Tônica da Semana: Como a Pandemia Pode Mudar os Mercados para Sempre?

Publicado 27.07.2020, 11:17
CL
-
CHANGES 

Polêmico, eu sei. Bom dia a todos, mais uma semana se inicia e hoje quem escreve sou eu (Breno Bonani). Espero que todos estejam bem! Venho escrevendo menos porque algumas mudanças estão acontecendo e logo mais vocês saberão de tudo. É sempre bom comentar que somos eternamente gratos a todos que acompanham o Bugg e que param um pouco do seu precioso tempo para ler algumas de nossas opiniões.

Sem mais lenga-lenga, vamos ao que interessa. O mundo mudou, meus amigos... e como mudou. Quando eu digo “mundo”, são as economias, nossas interações, nossos hábitos e nosso modo de pensar.

Fonte: Bloomberg

Mas, ficando na área da economia e dos mercados financeiros, esse é um daqueles momentos em que lutar contra a maré de estímulos tem se provado um fracasso. Eles têm sido o principal impulsionador dos mercados. Tudo bem que houve dados melhores de recuperação e possíveis vacinas estão se materializando, porém, os estímulos têm tido um papel importante nessa recuperação dos mercados globais.

Houve U$ 11 trilhões de ações fiscais e cerca de U$ 6 trilhões em expansão de balanços pelos bancos centrais que compõem o G-10 (Bélgica, Canada, França, Alemanha, Itália, Japão, Reino Unido, Suíça, Suécia, Holanda e Estados Unidos) desde o início da crise da Covid-19. E ainda não acabou: é possível que antes do recesso do Congresso ainda passe outro pacote de estímulos.

Não obstante, vivendo em um mundo em que as taxas básicas de juros tendem a zero ou já estão zeradas/negativas, algumas mudanças podem começar a acontecer em relação ao peso nas carteiras de algumas pessoas. O clássico 60/40 (60% em ações e 40% em renda fixa) pode mudar para 80/20, uma vez que os retornos de ativos fixos ficaram sem brilho nenhum.

O índice de dívida de países desenvolvidos (DM) do JP Morgan teve um aumento de 30% na dívida negativa. No momento, cerca de 70%, ou U$ 32 trilhões, estão em rendimento inferior a 0,5%. Acho que isso não estava no cenário de ninguém, não é?

Além disso, o rendimento do famoso 60/40 nos EUA, que estava em 10% nos últimos 40-50 anos, caiu para 3,5%. Em um mundo com juros negativos, 80/20 é mesmo a melhor solução? É uma pergunta difícil. Eu consegui chegar a uma conclusão. Nosso dinheiro mais do que nunca deve estar em vários ativos.

Como não temos previsibilidade nenhuma e o desfecho do cenário é incerto, é prudente ter seu patrimônio atrelado a vários ativos, em diferentes moedas e diferentes países. Ray Dalio abordou muito bem essa necessidade na última Expert da XP.

Logo, essa reflexão me levou a três grandes mudanças de paradigmas que estamos vivendo:

Ninguém esperava por isso. Antes se falava em possível aumento da taxa de juros dos EUA e de outros países. A inflação era algo que as pessoas tinham certa ideia de que poderia voltar, já que estímulos fortes já vinham acontecendo desde 2008. Todavia, a crise de 2008 realmente mudou os mercados financeiros.

Primeiro que taxas baixas levaram a uma emissão recorde de títulos e aumentaram absurdamente universo negociável dos mercados globais, que foi parar em US$ 60 trilhões vs. US$ 36 trilhões antes da crise de 2008. Os ETFs (Fundos de Índices) saíram de U$ 700 bilhões para U$ 6,1 trilhões hoje.

Mas, ao mesmo tempo, algo inesperado aconteceu. Houve uma queda drástica de liquidez nos mercados. Os bancos, por conta das novas regulamentações, não mantinham mais estoques. Depois houve a moda dos investimentos passivos que, segundo a Barron’s Research, dobraram para 60% do volume negociado de ações desde 2008. Enquanto isso, o volume de ações atrelado ao nome de um usuário representa entre 10% e 15% do mercado atualmente.

Basta olhar o mercado Treasury dos EUA (Tesouro). É o mercado de títulos mais líquido do mundo, com cerca de US$ 19,2 trilhões. Em março, o mercado ficou tão maluco com as quedas fortes e a alta volatilidade, que apenas US$ 12 trilhões podiam ser negociados e o Fed (banco central norte-americano) teve de intervir.

Fonte: J.P. Morgan, BrokerTec

No gráfico, é possível notar o “stress” que foi para os mercados. É complicado que isso aconteça com seu ativo que deveria ser um “refúgio”. O primeiro paradigma é o declínio da liquidez do mercado devido à mudança estrutural que vem acontecendo. A demanda por liquidez dos investidores e empresas não pode ser atendida por máquinas, algoritmos e mágica. Quando a volatilidade for empurrada para níveis mais altos novamente, os bancos centrais provavelmente serão forçados a atuar de novo.

Por isso a brincadeira que o Fed estaria comprando tudo, inclusive cartas de baseball, rs…

Charge

Por conta disso, entramos no segundo paradigma, que é o aumento das políticas monetárias não convencionais pelos bancos centrais. Existem limites?

Inclusive, elas não parecem se reverter tão cedo. Pelo menos é o que parece. O debate abriu portas para a reflexão sobre o mandato dos BCs que gravitam para garantir condições financeiras fáceis e promover a estabilidade financeira a qualquer custo.

Inflação não é vista como uma ameaça imediata (eu disse imediata!). Essa operação de estímulos foi provavelmente a mais agressiva que vimos na história moderna. Os balanços dos Bancos Centrais aumentaram em 20 p.p. do PIB em apenas três meses. Isso foi 3x o tamanho da crise financeira global!

O Fed por exemplo, não deve parar por aí. No gráfico abaixo, um estudo feito pelo Goldman Sachs Investment Research projetando uma expansão do balanço do Fed.

Fonte: Federal Reserve Board, Goldman Sachs

O mandato realmente parece estar motivado a garantir a estabilidade financeira. O tamanho da dívida e dos encargos fiscais são completamente sem precedentes. O Fed ainda apelou e comprou 8% do PIB e 11% da parcela de dívida pública em circulação. A emissão de Títulos dos EUA pode chegar a US$ 5 trilhões neste ano.

O terceiro e último paradigma é a competição entre EUA e China.

É notável a recuperação da China. Para não dizer impressionante. Ela não só está se recuperando bem como tirou o medo do mercado caso ela fosse para o buraco. Isso pressiona o debate e o embate entre as duas principais potências do mundo, Estados Unidos e China (principalmente se ela se recuperar melhor que os EUA).

Existe um, “porém” nessa história toda. Muito se fala sobre a cadeia de suprimentos e sobre as empresas saírem da China em forma de retaliação. Porém, muitas empresas no fundo não querem deixar a China…

Até empresas que são meio “anti-China” querem acesso a esse mercado. E por quê? A China oferece muitas vantagens ainda. É o maior mercado do mundo, nenhum outro país tem a infraestrutura e uma massa tão grande de força de trabalho para produzir e agregar valor.

Eles têm cerca de 1,4 milhão de graduados pela STEM por ano! Para quem não sabe o que é o STEM: O STEM (Science, Technology, Engineering and Math ou Ciências, Tecnologia, Engenharia e Matemática, em português) é um modelo de ensino com foco em estimular o aprendizado dos alunos em várias frentes simultâneas (multidisciplinaridade), de modo muito mais abrangente e sem a segmentação comumente observada nas salas de aula.

Finalmente, o governo acaba ajudando vários setores. A China é o único país que pode produzir todas as 666 subcategorias do setor manufatureiro. E, em algumas áreas como tecnologia e suprimentos médicos, produtos farmacêuticos e EPI, é possível ver uma dissociação, com cadeias de suprimentos se movendo para lá para ganhar escala.

É possível que o tema EUA x China continue até mesmo em um governo Biden. Mas é provável que o assunto comece a caminhar para um “China Plus One”. Que seria uma espécie de não sair da China, mas não ser totalmente dependente dela. Evitar uma guerra (pode ser bélica, política, monetária etc.) seria prudente visto o tamanho do dano que a Covid-19 tem causado.

É um país com muitos desafios ainda. Seus dados demográficos preocupam um pouco… Entre hoje e 2050, a idade média na China tende a aumentar em 11 anos. Enquanto isso, no mesmo período nos EUA tende a aumentar em 4 anos e meio.

Olhando para o crescimento do PIB, este tende a acabar passando o dos Estados Unidos, se ela conseguir manter o ritmo de crescimento. Porém, o PIB Per Capita continua muito aquém dos EUA.

Fonte: Bloomberg

Logo, na minha humilde opinião, a China parece precisar de cooperação. Se você olhar a pesquisa que teve na câmara de Comércio dos EUA, cerca de 84% das companhias dizem que estão na China. Quanto mais a China se recupera, mais ela parece atraente. Será que não podemos então ter outros parceiros comerciais?

Para finalizar essa minha parte da reflexão e voltando a repetir: como tudo está meio incerto ainda e a situação em que estamos vivendo nos mercados é atípica, é prudente diversificar seu patrimônio em ativos de outras moedas e outros países. Internacionalizar seus investimentos nunca foi tão necessário. Afinal, se a China realmente for vencedora, por que não ter investimentos lá? Se o EUA têm o privilégio de imprimir o dólar e ainda têm o posto de maior potência, por que não ter parte lá? E por aí vai, outros mercados também, emergentes ou desenvolvidos.

EUA E BRASIL?

Rapidamente, semana passada houve vários dados sobre EUA e Brasil.

EUA: Do lado dos Estados Unidos, teve Venda de Casas Usadas e Estoques de Petróleo.

Fonte: Investing.com

Vendas de Casas Usadas veio aquém do esperado. Assim como os estoques de petróleo vieram altos ainda. Entretanto, isso não impediu o WTI de continuar subindo e fechar a semana em US$ 41,29.

WTI Futuros

Além disso, teve PMI Industrial e de Serviços que ficou aquém do esperado, mas ainda assim melhor, pois está tendo uma recuperação.

PMI Industrial

PMI Serviços

Para finalizar EUA, teve Venda de Casas Novas que vieram bem. Indicando que uma recuperação parece ser realidade nas terras do Tio Sam.

Fonte: Investing.com

Brasil: Do lado do nosso país tupiniquim, tivemos apenas dois dados interessantes: Confiança do Consumidor da FGV e IPCA-15.

Confiança do Consumidor

A Confiança do Consumidor vem mostrando recuperação e o IPCA-15 teve uma leve alta, mas ainda abaixo do esperado, o que pode ser bom, pois quer dizer que a inflação não está vindo muito forte mesmo depois de alguns estímulos.

Fonte: Investing.com

PARA A SEMANA E PARA ACABAR…

Vale ficar de olho no desenrolar dos atritos entre EUA x China. Na semana passada já tivemos as decisões de fechamento e expulsão de membros do consulado de ambos países. Com isso, vários investidores estão olhando com cautela o desenrolar dessa história que pode respigar no acordo comercial entre eles.

Durante a semana também teremos muita coisa saindo. A começar pelos EUA com Pedidos de bens duráveis, Estoque de Petróleo Bruto Semanal, Balança Comercial de Bens, Nível de Estoques do Varejo, Decisão do Fed na taxa de juros, Pedido de Seguro Desemprego e PIB.

A China vai divulgar Lucros das Empresas, PMI Compostos/Industrial/Não-Manufatura.

Por fim, Brasil divulga o IGP-M na Quinta-Feira.

Acho válido comentar que PIB dos EUA pode voltar com a conversa que nada é tão simples. A perspectiva é de queda de 35%, refletindo o pior momento do impacto da Covid-19. Na UE também deve vir ruim, também por conta dos efeitos do isolamento social.

Fico feliz de poder contribuir de alguma forma. No mais, estou com um pouco de caixa, confesso que, assim como o William, fiquei surpreso com a alta tão rápida e, depois de certo ponto, também comecei a ficar meio receoso. Uma correção seria normal e saudável depois dessa subida toda. Logo, ainda acho bolsa atraente, tenho 70% do meu patrimônio ainda aplicado em renda variável, mas estou mais cauteloso e seletivo. Além disso, estou diversificando em outros mercados, países e moedas, como eu comentei anteriormente. Se isso é o certo? Aí vai de cada um, mas fica minha sugestão (que também é o Ray Dalio rs).

Ótima semana a todos!!

Últimos comentários

Carregando o próximo artigo...
Instale nossos aplicativos
Divulgação de riscos: Negociar instrumentos financeiros e/ou criptomoedas envolve riscos elevados, inclusive o risco de perder parte ou todo o valor do investimento, e pode não ser algo indicado e apropriado a todos os investidores. Os preços das criptomoedas são extremamente voláteis e podem ser afetados por fatores externos, como eventos financeiros, regulatórios ou políticos. Negociar com margem aumenta os riscos financeiros.
Antes de decidir operar e negociar instrumentos financeiros ou criptomoedas, você deve se informar completamente sobre os riscos e custos associados a operações e negociações nos mercados financeiros, considerar cuidadosamente seus objetivos de investimento, nível de experiência e apetite de risco; além disso, recomenda-se procurar orientação e conselhos profissionais quando necessário.
A Fusion Media gostaria de lembrar que os dados contidos nesse site não são necessariamente precisos ou atualizados em tempo real. Os dados e preços disponíveis no site não são necessariamente fornecidos por qualquer mercado ou bolsa de valores, mas sim por market makers e, por isso, os preços podem não ser exatos e podem diferir dos preços reais em qualquer mercado, o que significa que são inapropriados para fins de uso em negociações e operações financeiras. A Fusion Media e quaisquer outros colaboradores/partes fornecedoras de conteúdo não são responsáveis por quaisquer perdas e danos financeiros ou em negociações sofridas como resultado da utilização das informações contidas nesse site.
É proibido utilizar, armazenar, reproduzir, exibir, modificar, transmitir ou distribuir os dados contidos nesse site sem permissão explícita prévia por escrito da Fusion Media e/ou de colaboradores/partes fornecedoras de conteúdo. Todos os direitos de propriedade intelectual são reservados aos colaboradores/partes fornecedoras de conteúdo e/ou bolsas de valores que fornecem os dados contidos nesse site.
A Fusion Media pode ser compensada pelos anunciantes que aparecem no site com base na interação dos usuários do site com os anúncios publicitários ou entidades anunciantes.
A versão em inglês deste acordo é a versão principal, a qual prevalece sempre que houver alguma discrepância entre a versão em inglês e a versão em português.
© 2007-2025 - Fusion Media Limited. Todos os direitos reservados.