O ano era 2014 na simpática cidade de Brattleboro, no estado de Vermont, Estados Unidos. Vermont é um estado localizado no nordeste do país e é um dos menos populosos. Faz divisa com o Canadá e é muito conhecido por ser produtor de xarope de maple, aquele acompanhamento famoso nas panquecas dos filmes americanos. Não, aquilo não é mel, é um xarope da seiva de uma árvore, de sabor doce, marcante e símbolo da região.
A cidade de Brattleboro conta com uma população de cerca de dez mil habitantes, que tem por atividade as fazendas, o comércio e as pequenas indústrias. Aquele tipo de cidadezinha, das comunidades coloniais, que ainda mantém costumes de famílias que estão lá há alguns séculos.
Por essa razão, o falecimento de um de seus moradores poderia passar despercebido, já que é uma cidade com muitos aposentados. O Sr. Ronald James Read, morador local, faleceu lá aos 92 anos, em 2014. Filho de uma família de pequenos fazendeiros, era um veterano da Segunda Guerra Mundial, como muitos outros da região.
Quando voltou da guerra, tornou-se frentista de posto de gasolina e mecânico durante 25 anos. Depois, ocupou o cargo de porteiro de uma loja da JC Penney, rede de comércio de roupas, por 17 anos. O típico cidadão de hábitos simples, que fazia parte do segmento de baixa renda na sociedade americana, mas que por viver na pequena cidade, conseguia levar uma vida com dignidade. Sem espaço para extravagâncias.
O Sr. Read havia se casado com uma moça que já tinha dois filhos. Nada na vida dele dava pistas de ser alguém que poderia ter sobras de recursos financeiros. Ele tinha o hábito de ler os jornais na biblioteca local, portanto, de graça. Ia sempre na mesma lanchonete para fazer as refeições, sentando-se no mesmo assento preferido.
Conta-se que, certa vez, um cliente se ofereceu para pagar sua refeição porque, olhando para ele, achou que não teria como pagar. Seu carro era um Toyota com sete anos de uso, e que ainda estacionava em lugares sem parquímetro para economizar alguns centavos, pagar estacionamento era considerado desnecessário por ele.
O que parecia para todos uma vida com recursos limitados, na verdade não era nada disso, o que chocou a comunidade após sua morte - pela generosidade e quantidade de dinheiro que ele tinha.
Ao morrer, o Sr. Read deixou em seu testamento o valor de US$ 1,2 milhão para a biblioteca local, aquela onde ele lia os jornais, e mais US$ 4,8 milhões para o Brattleboro Memorial Hospital. Sua fortuna chegou a incrível soma de US$ 8 milhões de dólares. Atualizado pela inflação americana, cerca de US$ 10 milhões hoje, ou algo em torno de R$ 50 milhões de reais. Muito rico!
Essa fortuna derivou basicamente do investimento em ações de empresas tradicionais, que ele conhecia muito bem e cujos dividendos eram sempre reinvestidos. O Sr. Read mantinha distância de ações de empresas em segmentos que não conhecia. O total da sua carteira era de 95 empresas em setores como saúde, telecomunicações, serviços públicos (saneamento básico e eletricidade), bancos e bens de consumo.
Ele lia diariamente o Wall Street Journal – o jornal mais famoso para as finanças nos EUA - e fazia suas próprias pesquisas nas empresas usando a biblioteca para acessar os jornais e as revistas sobre finanças. Frugalidade, investir sempre em segmentos que você conhece e por longo tempo. Se você quiser resumir a filosofia do Sr. Read, siga por aí.
Essas lições se aplicam a todos e podemos nos inspirar e melhorar nossos resultados com atitudes como essas. Eu sei que muita gente vai fazer cara de pouco caso para a parte da frugalidade e forma de economizar que o Sr. Read tinha, e sendo contrários a essas atitudes, porque mostram um vida muito “sacrificada e escassa” e que devemos aproveitar a vida.
Verdade, exagerar nas economias pode tornar a vida até desconfortável. Porém, analisando com mais cuidado, talvez você conheça pessoas que não se importam em ter produtos de marca, fazer gastos excessivos, morar em casas grandes e luxuosas etc. Existem pessoas que realmente não dão nenhuma importância a isso e são felizes com suas roupas simples, suas viagens a lugares pouco badalados e sem a necessidade de ter o último smartphone do momento, e por aí vai.
Agora uma coisa que podemos seguir é o hábito de aumentar a nossa generosidade, aumentando as doações que podemos fazer. Sociedades devem buscar dividir a riqueza, suportando os segmentos da população que não conseguem ter acesso aos benefícios que uma comunidade mais justa deveria entregar.
Alguns números impactantes sobre doações pelo mundo
Segundo o último levantamento do World Giving Index em 2023, o Brasil ocupou a modesta 89ª posição em doações para filantropia. Essa posição reflete não apenas o baixo nível de renda média da população, mas também a escassez de incentivos governamentais. Por exemplo, o Brasil aplica o ITCMD (Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação), que pode reter até 5% do valor das doações, o que acaba por desencorajar as pessoas a darem contribuições mais significativas.
Enquanto isso, nos Estados Unidos, a cultura de doação é profundamente enraizada. Em 2022, os americanos doaram quase meio trilhão de dólares para instituições de caridade pelo terceiro ano consecutivo, evidenciando assim uma tradição de generosidade, que é fundamental para a vida em sociedade. Não é à toa que o país ficou em 5º lugar no mesmo ranking, com 61% da sua população adulta tendo doado algum dinheiro para a filantropia no ano passado.
Não é necessário ter muitas posses para começar a fazer filantropia. Por exemplo, entre os 5 primeiros colocados no ranking do World Giving Index de 2023, estão Indonésia, Kênia e Libéria, países que ainda não possuem uma alta renda per capita.
No Brasil, há uma tendência de concentrar as doações em momentos de tragédias naturais, como inundações e deslizamentos. No entanto, é importante lembrar que a filantropia pode e deve ser praticada em outros momentos e ocasiões. Apoiar organizações e projetos em áreas como educação, saúde, meio ambiente e desenvolvimento social pode ter um impacto significativo e duradouro na sociedade.
Faça como o Sr. Ronald Read, ele foi um gênio das finanças, apesar de na realidade tratar-se de mais um cara comum que está andando por aí e pode ser seu vizinho, seu colega ou um funcionário normal da loja que você frequenta.
Porém, mais do que tudo, pense mais na generosidade e na possibilidade de ser um doador frequente para boas causas...