Análises fundamentais de criptoativos sempre esbarram num grave problema para quase todos: os ativos são produtos de pesquisa e desenvolvimento em criptografia, análise combinatória e teoria dos jogos. Poucas pessoas possuem formação para entender esses componentes todos simultaneamente. Conforme dito na última coluna, não há múltiplos confiáveis para criptoativos e, muito menos, algo bem aceito como demonstrativos contábeis. Nesse caso, uma valuation de criptoativo é ainda mais difícil.
Há metodologias para valuation baseadas em, por exemplo, a teoria quantitativa da moeda. Essas análises geram tabelas de valuation parecidas com a de ativos típicos, inclusive no grande número de premissas heroicas. Os modelos desenvolvidos, no entanto, pecam ainda mais do que sua contraparte tradicional: eles geram poucos insights sobre os drivers da adoção do ativo. Em geral, assume-se um valor máximo e uma curva em forma de S, com diversos textos entrando pouco na análise de tecnologias.
Sabe-se, no entanto, que a tecnologia importa no desenvolvimento de ativos com potencial de longo prazo. Períodos de FUD (medo, incerteza e dúvida, numa tradução do original em inglês) causam danos aos retornos. Além do mais, no caso de uma falha crítica, há o fim da qualidade do ativo como reserva de valor. Estudar a tecnologia, os riscos de diversos algoritmos de mineração, possíveis ataques e similares acaba sendo fundamental para quem quer um hold de longo prazo.
A pergunta que fica é como podemos entender desses temas sem sermos cientistas da computação ou microeconomistas profissionais. Uma sugestão inicial é seguir pessoas no Twitter. Curiosamente, muito das comunicações técnicas termina sendo explicada de maneira didática em threads e textos no Medium. Por exemplo, você não precisa entender as pesquisas do Emin Gun Sirer para conseguir utilizá-las minimamente em formação de portfólio. Seu twitter e suas diversas entrevistas colaboram para construir uma intuição do que pode ou não ser diversificado em termos de alguns riscos tecnológicos. Essa dica vale para diversas outras pessoas.
Além de seguir referências na comunidade, agregadores de notícia – e o estudo mais meticuloso do passado – ajudam a seguir e a contextualizar diferenças nas moedas. Questões como liderança, comunidade, parcerias tecnológicas e desenvolvimento comercial podem impactar a percepção do mercado a curto e médio prazo. Sugiro aos interessados nesse approach o agregador “cryptopanic”. Ler e interpretar o apresentado nesse site faz alguma diferença no que diz respeito a entender o estado do mercado e das tecnologias.
Essas questões como um todo devem ser sempre cruzadas e analisadas criticamente. A liderança de Justin Sun no criptoativo TRON é extremamente carismática e mobiliza partidários. Isso é um ativo, e vale/valeu por muito tempo para o Litecoin e Charlie Lee, que se mantém como a sexta maior criptomoeda mesmo fora dos debates mais interessantes sobre a tecnologia. Entretanto, ao ver as contribuições para debate de outros líderes como Vitalik Buterin, fica a impressão de que há menos espaço para disrupção vinda do TRON que do Ethereum, por exemplo. O sistema de DPoS é um avanço do TRON frente ao Ethereum, porém até quando essa questão somente será relevante? Por outro lado, será que as inovações do Ethereum não representam um risco? Contrabalancear as opiniões e notícias com fatos críveis é fundamental; estudar os roadmaps e acompanhar as tecnologias é mandatório para saber contextualizar e ter intuições sobre como responder essas perguntas.
A última recomendação é seguir fóruns especializados e, sempre, estudar bastante. Discussões sobre improval proposals nas moedas e o Bitcoin Talk costumam ser excelentes portas de entrada para temas mais espinhosos. Isso já é um grau de atenção que toma certo tempo e demanda estudos posteriores. Tentar entender discussões de software sem algum domínio de programação, estruturas de dados e sistemas distribuídos, por exemplo, pode trazer grande confusão. Quando se dedica, porém, há grandes benefícios.
Efetivamente é muita coisa a ser estudada nesse mercado. O que recomendei são apenas as atividades que creio mais imediatas sobre o mercado e que devem ser, em maior ou menor grau, seguidas por todos que fazem alocações grandes em criptoativos. Se não há tempo para tudo isso, talvez alocar maior proporção dos recursos em um índice ou portfólio calculado quantitativamente seja uma escolha mais adequada, conforme já discuti nessa coluna. Porém, mesmo para os investidores de índice, recomendo certos cuidados básicos como o twitter ou cryptopanic, seja por investimentos, seja porque o mercado de criptoativos é extremamente interessante per se.