Com Adriana Queiroz*
A temática do planejamento para a aposentadoria vem se tornando um aspecto discutido de forma cada vez mais ampla, dadas as características do mercado brasileiro. A maior dificuldade enfrentada na fase de planejamento é o fato de os indivíduos economizarem menos do que o necessário. Segundo a 7ª edição do Raio X do Investidor Brasileiro da ANBIMA, apenas duas pessoas, de cada dez não aposentadas, começaram a formar reservas financeiras para a aposentadoria. Além disso, metade dos entrevistados não aposentados consideram que a previdência pública será a maior parte de sua renda durante a aposentadoria, resultado seis pontos percentuais maior do que o verificado na edição anterior da pesquisa. Diante deste cenário, os benefícios, e os próprios sistemas de aposentadorias, podem se tornar insuficientes ou insustentáveis, demandando mudanças como o adiamento do momento da aposentadoria.
As pesquisas sobre o porquê de os indivíduos não planejarem e não economizarem o suficiente para a aposentadoria, de certa forma, associam o comportamento de planejamento da aposentadoria com a alfabetização ou a educação financeira.
Nesse cenário, e considerando o nosso mercado financeiro desafiador e competitivo, a solução natural é buscarmos o apoio de profissionais especializados em investimentos, um grupo de pessoas com larga experiência, formação específica e acesso a ativos e estratégias que muitas vezes não estão disponíveis para a maioria da população. Com isso, é de se esperar que, nesse meio, encontremos pessoas menos sujeitas a vieses de tomada de decisão e bem mais preparadas sob o aspecto de planejamento de sua própria aposentadoria.
No entanto, os profissionais do mercado financeiro também estão sujeitos à vieses de tomada de decisão e nem sempre demonstram maior preocupação em relação à própria aposentadoria. É o que aponta o estudo elaborado pelos pesquisadores Adriana Queiroz e Claudio Barbedo, ambos do Mestrado do IBMEC RJ, a partir das respostas de 108 profissionais de mercado.
Podemos apontar que esses resultados têm origem em fatores econômicos, mas, essencialmente, também são influenciados pelos vieses identificados por Kahneman e Tversky em 1979, e que rendeu à Kahneman o prêmio Nobel em 2002. Segundo os pesquisadores, o tempo de experiência desempenha um papel significativo na influência de vieses de tomada de decisões e na preocupação com a aposentadoria. O estudo sugere que indivíduos com menos experiência profissional estão menos preocupados com a aposentadoria e mais sujeitos a vieses. Ao avaliar se existe diferença nas escolhas dos homens e das mulheres, os pesquisadores concluíram que as mulheres demonstram maior apreço pelas recompensas imediatas, em detrimento de possíveis ganhos em função do maior espaço temporal.
O estudo com os profissionais do mercado financeiro conduzido no IBMEC RJ oferece dados valiosos sobre a conscientização a respeito da influência dos vieses do efeito certeza, reflexão e desconto hiperbólico nos indivíduos, mesmo que estes façam parte do seleto grupo de profissionais de investimentos do mercado financeiro.
Os vieses da certeza e reflexão, identificados no grupo estudado, sinalizam a preferência por resultados certos e por uma aversão a perdas, mesmo que a opção alternativa represente chances de maior ganho, o que poderia levar o tomador de decisão a evitar alocações com alguma probabilidade de perda. O viés do desconto hiperbólico, representando a tendência de dar mais valor a recompensas imediatas em detrimento de recompensas futuras, pode ajudar o investidor a entender o motivo pelo qual está priorizando investimentos de curto prazo.
A compreensão de como estes vieses podem distorcer a percepção de risco e retorno é o ponto de partida para uma mudança de comportamento acerca da formação de poupança para a aposentadoria. Algumas práticas de correção de comportamento envolvem o desenvolvimento de estratégias considerando a análise de cenários e criando alternativas para avaliar a consequência de diferentes decisões de investimentos. A simulação de resultados de carteiras de investimentos em cenários de alta e de baixa performance também pode ajudar a reduzir a influência dos vieses.
Um aspecto que merece atenção na pesquisa é que 25% dos respondentes, apesar do alto nível de rendimentos e de conhecimento financeiro, não tentaram ou não conseguiram calcular o quanto precisam economizar para a aposentadoria. Isso significa que, mesmo entre profissionais com mais recursos financeiros e educacionais, esta tarefa pode ser difícil e assustadora, possivelmente por envolver muitas incertezas e variáveis.
*Economista, CFP® e Mestre em Administração de Empresas pelo Ibmec Rio de Janeiro. Planejadora Financeira e trabalha na área de Private Banking.