A gente já sabe que a política monetária é uma ferramenta fundamental para governos e bancos centrais gerenciarem a economia de um país, e que entre seus diversos mecanismos, a definição das taxas de juros acaba por exercer um papel crucial na estabilidade e no desenvolvimento socioeconômico. Relembro esse conceito básico – especialmente para quem é do mercado financeiro – pois estamos acompanhando, ao longo dos últimos meses, uma disputa entre Poder Executivo Federal e o Banco Central do Brasil sobre a taxa de juros e gostaria de trazer uma ponderação sobre o tema, importante para entendermos os próximos movimentos do Copom.
Para explorarmos a importância da política monetária na segurança das taxas de juros e analisarmos os principais elementos que influenciam essa decisão, gostaria de voltar um pouco no tempo e lembrar do pós-crise de 2008, quando aceleramos o consumo no Brasil e adotamos uma série de políticas de administração de preços para tal.
Na época, o crescimento obtido foi rápido, principalmente pelo fato de que o ciclo econômico estava se expandindo e o governo havia conseguido uma boa arrecadação, o que sustentava tal direcionamento. Porém, quando a curva de crescimento perdeu aceleração e tornou-se necessário colocar um fim na política de ajuste nos preços, foi registrada inflação na casa dos dois dígitos nos anos seguintes, fator chave para a estagnação e posterior retração da economia brasileira, entre 2014 e 2016.
Embora tais eventos tenham ocorrido há quase 10 anos atrás, atualmente é possível observar movimentos semelhantes que resgatam aquele mesmo modus operandi: mudança na política de preços de combustíveis, alteração pontual na tributação de veículos, entre outras medidas, que me levam a conclusão de que o pensamento para o desenvolvimento é "muito simples" e "imediato": se houver geração de empregos e novas arrecadações (ou, pelo menos, aumento das atuais), haverá compensação econômica capaz de manter a política de preços. Bem, pode até ser. Mas, no meu ponto de vista, isso esquece de levar em consideração o aprendizado que obtivemos no passado ou reduz sua importância.
Pós-pandemia da COVID-19, temos um movimento global de luta contra o fator inflacionário. Os bancos centrais ao redor do planeta ainda estão subindo suas taxas de juros de forma a conter a inflação, causada, principalmente, pela lenta recuperação da cadeia produtiva, bem como sua mudança de fluxos, agravada pela invasão da Rússia à Ucrânia e consequentes sanções, além de diversos outros fatores que resultam em algo unânime: aumento de preços.
Naturalmente, no Brasil não é diferente, mas por aqui tivemos um posicionamento mais ativo do Banco Central, com atuação preventiva oferecendo um ambiente relativamente estável, para que a economia local não fosse tão corroída pela inflação. Eu acho que isso pode ser facilmente percebido, se olharmos o crescimento do PIB no primeiro trimestre de 2023, surpreendendo positivamente, e ainda uma série de indicadores que corroboram com essa percepção mais animadora. Logo, acredito que a condução até aqui foi assertiva, mantendo capital externo no Brasil e gerando, principalmente, uma percepção de segurança e estabilidade em investidores e empresas, por meio de uma atitude diretiva e firme do Banco Central, sustentando uma visão clara dos objetivos buscados, não se mostrando suscetível às pressões. Declarações mais recentes do presidente do Bacen enfatizaram que o plano fiscal ruma para um caminho certo e que o impacto disso poderá ser percebido em breve. O mercado abraçou isso.
Dessa forma, agora que temos, na prática, indicadores que transmitem confiança sobre o controle inflacionário, a tendência é que sejam dadas sinalizações de que a SELIC pode ser reduzida nos próximos meses. Na minha visão, se houvesse uma mudança nos meses anteriores, de 0,25 pp ou até mesmo de 0,50 pp, a medida produziria poucos impactos econômicos diretos em si, como barateamento do crédito, por exemplo. No entanto, poderia gerar uma percepção ruim de intervenção no Banco Central. Algo que se acontecesse, impactaria drasticamente no comportamento do mercado, resultando em maior insegurança e perda de credibilidade, afastando investimentos e capitais, o que possivelmente criaria uma ruptura no movimento de crescimento que observamos nesse primeiro trimestre de 2023.
Na visão de futuro, o presidente do Banco Central indicou, sem especificar o momento, que haverá espaço para corte na taxa básica de juros. Do outro lado, o Governo espera pela redução, uma vez que houve aprovação do marco fiscal na Câmara e melhora dos índices econômicos. Mas as coisas não são tão simples assim e embora juros menores tenham o poder de estimular o consumo e, por sua vez, contribuir com o cenário macroeconômico mais positivo, há riscos de superaquecimento, num País em que bate recordes de endividamento. Aparentemente, tudo leva a crer que teremos uma redução da Selic a partir da reunião de agosto, com mais um corte seguido, em setembro, e que finalizaremos o ano na casa dos 12%. Ainda alto, mas em ponto de equilíbrio entre política fiscal, controle inflacionário e crescimento econômico. Esperamos!