Gostaria de começar dizendo que o resultado foi fraco. Porém, não vi nenhuma mudança de fundamento ou, estruturalmente, alguma piora na companhia. Aliás, estou vendo melhoras a cada trimestre em algumas modalidades, e ninguém nunca disse que esse “case” seria tranquilo. Mas vamos ao que interessa.
DECEPÇÃO
Vou começar pelo lado ruim do resultado e, depois, vou compartilhar o que eu vi de bom e porque continuo confiante no case, ainda mais nesses níveis.
Novamente, tivemos outro trimestre em que o Ensino Superior apresentou resultados bem fracos. Queda de 14% na Receita Líquida, Lucro Bruto com queda de 20% em relação ao 4T18 por conta de maturação de novas unidades e cursos mais nobres, e um resultado operacional que surpreendeu negativamente, com queda de quase 41% contra o 4T18, devido a um provisionamento para perdas adicional.
Não para por aqui: queda de 4% da base de alunos devido a um número maior de formaturas em razão das fortes captações de 2014/2015, além da mudança do perfil de base, com redução do número de alunos FIES (que tinham uma evasão menor) e o aumento do número de alunos EAD (que possuem propensão maior de evadir).
Mas por outro lado, a dependência do FIES está em seus menores níveis. Olhem o gráfico abaixo:
No segundo semestre de 2019, a captação via FIES representou apenas 3% dos novos integrantes do segmento presencial. Ao final de 2020, a companhia estima que 6% da base presencial, ou 2,1% da base total de alunos, sejam via FIES.
Muitos devem estar se perguntando então: “mas e o PEP/PMT?”.Certo, o PEP encerrou com 48,7 mil alunos matriculados utilizando estes recursos. Isso representa cerca de 15% da base presencial.
A expectativa é que esse percentual se reduza nos próximos trimestres, uma vez que o PEP tem sido menos relevante nas últimas captações.
Ainda no cenário ruim…
Tivemos uma maior provisão de PDD (PCLD) em relação a outros períodos.
Essa provisão maior se deu por conta de efeitos extraordinários devidos à migração de alunos para o sistema de faturamento da Kroton (SA:COGN3) e pelos ajustes de volume nas cargas horarias (PAM). Além disso, a companhia se antecipou a qualquer impacto que o Covid-19 venha a trazer - por conta do nível de incerteza relacionado ao vírus, decidiu por provisionar um pouco a mais.
Excluindo esses dois eventos extraordinários, o PCLD teria tido alta de 9% em relação à receita líquida da companhia. A empresa entende que estes itens extraordinários, uma vez já equacionados, não deveriam pressionar o Contas a Receber. Porém, para ter uma margem de segurança maior, optou por provisionar mais neste trimestre.
Falando em Contas a Receber, a Cogna teve, no ano de 2019, um aumento de 21,4% em relação a 2018. Essa melhora se deve a: (i) Aumento da exposição aos produtos de parcelamento da companhia, PEP e PMT, nos quais o pagamento ocorre majoritariamente após a fatura; (ii) Aumento da receita dos alunos pagantes; (iii) Ainda elevado volume de mensalidades em aberto em razão do cenário econômico atual.
Ainda sobre o PDD, a empresa informou que possivelmente vai sentir um impacto (difícil de quantificar) do Covid-19, mas que já está colocando ações na mesa, sendo uma delas dar descontos pontuais a alunos que comprovem perda de emprego ou de renda no período. Até o momento, nenhum desconto foi realizado.
Mas chega de falar do lado ruim. Vamos também para o outro lado!
OPORTUNIDADE
Acho válido começar comentando sobre as ações que a companhia tomou em relação ao Covid-19.
Migraram todos os colaboradores para home office e implementaram serviços médicos e psicológicos online.
No Ensino Superior, foram suspensas todas as aulas presenciais e as atividades foram postergadas no dia 16 de março. Porém, a captação continuou ocorrendo online, como em anos anteriores. A matrícula e os vestibulares já foram migrados para 100% online antes mesmo do Covid-19 aparecer. Antes de fecharem as escolas, já tinham concluído 70% da meta de captações, e 80% da meta de rematrículas já tinha sido concluída.
As escolas estão fechadas desde o dia 16 de março, mas as atividades não pararam. As aulas acadêmicas continuaram via online e 100% do conteúdo já estava disponível para os alunos. O KLS adota o acesso de aula invertido, com tudo já digitalizado (livros, resumos, fóruns, videoaulas etc.).
Já na Educação básica, todas as escolas também foram fechadas. Parceiras da Vasta foram migradas para digital. Três plataformas estão sendo combinadas para oferecer o máximo possível de opções para continuar com suas atividades. A escola digital possui mais de 400 0mil objetos de aprendizagens.
Outro ponto positivo, ainda em Educação básica, foi que a receita começou a ter mais relevância em relação ao Ensino Superior (melhora que vem ocorrendo a um tempo), e hoje representa 26% (ex-PNLD).
Vale ressaltar também que os cursos preparatórios Anglo/Stoodi também disponibilizaram cursos 100% onlines.
Só o fato de não terem parado, como algumas outras faculdades ou escolas, já é um diferencial da companhia, que cada vez mais se coloca como um player que quer ser digital e usar as tecnologias ao seu favor.
Inclusive, um dado interessante foi o engajamento dos alunos em relação ao EAD.
Notem como cresceu o engajamento dos alunos entre 2019/1 e 2019/2 e 2020/1. Era certo que o acesso do AVA iria crescer também, mas estamos vendo que muitos alunos não levaram o lockdown como “férias”. Esse engajamento é muito importante, porque ter alunos engajados com o curso tende a diminuir os riscos de evasão.
Além disso, todos os esforços de colocar as escolas parceiras dentro do digital foi para garantir que continuassem operando sem quebrar todo o fluxo. Escolas que não são clientes da empresa também estão pedindo para usar o Plurall, dizendo que irão se converter para parceiras para o ano que vem. Se por um lado o impacto do Covid-19 trouxe toda uma mudança, por outro lado abriu a oportunidade de escolas de fora da Somos aderirem à parceria da escola digital.
E notem que interessante: a plataforma da Vasta está como a quarta mais baixada na App Store na parte de educação.
Indo para uma parte mais operacional, a geração de caixa pós Capex foi muito boa, crescendo 30%.
Além disso, a companhia está com um endividamento em um patamar razoável após o follow-on de fevereiro, no qual levantou R$ 2,6 bi.
Considerando o que ela captou, a relação Dívida Líquida/Ebitda fica em torno de 1,9x. Além disso, ela pode usar parte dessa captação para possíveis M&A, ainda mais em um momento como este.
Passando rapidamente pelo Ensino Básico, essa vertical apresentou outro bom resultado. Não vou ficar adentrando muito, se não, não saímos do lugar (rs).
MEU OUTLOOK COGN3
Sabemos que a companhia não entregou um resultado bom, sabemos que o cenário macro e interno continuam desafiadores e sabemos que o Covid-19 trará algum impacto para a companhia.
Mas vamos ser sensatos: a companhia, antes do vírus, estava sendo negociada entre 11 e 12 reais. Se fossemos levar consideração o resultado e a queda de 19% que as ações tiveram hoje (31), era factível que ela estivesse negociando a 8 ou 9 reais, por assim dizer.
Entretanto, isso não é a realidade. O papel está negociando a 4 reais e não sabemos o impacto real que o vírus vai trazer especificamente para esta companhia. Mas alguém acredita o Ebitda vai ser negativo? Historicamente não foi, até em crises como 2008 e a de 2013 a 2016. O prejuízo vai ser 2x ou 3x maior que este ano? Acho difícil também.
Para esses fatos acima ocorrerem, a companhia teria que, no mínimo, ficar fechada até o final do ano, ou pior, o país teria que ficar em lockdown até o final de setembro. As chances de isso ocorrer são grandes? Acho meio difícil… Não quebraria só a Cogna, mas quase todas as outras companhias do país (rs).
Digo isso sabendo que os alunos que se matricularam agora (Ensino Superior) já garantem receita até junho. Julho a dezembro é que precisa ser monitorado mais de perto. Agora, no Ensino Básico, os alunos matriculados geram receita até dezembro.
Como dito anteriormente também, a Cogna também não parou - continua com suas aulas 100% online e com outras escolas não parceiras querendo aderir às suas plataformas (vida longa à VASTA).
Cogna vai sofrer, como todas as outras companhias estão sofrendo na bolsa, e deve ficar na mediana em relação aos impactos.
Diante disso, temos uma companhia que passa por uma transição, tentando adentrar cada vez mais em Educação Básica. Gera um ótimo caixa operacional pós CAPEX, o ACV que geralmente começa em março, começou em fevereiro e já apresenta bons resultados.
Para quem não lembra do ACV, brevemente uma definição:
O Valor do Contrato Anual da plataforma K12 (plataforma com conteúdo físico e digital, PNLD, treinamento de professores, dentre outros) e ele é a receita média anualizada dos contratos do cliente. O ACV é uma métrica que pode ser usada em conjunto com o custo de aquisição dos clientes para ver quanto tempo leva para se pagar o custo de aquisição dos clientes e também serve de proxy para a receita anual da Vasta/Somos.
Dívida Liq/Ebitda em um patamar saudável, não tem nenhuma amortização importante para atrapalhar 2020. Possíveis M&A por conta do cenário que o vírus trouxe. Adiamento do IPO da Vasta não é cancelamento! Uma hora saí, paciência.
Por fim, eu tenho que me apegar ao valuation também, que no caso da Cogna se mostra muito atrativo (mesmo revisando Ebitda e Earnings para baixo):
Os múltiplos abaixo da média do setor e o desconto considerável em cima do seu valor patrimonial me deixam confortáveis com o ativo. Cogna deveria valer (na minha opinião) pelo menos uns 8 ou 9 reais pós este último resultado.
Acredito que a companhia tem potencial para vale mais do que isso e chegar em targets maiores, mas de fato precisa entregar um resultado operacional melhor.
Era isso, valeu!