Em um texto recente nessa coluna, eu descrevi um ataque malicioso que pode derrubar redes de proof-of-stake. Basicamente, a premissa de que agentes com 51% não fariam ataques à rede é baseada em premissas sobre os agentes maximizam lucros, não procurando qualquer outro tipo de objetivo. Entretanto, pode haver interessados em simplesmente destruir a rede. Esses interessados podem anunciar seu interesse em dominar a rede. Se eles forem grandes o bastante para a ameaça ser crível, espera-se pânico para vender as moedas antes que elas desvalorizem, diminuindo drasticamente o custo do ataque. Esse cenário foi derivado num framework de teoria dos jogos neste artigo.
Todavia, o Proof-of-Work é uma alternativa problemática também. Seu custo ambiental não pode e não deve ser desprezado. Digo isso porque governos estão agindo nessa direção: a China está fechando o cerco a mineradores e, dia 16, regiões do estado de Nova York, nos EUA, que possuíam a energia particularmente barata, decidiram dificultar a atividade de mineração. De fato, energia é um recurso escasso e com externalidades para o meio ambiente. Tratar com leviandade o aspecto ambiental das criptomoedas é possível, porém leva a subestimar riscos governamentais no atual contexto, no qual – felizmente – bandeiras ambientais entram no discurso político.
Dito isso, a beleza de trabalhar com criptomoedas é em parte a velocidade com que as inovações ocorrem. Há a possibilidade de um futuro mais seguro, descentralizado e ecologicamente correto com o Proof-of-Space, algoritmo baseado em armazenamento ao invés de processamento. A distribuição de moedas é dada para pessoas que possuem maior capacidade de armazenamento – os nossos conhecidos (e baratos) HDs – devotada à blockchain. Esse algoritmo de consenso reduz fortemente o consumo de energia elétrica, diminuindo os custos. De acordo com a microeconomia da mineração, isso traz maior descentralização se comparada a moedas de maior custo.
Contudo, como essa aparentemente promissora tecnologia está se saindo na prática? Na verdade, não está sequer se saindo. Sua principal representante, a Burst, amarga a 76ª maior capitalização dentre as moedas, com mercado de apenas US$ 38 milhões. Implementações críveis da tecnologia por enquanto não existem. A Burst possui o problema de sua mineração – por mais que seja barata – não ser lucrativa pelo baixo poder da moeda e pela queda rápida na sua recompensa de mineração, posto que em 2027 será virtualmente zero o retorno de minerar. A Bitcoin Ore, ideia de fork similar ao Bitcoin Gold trocando o algoritmo de mineração, sequer está na lista da CoinMarketCap e as informações na internet são escassas demais. Aparentemente o projeto não foi lançado, sugerindo certa insipiência.
O que podemos concluir de tudo isso? Há barreiras a certas inovações no meio de criptomoedas com base nos humores e consensos da comunidade. Em “A Estrutura das Revoluções Científicas”, o sociólogo da ciência Thomas Kuhn diz que a ciência evolui não somente por um acúmulo de evidências, mas principalmente com quebras de paradigmas. Apesar de criptomoedas não estarem apenas na academia, ela é uma fronteira do conhecimento. O Proof-of-Work foi um começo, porém seus custos levaram a novas ideias. O Proof-of-Stake é o atual paradigma, com inúmeras boas ideias sendo desenvolvidas sobre ele. O Proof-of-Stake se desenvolve com excelentes ideias se desenvolvendo sobre ele, como, por exemplo a Ouroboros do Cardano ou os modelos de delegação do EOS, que discutirei aqui em breve. Esse paradigma precisa de algum choque para ser superado; apesar de haver tecnologias promissoras, essas não se consolidarão sem o paradigma anterior sofrer uma crise.
Creio que posso afirmar sem sombra de dúvidas que o risco que vejo no Proof-of-Stake não é compartilhado pela comunidade. Espero, de verdade, que eu esteja sendo apenas paranoico, afinal como analista e investidor em criptomoedas, não desejo que grandes players quebrem com consequências danosas para o mercado. Entretanto, se o risco político ou similares contagiarem a comunidade, é bom saber que há uma alternativa. Mesmo que nunca se concretize, a existência do Proof-of-Space é um excelente sinal para a comunidade: ela significa maior robustez das criptomoedas a ataques regulatórios e à eventual crise de paradigma. Para saber se um ativo é uma reserva de valor válida, precisamos saber como ele se sairá em crises que surgirão para eles. Haver alternativas a Proof-of-Work e Proof-of-Stake ajuda a cercar os problemas que podem acontecer e afetar as criptomoedas, e isso, evidentemente, é ótimo e deve ser comemorado pela comunidade, por mais que a utilidade agora seja limitada.