Faz algum tempo que venho querendo contar esta história para mais gente: a história de sucesso (?) do Zé. Esta é uma história atemporal. A primeira vez que a contei foi durante um jantar para uma amiga - que guardo em doce memória - que havia me perguntado como funcionava “essa coisa das corporações”. Por conta do tamanho deste espaço, irei dividi-la em partes. Espero que gostem.
Meu objetivo em contá-la aqui é provocar a discussão sobre o que nossas práticas administrativas realmente representam em termos de aumento de eficiência e produtividade. Convido você a se testar (e a testar seus conhecimentos de finanças), identificando os impactos que cada uma das ações do personagem principal tem sobre o valor da companhia em que trabalha.
Em tempo: Esta é uma obra de ficção. Qualquer semelhança de nomes, eventos, práticas administrativas ou situações da vida real terá sido mera coincidência.
Meu amigo Zé sempre foi um grande sujeito. Desde os tempos de escola, sua sagacidade e capacidade de trabalho eram notadas por todos que tiveram a oportunidade de com ele conviver. Sua vocação sempre foi a de resolver problemas. Durante os tempos de faculdade, todos os professores admiravam sua velocidade de raciocínio e sua capacidade em se comunicar. Para ele não existia “saia justa”; sempre tinha uma resposta para qualquer questão que lhe fosse colocada e, ainda que seus argumentos não estivessem absolutamente corretos, seu magnetismo pessoal se incumbia de convencer a maioria das pessoas da correição de suas opiniões.
Terminada a faculdade, diferentemente da maioria de nós que saímos em campo no mercado de trabalho, o Zé resolveu se especializar. Foi cursar uma escola de negócios de renome e lá, mais uma vez, sua estrela brilhou. Mesmo aqueles que, num primeiro momento, viam certa arrogância em sua forma de se expressar, simpatizavam com ele ao perceber sua disponibilidade em ajudar todos de forma abnegada. Fez muitos amigos e ótimos contatos e acabou, ao terminar o curso, por ser contratado para gerenciar uma unidade de negócios de um grupo empresarial familiar.
Sua unidade de negócios era uma dentre muitas na diretoria industrial. Atuando em um mercado competitivo, seus resultados financeiros oscilavam com as marés da economia. O patriarca da família controladora, antevendo uma eventual crise de sucessão quando do seu afastamento, acabara de contratar uma consultoria para lançar as bases da “profissionalização da administração”. Uma das primeiras medidas da consultoria foi revisar a remuneração dos executivos, aumentando a pressão por resultados e premiando aqueles que levassem ao acionista aquilo que ele desejava: retorno sobre os seus ativos.
A ótima formação obtida pelo Zé na escola de negócios tornou fácil para ele entender o que era esperado de sua gestão. A linguagem dos consultores também havia sido aprendida por ele na pós-graduação. Para obter um maior retorno sobre os ativos só havia um caminho: “fazer mais, com menos”. Este slogan passou a ser repetido por ele em todas as reuniões com seus subordinados. A ordem era procurar em todos os processos daquela unidade onde estavam as “oportunidades de melhoria”. Zé sabia que isto só poderia ser bem feito por quem tivesse a capacidade de “enxergar de fora” as rotinas da sua unidade, alguém que não estivesse “ancorado” ao modelo vigente. Resolveu convidar um velho colega de faculdade: João. Ao fazer o convite Zé disse: “O trabalho não será fácil. Precisamos refazer toda a engenharia dos processos, como se os estivéssemos criando de novo”. João, que estava desempregado, aceitou o convite. Um pequeno grupo de técnicos foi destacado para auxiliá-lo e os trabalhos foram realizados envoltos em sigilo para não interferir no dia-a-dia das operações da unidade de negócios.
Logo os primeiros resultados mostraram que a idéia do Zé estava correta. Pequenas mudanças nos processos agregavam significativas economias. Cada processo que era “re-engenheirado” (neologismo criado dentro do grupo coordenado por João) apontava para a conveniência de fazer o mesmo naqueles processos que com ele se interligavam. Como Zé previra, o trabalho era hercúleo, mas a motivação da equipe era grande e ninguém mais se importava em seguir o exemplo do Zé e trabalhar, em média, 16 horas por dia, inclusive aos sábados. Aliás, era nos fins-de-semana e feriados que o trabalho mais rendia.
Continuará....
*Professor do Coppead e do Instituto de Economia da UFRJ