Sabemos que o ano está desafiador para os investimentos e requer muito estudo e análise para saber o que fazer e o que não fazer neste momento, principalmente com a renda fixa rendendo cada vez menos e mais CPF´s se cadastrando na bolsa, à procura do “eldorado”. Nesta jornada, papéis que caíram fortemente ao longo dessa crise do coronavírus, começam a fazer muito olhos brilharem, na busca por barganhas. E uma dúvida recorrente entre os investidores é: as ações de uma companhia podem cair sem limite, até zerar? Sem rodeios, sim!
E poderia parar aqui, mas a ideia é jogar luz neste buraco que parece não ter fundo e auxiliar você a não entrar nesta máxima de “ é grande demais para quebrar” e sair comprando qualquer empresa na bolsa de valores por “achar” que caiu muito, ou porque alguém falou que agora está barato.
Voltando ao zero, sem trocadilho, não tem uma regra para afirmar que não pode chegar a zero e isso demonstra o nível de risco do mercado de ações. Mas, é claro, existem algumas normas que a B3 colocou para evitar esse colapso e, consequentemente, a quebra de confiança entre empresas, B3 e investidores. Uma delas foi estipular que o papel não pode passar mais de 30 pregões seguidos abaixo de R$1,00, onde a companhia é acionada para fazer um grupamento de 1 ação nova para cada 10 antigas, aumentando seu valor, sem alterar nada para o acionista (a não ser a questão de ficar com menos ações, com valor maior, gerando potencial de cair mais ou, quem sabe, ganhar novo fôlego). . Ainda existem outros detalhes, mas o básico é esse. Caso a empresa não cumpra com a chamada, ela pode ser suspensa e até, persistindo o problema, ser excluída da bolsa brasileira. Até agora, nenhuma companhia chegou neste nível.
O que normalmente as empresas detentoras dessas ações que chegam a esta faixa de preço fazem é entrarem com pedido de recuperação judicial, para ganhar tempo de se reestruturarem. Podem ter as negociações suspensas por um período, mas depois voltam, dando um grande susto em seus investidores, que não se atentaram aos riscos envolvidos em aplicar neste tipo de ações, mais próximas do zero que do céu, conhecidas no mercado como “penny stocks”, traduzindo, ações de centavos.
Mas acontece que em abril houve a suspensão da regra que praticamente obriga as empresas, que chegam abaixo de R$1,00, a minimamente se agruparem, o que gerou o “benefício” de ações claudicantes neste cenário bastante adverso, ficarem rondando os centavos sem serem incomodadas. Mas a promessa é que, tão logo o país e o mundo saiam vencedores da luta contra o coronavírus, as regras e cobranças sejam retomadas.
Outra alternativa, não utilizada pelas empresas que chegam nessa situação é o fechamento de capital, saindo da bolsa antes do colapso, comprando todas as ações em circulação, por intermédio de oferta pública de aquisição (OPA). Praticamente não é usada, pelo simples motivo de falta de dinheiro, se tivesse o capital para recomprar todas as ações, ela poderia usar o dinheiro para se reerguer.
Uma empresa pode zerar a sua cotação e continuar a vida normalmente? Dificilmente ela conseguirá se reerguer caso chegue a zero de valor de mercado, pois a crise de confiança será imensa, teremos liquidações de dívidas por parte dos credores, seu patrimônio servirá somente para quitações, se conseguir quitar tudo.
Voltando a falar diretamente do barato que pode sair caro. Tomemos como exemplo as empresas aéreas/turismo, que estão entre as maiores quedas do ano até agora, com uma média de 70% de queda. Essas companhias estão atraindo olhares atentos e ávidos para encontrar o ponto ideal da compra, para lucrar fortemente e construir a tão sonhada liberdade financeira. Esse é um cenário que exige ainda mais cuidado e análises sobre onde está investindo seu capital. É como costumo dizer, cuidado e canja de galinha não fazem mal a ninguém.
Recentemente tivemos a Avianca (segunda maior cia aérea da América Latina) entrando com pedido de recuperação judicial na Colômbia. Alguns dirão “a KLM teve ajuda bilionária do governo francês este ano também, vai acontecer o mesmo aqui no Brasil, não vão deixar quebrar”. Será? A gigante VARIG (era a maior da América Latina) faliu em 2005, aqui no Brasil. Claro que são muitos pontos a serem discutidos sobre o porquê e quem foi o culpado, mas quebrou.
E você, aceita esse risco? Têm o perfil de investidor e sua mente preparados o bastante para suportar a alta volatilidade que sofrerá com essas empresas em sua carteira de investimentos? Separar um valor do que investe em ações para esse risco pode ser um caminho (se perder não sofrerá uma quebra do seu patrimônio). Costuma ser uma opção para quem já passou por muitos desafios ao longo da vida de investimentos em renda variável. Já no caso de investidores iniciantes, que acabaram de tirar seu recurso da renda fixa e estão rastreando papéis que caíram muito no mercado de ações, fique alerta, como Warren Buffett fez. Neste mesmo mês de maio, ele vendeu suas participações em todas as companhias aéreas que tinha em carteira e assumiu que cometeu um erro, ao não realizar lucros quando poderia (grande lição) e que não vai ficar com empresas que vão demandar muito capital e sem saber que destino terão, já que o cenário para o setor mudou drasticamente. CVC (SA:CVCB3), Azul (SA:AZUL4) e Gol (SA:GOLL4) podem sair dessa? Sim, para tanto, demandarão esforço, resiliência e um tempo que ainda não se sabe ao certo e se isso tudo dará certo. No mínimo, reflita sobre o assunto e não tenha medo de ejetar seu assento ao sinal de fogo na aeronave.
Marcio Loréga, analista da Ativa Investimentos