Este heterogêneo 2023 começou com poucas esperanças e uma única certeza doméstica: tudo o mais constante, pelo menos teríamos a virada no ciclo monetário, abrindo caminho para a queda da Selic.
Parece pouco, mas não é.
Às vezes, o mercado só precisa de um bom motivo para subir, especialmente a partir de múltiplos deprimidos.
Muitos investidores ficariam surpresos com quanto dinheiro pode ser movimentado, em questão de dias, com apenas um motivo claro.
E muitos se impressionariam também com o que aconteceria se esse motivo singular fosse retirado abruptamente da pauta.
Não pretendo ser radical aqui, não faz o meu tipo. A tese de queda da Selic não foi retirada da pauta.
No entanto, precisamos parar por um momento e reconhecer novos parâmetros de rapidez e intensidade, mais parcimoniosos que os anteriores.
Por exemplo: o debate sobre corte de 50 bps vs 75 bps, perfeitamente legítimo até poucas semanas atrás, agora dá lugar a uma disputa bem mais tacanha, entre os 25 bps e os 50 bps.
Com a abertura furiosa dos Treasuries, limitam-se os graus de liberdade para a política monetária local.
Isso não sou eu que estou dizendo, nem o modelo do Copom. Há outros mensageiros mais assertivos, como o câmbio.
O dólar foi de R$ 4,72 em 30 de julho para os R$ 5,14 atuais. Alta de quase +10% em dois meses; e isso com a balança comercial brasileira batendo recordes de saldo.
Se os yields de 10 anos dos EUA continuarem perambulando em uma banda de 4,50% a 5,00%, o "ciclo de afrouxamento" terá vida curta por aqui.
É claro que uma Selic de 10% sempre será melhor que uma Selic de 14%, mas a mudança de 14% para 10% está longe de ser transformacional.
Parece muito mais um desaperto do que um afrouxo.
Ainda seguiremos vivendo em um Brasil de juros reais da ordem de 6%, asfixiante para uma série de famílias e empresas que contavam com um alívio logo ali na esquina.
Sem drama, porém.
Essa não é a única realidade possível, e talvez seja uma realidade que carrega no útero as sementes da própria resolução.