É interessante observar que muitos investidores têm questionado a relação entre o cenário macroeconômico dos EUA e suas consequências nas decisões de política monetária no Brasil. Não é surpreendente, uma vez que estamos falando da maior economia do mundo, e, naturalmente, todos os olhares se voltam para lá.
As respostas para essa questão são diversas, e o principal ponto é que não se trata de um processo mecânico, onde o aumento dos juros nos Estados Unidos automaticamente implica em um aumento aqui no Brasil, e vice-versa. No entanto, é importante ressaltar que menores pressões para a elevação dos juros externos contribuem para uma condução de política monetária menos contracionista em nosso país, ou seja, há menos pressão para elevarmos as taxas de juros.
Nesse sentido, hoje apresento um dos motivos que ajuda a entender essa correlação entre o cenário macroeconômico internacional e o nacional: o rating (ou a credibilidade) dos títulos públicos emitidos pelo governo americano em comparação com os emitidos pelo governo brasileiro.
Para ilustrar de forma mais tangível, o rating pode ser comparado à classificação que um banco atribui a um indivíduo ao emprestar dinheiro. Se você tem uma reputação de bom pagador, é provável que os juros do empréstimo sejam mais baixos.
Voltando ao contexto macroeconômico, há cerca de um mês, o mercado brasileiro foi surpreendido positivamente pela melhora da perspectiva da nota atribuída pelo S&P Global Ratings, uma das agências de classificação de risco mais prestigiadas entre os agentes financeiros. Essa revisão elevou a classificação do Brasil de "estável" para "positiva", sendo a primeira revisão para cima desde 2019.
Portanto, à medida que melhoramos nossa reputação, que já está em andamento, por meio de uma perspectiva mais favorável em relação à inflação e da demonstração de responsabilidade com as contas públicas por meio do avanço do arcabouço fiscal no Congresso e da aprovação da reforma tributária na Câmara, isso implica que o governo poderá obter empréstimos com juros menores ao emitir títulos públicos. Esses juros, por sua vez, são representados pela taxa básica de juros, a Selic, que é definida pelo Banco Central.
Entendendo melhor com os dados macroeconômicos
Na quarta-feira, o Índice de Preços ao Consumidor (CPI) dos Estados Unidos apresentou uma leitura melhor do que o esperado, com um avanço de 0,2% em relação à expectativa de 0,3%. Isso indica que as pressões sobre os preços no grupo de alimentos foram menores, já que o núcleo do CPI recuou de 5,3% para 4,8%.
Os preços da energia foram os principais responsáveis pela inflação em junho, com um aumento de 0,6%, em comparação com a queda de 3,6% em maio. No entanto, é importante destacar que, nos últimos 12 meses, o índice de energia ainda registra uma queda de 16,7%.
Apesar dos dados melhores do que o esperado, o grupo de serviços, excluindo energia, ainda apresenta certos desafios para o processo de desinflação no país. Observou-se um aumento nos preços de 0,3% em junho, contribuindo para uma alta de 6,2% no acumulado de 12 meses. Uma das explicações possíveis pode ser atribuída ao mercado de trabalho aquecido, que está exercendo pressão sobre os preços nesse setor.
Corroborando um cenário mais favorável para a perspectiva inflacionária nos Estados Unidos, os dados do Índice de Preços ao Produtor (PPI) de junho mostraram um avanço de 0,1%, abaixo da expectativa de 0,2%. No acumulado de 12 meses até junho, o índice registrou um aumento de 0,1%, em comparação com os 0,9% nos 12 meses anteriores.
Isso significa que, com a melhora na inflação ao produtor, é provável que haja menor pressão de custos sobre os consumidores e, consequentemente, uma menor necessidade de aumentos nas taxas de juros na economia americana.
No contexto da economia brasileira, os dados do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de junho mostraram uma variação de (-0,08%) em relação ao mês anterior. No acumulado de 12 meses, a inflação atingiu 3,16%, ficando abaixo dos 3,94% registrados nos 12 meses anteriores.
A inflação acumulada nos últimos 12 meses até junho continua a demonstrar um processo de desinflação iniciado em maio do ano passado, quando atingiu 12%. Em termos qualitativos, é importante observar a queda no índice de difusão, que passou de 56% para 50%, indicando uma menor disseminação da inflação entre os itens que compõem a cesta do IPCA ao longo do último ano. Isso sugere que a inflação está menos generalizada.
Fonte: IBGE
Por outro lado, é importante destacar a aceleração dos preços no setor de serviços, que passou de uma queda de 0,06% em maio para um aumento de 0,62%. Em termos de atividade econômica, esse resultado é positivo, pois indica um aquecimento na demanda por esse setor. No entanto, essa aceleração pode influenciar uma postura mais cautelosa em relação à magnitude dos cortes de juros que serão implementados pela autoridade monetária no segundo semestre do ano.
Por fim, considerando o cenário doméstico de início de cortes de juros devido à melhora nas perspectivas de inflação, enquanto os juros na economia americana caminham para o fim do ciclo de alta, é provável que tenhamos menores pressões para a condução de cortes na taxa Selic nas próximas reuniões. Isso contribui para a efetividade da política monetária no país, permitindo uma abordagem mais assertiva e estratégica em relação às decisões de política monetária.