O Comitê de Política Monetária do Banco Central do Brasil (Copom) decidiu manter a Selic estável em 13,75% ao ano, como amplamente esperado pelo mercado.
Nesses casos em que o mercado já espera a decisão, o mais interessante da reunião passa a ser o comunicado que o Banco Central solta logo após a decisão com a explicação, além de dicas a respeito dos próximos passos.
No comunicado, que estava praticamente idêntico ao anterior, um parágrafo me chamou a atenção:
“O ambiente externo mantém-se adverso e volátil, com revisões negativas para o crescimento global e aumento da volatilidade nos ativos financeiros. O ambiente inflacionário segue pressionado, enquanto o processo de normalização da política monetária nos países avançados prossegue na direção de taxas restritivas, tornando as condições financeiras mais apertadas. O Comitê notou também a maior sensibilidade dos mercados a fundamentos fiscais, inclusive em países avançados. O Comitê avalia que ambos os desenvolvimentos inspiram maior atenção para países emergentes”.
Para quem ainda não sabe, ele estava se referindo à crise que tivemos na Inglaterra nos últimos dias.
Tivemos o início de um novo governo da primeira ministra Liz Truss, que imediatamente anunciou um pacote de estímulos fiscais para retomar a atividade na Inglaterra.
O mercado ficou tão preocupado com o volume de aumento nos gastos, que tratou de aumentar o prêmio de risco dos ativos.
As taxas de juros subiram incríveis 50 pontos base em um único dia e só retornaram a patamares anteriores depois que o Banco Central Inglês interveio no mercado de títulos.
Após apenas 45 dias no cargo, somado a uma pressão enorme do mercado com a repercussão negativa do pacote de estímulos, a primeira-ministra foi obrigada a renunciar.
O novo primeiro-ministro britânico, Rishi Sunak, tomou posse se comprometendo à responsabilidade fiscal.
Isso mostra que em época de inflação alta e juros subindo, não há espaço para aumento da dívida.
Uma coisa é você financiar estímulos fiscais a juro zero. Outra coisa, bem diferente, é você pagar 5% ou 10% por cada estímulo.
Quanto mais cara se torna a dívida, mais o mercado se pergunta sobre a real capacidade do país de se financiar.
E o mais surpreendente de tudo isso é o mercado ter questionado a solvência de um dos países considerados mais desenvolvidos do globo.
O recado do mercado é bem claro: os países não têm mais espaço para estímulos fiscais. Eles terão que resolver seus problemas de atividade de uma outra forma.
É extremamente importante esse recado para todos os emergentes. Se com os desenvolvidos já não se tem paciência, imagina com os renegados.
Segue tudo igual
Apesar desse alerta logo no começo do texto, todo o restante do comunicado não mostrou nenhuma grande alteração.
Seguiram as frases que sugeriam que a Selic deve ficar estável em 13,75% ao ano por um período “suficientemente prolongado”. Além disso, seguiu também o parágrafo que dizia que caso isso não fosse necessário para levar a inflação para a meta, que eles não hesitariam em continuar subindo os juros.
Apesar do discurso duro repetido, o fato é que essa decisão de manutenção foi muito mais fácil para o Banco Central.
A inflação teve dois meses seguidos de queda e os núcleos vêm mostrando desaceleração em relação aos altos patamares dos últimos trimestres.
Além disso, o próprio mercado vem reduzindo as projeções de IPCA para este ano e o próximo, deixando o BC mais confortável em manter o plano de voo.
E o mercado hoje?
Como a decisão já era esperada nos preços de mercado, nada deve mudar para o mercado de renda fixa nesta quinta-feira, 27.
Todos os investidores estão muito mais ligados em pesquisas de intenção de voto do eleitorado brasileiro do que no Copom propriamente dito.
Muitos gestores operaram um cenário de virada de Bolsonaro no intervalo entre turnos, imaginando que antes das eleições seria possível zerar as apostas. Mas o evento da prisão de Roberto Jefferson e a possível contaminação no “momentum” do Bolsonaro fez com que muitos deles “zerassem” as posições antecipadamente, provocando uma bela volta no mercado de ações e juros.
Mordida por cobra
Eu não gosto de operar esse tipo de cenário. Sou cachorro mordido por cobra e tenho medo de salsicha.
As eleições de 2014 foram bem disputadas e provocaram oscilações fortes e pouco antecipáveis no mercado.
O resultado de eu tentar operar um cenário desse foi um longo período de perdas.
Depois disso aprendi: não invisto jogando uma moeda pra cima.
Ou seja, se a chance de dar o cenário “A” é parecida com a chance de dar o cenário “B”, então essa não é uma boa aposta.
Boas apostas são aquelas que você tem muito pra ganhar e pouco para perder.
Elas aparecem de vez em quando. Mas nem sempre. Espere por elas!
Um grande abraço.
Bons negócios.