Alvaro Bandeira é economista-chefe e sócio do Banco Digital Modalmais
Avaliando pela ótica do Ibovespa, já fechamos um mês inteiro de mercado sem grandes definições, com o índice flutuando entre os limites de 104.000 e 102.000 pontos, com alguns arranhões abaixo e acima disso. De forma geral, podemos creditar a maior parte dessa indefinição de tendência para a percepção dos investidores de que a economia global está em rota de desaceleração, apesar da postura mais flexível dos principais bancos centrais do planeta no que tange a política monetária.
Na semana passada, isso ficou ainda mais claro com a divulgação de indicadores de atividade industrial e de serviços nos EUA e tendência de desaceleração do payroll americano em setembro (criação de vagas nos setores público e privado), apesar da redução da taxa de desemprego de 3,7% para 3,5%. Porém, ninguém espera nenhuma reação americana no curto prazo, com o crescimento de 2019 ficando pouco acima de 2,0%. No entanto, muitos economistas esperando que o PIB do quarto trimestre do ano já esteja crescendo aquém do PIB potencial, o que poderia sinalizar recessão mais à frente, já bem próxima do período eleitoral, dificultando hoje certa reeleição de Donald Trump.
Claro que existem outros problemas subjacentes à desaceleração econômica global. As incertezas comerciais a partir das difíceis negociações entre China e EUA (recheada fortemente pelo roubo de propriedade intelectual), pulam na frente, mas temos, adicionalmente, as também complicadas relações com a União Europeia, com a autorização da OMC (Organização Mundial do Comércio) para retaliações americanas. Com isso, os EUA passarão a impor tarifação de 25% sobre bens industriais e agrícolas e de 10% sobre aviões de grande porte. Essa é só mais uma encrenca.
É bem verdade que o BCE (Banco Central Europeu) está tomando medidas de flexibilização monetária, mas o presidente que está deixando a instituição (Mario Draghi) sempre versou sobre a necessidade de medidas estruturantes por parte dos países para ajudar no esforço monetário. A presidente que está assumindo agora em outubro, Christine Lagarde, declarou que há muita incerteza na política monetária e que isso abre espaço para dissenções no BCE. Ela é tida como excepcional negociadora.
A Alemanha, tem puxado a desaceleração econômica da zona do euro, mas existem outros países com problemas, como Itália e Espanha, com dificuldade de montar gabinetes de governo com Portugal depois das eleições do final de semana (os socialistas terão que compor com outros partidos para seguir governando). Nessa mesma linha, o governo do Japão admitiu desaceleração da economia pela primeira vez nesse ano, e justamente quando decidiu elevar o imposto sobre consumo, que em outras épocas jogaram o país na recessão. Correndo nessa linha, ainda temos a China lutando para manter crescimento acima de 6,0%, e com isso afastar qualquer questionamento do governo.
Ilustramos a situação vigente para tentar buscar o tema desse artigo sobre se estaríamos diante de definições importantes que mudariam esse quadro. Nossa visão é que, existem boas chances disso acontecer, não sem muito sacrifício. Por ora, temos a constatação de que em apenas três pregões de outubro os investidores estrangeiros sacaram recursos da ordem de R$ 4,38 bilhões, deixando 2019 com saídas líquidas de R$ 25,2 bilhões, certamente um recorde.
Tentando dar um tom otimista para o momento, diríamos que, para quem acredita que o mundo não irá novamente à garra como a partir de 2008, estaríamos diante de momento raro para compra de ativos de risco. Para embasar esse otimismo, seria preciso acreditar que a ameaça de guerra comercial vai começar a ser afastada nesse encontro de quinta-feira (10/10) entre os negociadores chineses e americanos, que não teremos mais tantos ruídos sobre o impeachment ainda pouco provável de Trump, que a União Europeia e Reino Unido vão chegar a bom termo sobre fronteiras das Irlandas, que a Alemanha parece ter chegado ao fundo do poço depois de fechado o terceiro trimestre e que bancos centrais vão seguir fazendo o possível na política monetária, como estão demonstrando.
Aqui, temos que pensar na continuidade das reformas estruturantes, na aceleração do modelo de privatização (começando por Eletrobrás), na vigência e encaminhamento do pacto federativo, no melhor equilíbrio entre os três poderes e no sucesso do leilão dos excedentes da cessão onerosa, que trará alívio no curto prazo.
Como se vê, muita coisa precisa acontecer e quase de forma simultânea. Mas, para os mercados reagirem, basta que todas (ou muitas) dessas questões estejam bem encaminhadas. Para quem acredita nisso, é certamente um bom momento para aquisições de maior risco, principalmente num ambiente de juros muito baixos.