a.a. neste ano e para 11,75% a.a. durante 2022, terminando o ano em 11,25%, e reduz-se para 8,00% a.a. em 2023. Nesse cenário, as projeções para a inflação de preços administrados são de 16,7% para 2021, 3,8% para 2022 e 5,2% para 2023. Adotam-se bandeira tarifária "escassez hídrica" em dezembro de 2021 e a hipótese de bandeira tarifária "vermelha patamar 2" em dezembro de 2022 e dezembro de 2023.
O Comitê ressalta que, em seu cenário básico para a inflação, permanecem fatores de risco em ambas as direções.
Por um lado, uma possível reversão, ainda que parcial, do aumento nos preços das commodities internacionais em moeda local produziria trajetória de inflação abaixo do cenário básico.
Por outro lado, novos prolongamentos das políticas fiscais de resposta à pandemia que pressionem a demanda agregada e piorem a trajetória fiscal podem elevar os prêmios de risco do país.
Apesar do desempenho mais positivo das contas públicas, o Comitê avalia que questionamentos em relação ao arcabouço fiscal elevam o risco de desancoragem das expectativas de inflação, mantendo a assimetria altista no balanço de riscos. Isso implica maior probabilidade de trajetórias para inflação acima do projetado de acordo com o cenário básico.
Considerando o cenário básico, o balanço de riscos e o amplo conjunto de informações disponíveis, o Copom decidiu, por unanimidade, elevar a taxa básica de juros em 1,50 ponto percentual, para 9,25% a.a. O Comitê entende que essa decisão reflete seu cenário básico e um balanço de riscos de variância maior do que a usual para a inflação prospectiva e é compatível com a convergência da inflação para as metas ao longo do horizonte relevante, que inclui os anos-calendário de 2022 e 2023. Sem prejuízo de seu objetivo fundamental de assegurar a estabilidade de preços, essa decisão também implica suavização das flutuações do nível de atividade econômica e fomento do pleno emprego.
O Copom considera que, diante do aumento de suas projeções e do risco de desancoragem das expectativas para prazos mais longos, é apropriado que o ciclo de aperto monetário avance significativamente em território contracionista. O Comitê irá perseverar em sua estratégia até que se consolide não apenas o processo de desinflação como também a ancoragem das expectativas em torno de suas metas.
Para a próxima reunião, o Comitê antevê outro ajuste da mesma magnitude. O Copom enfatiza que os passos futuros da política monetária poderão ser ajustados para assegurar a convergência da inflação para suas metas, e dependerão da evolução da atividade econômica, do balanço de riscos e das projeções e expectativas de inflação para o horizonte relevante da política monetária.
Votaram por essa decisão os seguintes membros do Comitê: Roberto Oliveira Campos Neto (presidente), Bruno Serra Fernandes, Carolina de Assis Barros, Fabio Kanczuk, Fernanda Magalhães Rumenos Guardado, João Manoel Pinho de Mello, Maurício Costa de Moura, Otávio Ribeiro Damaso e Paulo Sérgio Neves de Souza.
*Valor obtido pelo procedimento usual de arredondar a cotação média da taxa de câmbio USD/BRL observada nos cinco dias úteis encerrados no último dia da semana anterior à da reunião do Copom.