Durante a semana, autoridades do governo criticaram o nível da taxa de juros e ainda questionaram a independência do Banco Central. No entanto, cabe destacar que o principal objetivo da autoridade monetária é manter a inflação na meta estabelecida pelo Conselho Monetário Nacional, e sua principal ferramenta é a decisão da taxa de juros. Dito isso, importante relembrar como foi a trajetória até atingirmos o elevado patamar da Selic atualmente.
A pandemia trouxe choques relevantes na economia mundial. Por um lado, a oferta foi fortemente impactada, com paralisação de atividades ao redor do mundo gerando gargalos logísticos e redução da capacidade de oferta de produtos e serviços. Por outro, os estímulos fiscais implementados fortaleceram a demanda, gerando forte desequilíbrio entre a oferta e a demanda e, consequentemente, aumento da inflação.
No caso específico do Brasil, o país ainda sofreu com um avanço na taxa de câmbio e aumento nos preços de commodities, principalmente o petróleo. O elevado preço de combustíveis, aliado a sucessivas expansões fiscais do governo anterior, impactou a inflação, que atingiu 10,06% ao final de 2021.
O Banco Central, então, elevou a taxa de juros para 13,75% buscando não só arrefecer a demanda agregada para desacelerar a inflação como também ancorar as expectativas à frente. Pode-se argumentar que, ao final de 2022, a inflação retornou a 5,79% e, portanto, já haveria espaço para afrouxamento da política monetária. No entanto, alguns fatores pesam contra a queda da taxa de juros neste momento.
Em primeiro lugar, a redução na inflação se deu principalmente pela desoneração de impostos ligados especialmente a combustíveis e energia elétrica, enquanto a dinâmica inflacionária segue pressionada. Importante destacar que parte desses impostos devem retornar ao longo do ano. Além disso, a política monetária possui efeito defasado na atividade econômica, com estimativas de que mudanças na taxa de juros só impactem a economia entre 6 e 12 meses.
Dito isso, hoje, observamos alguns sinais iniciais de desaceleração da atividade econômica, principalmente no setor de serviços, este representando grande parte da economia do país. Por outro lado, vemos um mercado de trabalho aquecido, com a taxa de desemprego atingindo o menor patamar desde 2015 e ganho de 7,2% no rendimento médio real, fator que ajuda a pressionar ainda mais a inflação.
Além disso, a expansão de gastos planejada para este ano pelo novo governo eleito deve pressionar a demanda agregada, dificultando a tarefa do Banco Central em trazer a inflação para a meta. Somam-se a isso riscos fiscais ligados à possibilidade de ajuste acima do esperado das alíquotas de Imposto de Renda e do salário mínimo.
Portanto, ainda que a inflação tenha arrefecido do pico observado no ano passado, a atual dinâmica inflacionária segue estruturalmente pressionada. Adicionalmente, os riscos fiscais elencados acima geram preocupações e afetam negativamente a curva de juros e expectativas de inflação à frente.
Ainda, questionamentos sobre a independência que possam ser interpretados como pressão sobre a autoridade monetária causam apreensão e impactam negativamente as expectativas do mercado. Logo, o cenário mostra-se desafiador para a condução da política monetária pelo Banco Central, com a conjuntura indicando que o país provavelmente precisará conviver com taxas de juros elevadas por mais tempo do que o incialmente esperado.