Eu sei, essa companhia é pouco conhecida e quase ninguém do sell-side mainstream está olhando para ela (menos a Eleven e Brasil Plural, eles cobrem). Mas a companhia passou por um turnaround e hoje está começando a colher alguns frutos.
Já adianto que ela apresentou um bom resultado. A melhora operacional que vem acontecendo na companhia e a melhora na comunicação da administração para futuros planos me fazem ficar otimista com o case.
Antes de adentrar no resultado e na minha opinião sobre o case, vamos descobrir quem é essa companhia que existe há 58 anos?
Estamos falando da segunda maior distribuidora de medicamentos do país (ela distribui para Drogasil, Pacheco, PagueMenos, dentre hospitais e outros), com 11 centros de distribuição, 3800 cidades atendidas e com uma operação de varejo que é o ponto chave para a companhia começar a brilhar.
Mas como exatamente ela ganha dinheiro?
A empresa possui 3 segmentos:
- Farma (Distribuição)
- D1000 (Varejo)
- Especialidades (Marcas próprias, JV, etc.)
Dentro de distribuição não há muito o que falar: ela distribui produtos farmacêuticos, de higiene pessoal e cosméticos. Esse segmento representa cerca de 81% da receita bruta da companhia. Enquanto isso, o segmento de varejo (venda de medicamentos, vacina e cosméticos) fica com praticamente todo resto, cerca de 19%.
O segmento de varejo é dividido em 198 lojas (123 no Rio de Janeiro, 63 no Distrito Federal, três em Tocantins, sete no Mato Grosso do Sul e uma em Goiás), sob as marcas Drogasmil, FarmaLife, Tamaio e Rosário.
Em especialidades, como o capital investido nesse segmento tem sido praticamente irrisório nos últimos anos, faz sentido ele mal representar uma fatia da companhia. Ele está lá, existindo, mas a companhia acaba por nem reportar pela irrelevância. Sendo assim, já que entendemos o que ela faz e como ela faz, vamos ao que interessa.
QUADRO DE DESTAQUES
Eu sempre gosto de começar pelo quadro de destaques por que ele dá uma visão geral sobre a companhia (obviamente). Mas, sempre que eu olho esse quadro, já da para saber se o resultado foi bom ou não, porque, quando não é bom, ou a empresa não o coloca ou coloca sem informar variações ou abandonando algumas métricas importantes, rs.
Não é o caso da Profarma (SA:PFRM3), que apresentou um recorde na sua Receita Bruta, alcançando R$ 5,6 bilhões em 2019, alta de 12,8% frente a 2018. Esse aumento da receita se deve ao fato de a companhia estar vendendo mais, ou melhor, distribuindo mais!
Quando quebramos a receita bruta, percebemos que distribuição cresceu quase 19% e infelizmente, varejo retraiu 2%:
Mas tudo bem, varejo está na sua fase final de turnaround e o segmento de distribuição acabou por impulsionar o resultado (mais na frente eu explico melhor o varejo).
Outro ponto positivo foi um Ebitda de R$ 116 milhões com alta de 21,8% quando comparado com 2018. Além disso, a companhia apresentou um FCO (Fluxo de Caixa Operacional) positivo em R$ 52,4 milhões (o terceiro trimestre consecutivo positivo) e a realizou investimentos na casa dos R$ 27,5 milhões, com cerca de 73,5% desse montante indo diretamente para o segmento de varejo (reforma de lojas e abertura de seis novas lojas). O restante foi para distribuição, para compra de máquinas e equipamentos.
Olhando melhor o fluxo de caixa da companhia, conseguimos perceber o ganho operacional que a mesma está tendo:
Primeiro que o fluxo de caixa advindo de suas operações foi positivo, isso é importante. Os Recursos Aplicados/Gerados nas Operações foi quase o dobro. Isso se deve ao fato de o “Outros” ter sido positivo em relação ao ano anterior, juntamente com uma boa gestão nas duplicatas a receber e estoques.
Esses “Outros”, em grande parte, veio de uma renegociação na última parcela da Rosário (adquiriram em 2016) que foi favorável para a companhia. Esta renegociação acabou também por ajudar o Lucro Líquido da companhia neste último trimestre.
Outro ponto importante é que a companhia continuou mantendo o mesmo montante de investimento do que no ano anterior, porém, na parte de financiamentos temos um caso interessante. Em 2018, o Fluxo de Caixa de Financiamento foi positivo e muito alto em comparação a 2019. Isso aconteceu porque a companhia fez um aumento de capital no ano de 2018, assim como em outros anos. Isso é meio ruim, porque aumento de capital com frequência pode indicar que a companhia não está conseguindo gerar caixa das suas operações para pagar dívidas ou amortizá-las. O fato de ter consumido um leve caixa no final de 2019 não me preocupa… o que eu notei foi que a companhia conseguiu força operacional e não precisou aumentar o capital outra vez.
Para finalizarmos essa pincelada nos resultados, a relação dívida líquida/Ebitda encerrou em 3,8x, mesmo com a dívida líquida aumentando um pouco em 2019 - nível que eu considero alto, mas que pela melhora operacional tende a se reduzir cada vez mais.
Além disso, no curto e longo prazo, pelo nível de caixa e pela melhora continua na geração de caixa, não vejo motivos para ela não conseguir honrar com suas obrigações.
DESAFIO DO VAREJO/COVID-19
Essa parte eu vou demorar mais um pouco. Mas você quer entender sobre o momento atual da companhia e o futuro? Então fica aqui comigo!
Aqui é o ponto chave do case. É possível perceber que houve uma melhora operacional por parte da companhia depois de tantos anos operando no vermelho e não entregando resultados.
Como distribuição já está em um nível maduro, a companhia se encontra como a segunda maior neste segmento, e crescer mais do que isso é cada vez mais difícil. O segmento de varejo precisa dar certo e ganhar escala. Só que esse segmento é bastante competitivo, basta olhar as margens da companhia.
A leve queda nos resultados da parte de varejo pode ser explicada pelo fechamento de oito lojas. Agora, a companhia está investindo para abrir novas lojas e finalizar algumas reformas. A Profarma tem trabalho na reprecificação e fechamento de lojas ineficientes, esforço que já começou a mostrar efeitos positivos. Basta olhar as vendas mensais por lojas no último trimestre, que cresceram 1,7% YoY (ano contra ano) e o Ticket Médio apresentou aumento de 4,1%.
No final do ano de 2019, em um evento com investidores, o grupo mostrou um plano mais realista e sensato para a empresa. Isso envolve uma retomada de ganhos nas margens do braço de varejo e uma retomada mais acelerada de abertura de lojas (após anos fechando ou reformando lojas deficitárias).
Segundo a própria companhia, pretendem chegar ao final de 2020, pela primeira vez desde a sua entrada no varejo (2013), abrindo mais lojas do que fechando e sem efeito negativo sobre a margem de lucro.
Mas calma lá! Não devemos ver uma avalanche de aberturas e nem brotando a cada esquina uma FarmaLife ou Drogasmil. A companhia sabe que ela não é nenhum Raia ou São Paulo (grupo Pacheco) que abre 100, 200 lojas por ano. A proposta da companhia é ter um “net value” em 2020 pela primeira vez, ganhando margem. Nada mal a meu ver, a companhia sabe da sua estrutura e não quer dar nenhum passo maior que as pernas.
Segundo o diretor financeiro Max Fischer, para 2020 a companhia projeta uma margem Ebitda (para varejo) de até 3,5% na metade do ano. Este índice estava em 1,9% no terceiro trimestre de 2019 e encerrou o ano em 2,1%.
Sabemos que o Covid-19 trouxe certo impacto, mesmo com muitas farmácias ainda funcionando por serem serviços essenciais à população. Muitas delas tiveram que reduzir o horário de funcionamento e tomar outras medidas. Sendo assim, não vejo como factível atingir a margem de 3,5% até metade do ano, porém, até o final me parece algo mais alcançável.
O aumento da margem, segundo Fischer, virá da maior contribuição nos resultados das lojas de melhor desempenho. Só em 2019, 70% dos investimentos foram para reformas e ampliações desses pontos. E já tem uns quatro anos que o direcionamento do capital investido começou a ir mais para varejo:
Em relação ao Covid-19…
A companhia comentou que tem sido um desafio, assim como tem sido um desafio para todos os setores. Porém, por já virem de um turnaround, a companhia estava com uma cabeça mais preparada para crises.
Logo, no começo de tudo, instalaram um software com AI (Inteligência Artificial) que cruza o horário dos seus (cliente) cupons fiscais e cruza também com o ponto eletrônico biométrico do pessoal da empresa, sugerindo uma melhor realocação. Além disso, somente as lojas do shopping foram fechadas por motivos de força maior e algumas do centro do Rio por conta da queda de pessoas transitando no lugar (isso dá em torno de uns 15% das lojas totais).
Um trabalho excelente feito pelo time. E tem mais! Funcionários dessas lojas fechadas estão substituindo outros funcionários que pediram atestado ou que tiveram que ficar de casa. Obviamente que a companhia está buscando alguns funcionários em casa pela parte de manhã, trabalho que ela já fazia no turno da noite para deixar funcionários em suas casas.
Gestão de estoque… como fica o mix de produtos?
Por sorte, isso aconteceu em um momento que o setor que já opera mais estocado por conta de um eventual aumento de preço em primeiro de abril. Vitamina ou tudo que trata os sintomas, antigripais e resfriados, explodiram de uma forma absurda. Só vitaminas foi 200% de alta! Segundo a companhia, nessas horas toda sua previsibilidade vai por água abaixo, mas não deixaram faltar nada aos seus clientes.
Ainda sobre gestão de estoque e logística, a companhia comentou que continua distribuindo entre 500 e 600 mil e atendendo 45 mil clientes/mês, sendo que 20 mil compram por dia. São 700 a 800 veículos fazendo distribuição até a parte final.
É um exercício duro para eles, porque você não tem uma preocupação só com a sua operação. Os terceiros estão operando com um volume menor, mas segundo a companhia, não haverá uma ruptura na cadeia. Não veremos nenhum desabastecimento estruturado e há notícias boas em relação ao resto do mundo. Tiveram um volume de 50% maior em todos os clientes que estavam, ou querendo aproveitar um aumento de preços ou se preparando para a demanda adicional que está havendo.
Como tende ser a companhia pós covid-19…
Esse momento pegou a companhia com os pés mais no chão. Tiveram um grande trabalho para fazer o turnaround do varejo e pegou ele em um momento em que 100% desse trabalho já estava para trás.
Já estão fazendo um terceiro mergulho na análise de cada uma das causas raízes do negócio. Do ponto de vista time ou organizacional, foi pega num momento melhor. Começaram o ano muito bem e a melhoria operacional da distribuição continua forte e agora parece que é o momento do varejo.
Sobre linhas de créditos, já trabalham com linhas de créditos adicionais por conta do aumento de preço, nunca fizeram com linhas menores de 6 meses. Esse ano o aumento de preço, em tese, seria maior que no ano passado, que foi em torno de 2%, e neste ano deveria ser em torno de 4%. Já estavam trabalhando isso antes e, no decorrer do mês de abril, completaram mais algumas captações e parecem estar bem tranquilos. Em termos de competência, o ciclo de caixa foi reduzido quase financiando totalmente o crescimento da companhia.
MEU OUTLOOK PARA PFRM3
A todos que me acompanham e leem as coisas que eu escrevo. Esse provavelmente é um dos cases mais complicados que eu já escrevi. Estamos falando de um case em final de turnaround, que há ssete anos não entrega resultados, teve três chamadas de aumento de capital nos últimos anos e está bem atrás dos demais players do setor quando olhamos para varejo.
Porém, todavia, contudo, eu vejo bastante valor no modelo distribuição/varejo. É um diferencial que as outras do setor não têm e, quando têm, é pouco. Estamos falando da segunda maior distribuidora do país. Além disso, pela primeira vez (e eu tive que esperar três trimestre para confirmar isso, não bastava um apenas) estamos realmente vendo acontecer uma melhora operacional constante.
A companhia tem conseguindo aumentar suas métricas de rentabilidade, apresentou um lucro e está diminuindo sua alavancagem. Conseguiu reduzir seu ciclo de caixa, o que é bastante positivo, porque ela diminui a reposição do capital de giro cerca de R$ 48 milhões. E ela conseguiu isso mesmo com aumento de vendas de 13%.
Mas e seu valuation? Atrativo?
Olhando para o EV/Ebitda (Esperado para 2020) e o P/L, eu vejo um desconto muito atraente em relação aos principais players que negociam em bolsa. “Mas Breno, ela começou a entregar algum resultado agora, ela tem que negociar com um desconto!”. Concordo, mas acho o desconto bem grande… se a companhia realmente não estivesse entregando ou com perspectivas de piora, aí sim.
Mas vendo toda a melhora operacional, acho que ela tem condições de chegar a negociar acima de R$ 9 na minha humilde opinião. Além disso, olhando para a relação entre preço e valor patrimonial por ação (P/VPA), é possível perceber que ela tem um desconto bastante relevante em relação ao seu patrimônio. E a companhia tem muito imobilizado?
Ela tem bastante imobilizado! Assim sendo, 50% de desconto é um desconto bem acentuado e para mim faz sentido ela negociar pelo menos em linha com o valor patrimonial.
Era isso, valeu!
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