Novamente, o mercado de bitcoin e, principalmente, altcoins, oscilou fortemente nos últimos dias. A volatilidade dos criptoativos se tornou mais uma vez destaque, eclipsando qualquer tipo de racionalização a respeito de causas fundamentais para esses movimentos. Entretanto, não é pela ausência de causas claras que a volatilidade não é algo previsível ou explicável. Nesse texto vou discutir três causas estruturais para esses swings fortes no mercado e como se antecipar a eles.
Ausência de valor fundamental – Já foi mapeado em algumas pesquisas acadêmicas que o valor do Bitcoin não é tão relacionado com causas técnicas quanto a condições de mercado. Apesar de alguns estudos sugerirem ligação da capitalização do Bitcoin ao seu número de usuários como meio de pagamento ao preço – a chamada lei de Metcalfe – estudos mais robustos econometricamente rejeitam essa hipótese. Outros estudos são ainda mais agressivos: o artigo de Cheah e Fry, de 2015, sugere que o Bitcoin não possui nenhum valor fundamental. O artigo de Li e Wang (2017) sugere que fatores de uso da tecnologia são cada vez mais menos observados por investidores.
Como isso impacta o mercado? – Não há algum preço de longo prazo para o qual os criptoativos convergem. No caso do Bitcoin, sua grande função é percebida como uma reserva de valor. Isso não é tão problemático, há diversos estudos que associam o mesmo para o ouro. Entretanto, isso limita a consolidação do mercado em preços estáveis no curto prazo.
Ineficiência de Mercado – Uma das principais teorias de finanças é a de mercados eficientes. Dentre as formas de ineficiência descritas nessa literatura, não ser capaz de prever preços futuros usando preços passados é a mais fraca. Mesmo essa forma não se verifica inequivocamente no Bitcoin e demais criptoativos, como pode ser visto aqui e aqui. Apesar de haver algumas evidências de eficiência a depender do teste, o que parece ser consenso é que há espaço no mercado para técnicas que usam preços passados para prever o futuro (de análise técnica a trading algorítmico usando informação de candles).
Como isso impacta o mercado? – A previsibilidade forte demais de um ativo pode levar a que investidores sigam as pistas de maneira relativamente uniforme e ampliando impactos. Nesse caso, se um indicador – por exemplo, índice de força relativa – sugerir grande reversão, haverá pressão auto realizada rumo à reversão. Pode-se perceber que ruídos aleatórios podem ser amplificados nesse cenário se houver algum consenso de técnicas que sistematicamente batam o mercado.
Manipulações por Grandes Players – O problema final é a assimetria de informações e possibilidades que grandes traders e organizações (exchanges) possuem. Nessa coluna, já citei a manipulação que culminou na queda do Mt. Gox, descrita aqui, e nas evidências da emissão de Tether ser em períodos específicos para inflar preços dos demais criptoativos. Infelizmente, o mercado não é manipulado apenas nesses grandes e óbvios eventos, mas também em inúmeras outras notícias que vazam antes. O insider trading é, de acordo com pesquisa recente, pervasivo no mercado de criptoativos.
Como isso impacta o mercado? – O insider trading antecipa notícias que depois o mercado descobrirá. A depender do tamanho do insider em comparação ao mercado, há mudanças significantes no preço que serão antecipadas, criando retornos anormais sem causa fundamental aparente. Isso pode ser entendido como maior volatilidade e causar algum pânico sem razão clara, criando um ambiente de desconfiança e menor incentivo para investidores avessos ao risco entrarem no mercado.
O que fazer?
Podemos concluir que há três grandes desafios para a redução do risco no mercado de criptoativos. Para tecnologia ser observada atentamente para os investidores, ela precisa voltar a ser importante para a economia real: killer apps e volume de transações capazes de movimentar o mercado são necessários. Isso depende mais dos desenvolvedores de criptoativos, sendo um problema difícil de prever. A eficiência de mercado é normalmente associada a entrada de mais players que arbitram e proveem liquidez para o mercado, sendo um fenômeno que depende da diminuição do risco regulatório e outros fatores. O insider trading pode ser combatido com regulação também, mas é menos fácil de resolver, posto que ocorre em mercados convencionais. Seu impacto, contudo, pode ser mitigado com a entrada de novos investidores, reduzindo o peso dos insiders. A depender da solução desses problemas, poderemos observar uma redução na volatilidade; por agora, no entanto, creio que não será o caso.