Muitos levantam a ação do Banco Central brasileiro (BC) de ter cortado demais e tão rapidamente a taxa básica de juros, a Selic, no período da pandemia. Chegamos ao menor nível histórico, 2% de juros, patamar de países desenvolvidos e imagino que tenha escutado: não somos a Suíça e nosso juro não é 2%.
Era fato que o BC não conseguiria manter a Selic neste patamar, especialmente em um país com pressões inflacionárias que não se fundamentam a partir dos livros-textos de economia que explicam oferta e demanda, mas jogam um balde de água fria em qualquer política monetária.
Somos um país que tem a sua inflação majoritariamente indexada, um processo que visa aumentar o valor dos produtos no futuro diante aumentos no passado, independente se estamos em crise ou não, mas por uma causa nobre, garantir o poder de compra da população. Contudo, no caso de uma crise, ou desaceleração econômica, essa 'jabuticaba' cria uma espiral de dificuldades para o setor privado, que acarreta em queda das vendas, desemprego, recuo na renda e assim por diante.
Mas não é só a indexação e a magia dos preços administrados os vilões da nossa inflação. Praticamente 50% da cesta de inflação é explicada por alimentos e energia, um fato comum em economias emergentes, ou, melhor dizendo, economias em desenvolvimento. Ou seja, subir os juros demasiadamente para conter a demanda de bens essenciais não é o melhor caminho para conter a inflação por aqui.
Sem mais delongas sobre a nossa inflação, a pergunta que muitos devem fazer é: estaria o BC conduzindo bem sua política extremamente contracionista de juros visando trazer a inflação para a meta?
Não.
O atual patamar da Selic, de 13,75% de juro nominal, nos traz um cenário que beira o apocalipse para qualquer empresário e até para o setor público. Estamos falando de um juro real ex ante de 9%, nove por cento, não somente o maior do mundo mas que tira a esperança de qualquer planejamento de investimento, crescimento e geração de renda.
Será que a culpa é da taxa neutra de juros que tem sido pressionada diante das promessas de políticas fiscais expansionistas e já beira os 6%? Depende. Há algo que não tem argumento: ainda estamos falando de um juro real maior que a taxa neutra há meses, nos mantendo no cenário contracionista de política econômica e minando o setor privado.
Um pouco de ironia seria justificar este patamar de juros porque a nossa população precisa poupar mais e nosso índice Ibovespa bate o CDI (o que seria racional, ensinado e aplicado em qualquer outro país capitalista). Não. Somos um país com uma maioria que não tem condições mínimas de gerar poupança e nossa cesta de ativos de risco não dá o retorno mínimo exigido frente ao risco em um ano.
O BC errou no último ciclo de corte de juros. O BC errou no ciclo de alta e o BC está errado agora.
A crise de crédito no nosso país está batendo à porta. A desaceleração das economias avançadas é realidade frente ao ciclo de alta de juros. O governo brasileiro já percebeu isso e o dinheiro para estimular a economia está caro.
O BC brasileiro precisa mudar o tom do seu discurso a partir da próxima reunião e concordar que a política contracionista já está em patamares elevados, sinalizando que deverá ajustar ao longo dos próximos trimestres, através de corte na Selic, ou seguiremos para mais um abismo econômico.