Este artigo foi escrito exclusivamente para o Investing.com. Publicado originalmente em inglês em 11/09/2020
Estamos esperando a inflação dar as caras desde a grande crise financeira iniciada em 2008. Naquele momento, toda a impressão de dinheiro feita pelo Fed foi destinada a impulsionar as taxas de inflação e causar uma disparada nos rendimentos dos títulos do tesouro americano. Mais de uma década depois, podemos dizer com certeza que isso jamais aconteceu.
A narrativa hoje é essencialmente a mesma de então: a impressão monetária do banco central americano e os gastos deficitários do congresso vão provocar uma enorme alta da inflação no futuro.
Os defensores dessa visão imediatamente apontarão para a disparada dos preços do ouro e da madeira serrada como prova de como o mercado está precificando as expectativas de inflação galopante.
O ouro também subiu forte em 2010 e 2011. O resultado não acabou sendo nada bom para o metal, e agora a situação não deve ser muito diferente.
Fed não está preocupado com a inflação
O mais impressionante é que o Fed está inclusive dizendo aos investidores que a inflação não é o seu maior temor. O banco central americano está mais preocupado com o predomínio das forças deflacionárias na economia, que estão fazendo os preços cair.
Sua preocupação com a deflação é tão grande que está mudando sua estratégia de meta simétrica de inflação para uma média de 2%, permitindo que os preços fiquem mais altos por algum tempo.
Até mesmo a velocidade do dinheiro com maturidade zero nos diz que não precisamos ficar com medo da inflação. A fórmula simples mostra que é preciso haver um crescimento da produção para que haja uma aceleração do ritmo de circulação de dinheiro. Assim, para que haja uma alta generalizada dos preços, o PIB nominal precisar ser maior do que a oferta monetária e depois crescer a um ritmo ainda mais rápido.
Atualmente, a dimensão da oferta monetária cresceu tanto a ponto de superar o PIB nominal total, fazendo a velocidade do dinheiro com maturidade zero ir abaixo de 1, seu nível mais baixo desde meados de 1960.
Rendimentos dos títulos públicos não se movimentam
Além disso, os rendimentos dos títulos de 10 anos do tesouro americano, os chamados treasuries, insistem em permanecer baixos, em torno de 70 pontos-base. Eles não reconhecem neste momento a menor possibilidade de a inflação voltar a subir na economia.
O mercado de títulos chega inclusive a dizer ao mercado acionário que o crescimento não irá voltar de forma robusta no futuro próximo. Indo um passo além, a taxa de inflação de equilíbrio a 10 anos subiu em relação às mínimas, retornando para 1,7%, ponto onde se encontrava antes de o Fed começar a elevar seu balanço em torno de US$ 3 trilhões. Da mesma forma, as projeções de inflação para 5 anos são de 1,8%, também em linha com os níveis pré-coronavírus.
Preços altos não se sustentarão
Sim, muitos preços de commodities dispararam, mas, em alguns casos, esses ganhos significativos estão mais relacionados com a oferta do que com a demanda. Os preços da madeira serrada, por exemplo, dispararam, mas o mercado está dizendo que essas elevações não vão durar se observarmos a estrutura a termo dos contratos futuros. Os contratos com vencimento em setembro estão sendo negociados a US$ 870,80, enquanto o preço de um contrato para novembro está caindo para cerca de US$ 611; o de janeiro, para US$ 562; e o de maio, para US$ 454.
Mais impressão de dinheiro
Não importa se o Fed decidir imprimir ainda mais dinheiro para continuar expandindo seu balanço. A maior parte do dinheiro no foco dos investidores segue inerte.
Atualmente, a conta geral do tesouro americano no Fed detém cerca de US$ 1,6 trilhão, enquanto o excedente de reservas de instituições depositárias no banco central é de em torno de US$ 2,7 trilhões, sem falar nos US$ 2 trilhões como moeda em circulação. No total, essas três contas somam quase US$ 6,3 trilhões do balanço de aproximadamente US$ 7 trilhões do Fed.
Tudo indica que, com o impacto do coronavírus no PIB, o crescimento da produção não irá crescer na velocidade suficiente para superar todo o dinheiro que o Fed está imprimindo. Ou seja, muito provavelmente não veremos a volta da inflação no futuro próximo.
Será necessária uma disparada do PIB para fazer com que o ritmo de dinheiro mudando de mãos aumente novamente e faça as taxas de inflação subir.
A falta de crescimento do PIB foi a razão pela qual a inflação praticamente não se mexeu na última vez em que o Fed promoveu a flexibilização. A mesma história deve se repetir desta vez também.