O Bradesco (SA:BBDC4) apresentou seu resultado do 2T20 e acho que todos sabíamos que não seria “bom”. Mas não foi ruim, longe disso. Achei um resultado forte em alguns pontos e continuo achando um case bem interessante. Se alguém me perguntar, foi um resultado “ok” caminhando para o bom.
Eu já tinha comentado no 1T20 sobre o case e se deveríamos ficar preocupados. Mais uma vez venho comentar e frisar, na minha humilde opinião, que não.
Caso queiram saber mais do que eu escrevi no 1T20, basta clicar no link.
O QUE O BANCO TEM FEITO?
Irei comentar algumas coisas que o banco tem expandido para passar pelos desafios da crise.
O Bradesco aumentou o número de colaboradores no home office, que passou de 90% para 94%. Porém, manteve os mesmos 50% de pessoal nas agências. Manteve também o PNC (Plano de Continuação de Negócios), logo, cerca de 96% das transações continuam acontecendo pelo meio autosserviços e assim a roda não parou de girar.
As agências em localidades onde ainda é permitido abrir estão com suas funcionalidades normalizadas. Mantiveram as equipes de recuperação de crédito 100% ativas, focadas na busca de soluções para os clientes que necessitarem. Esse é um ponto importante, uma vez que ela teve que fazer uma provisão muito grande, o jeito vai ser tentar recuperar todo e qualquer tipo de crédito.
E falando dos clientes também, expandiram a ajuda:
Pessoa Físicas: antes a prorrogação tinha sido de 60 dias e passou para 120 dias. Unificaram as linhas de empréstimos com um novo contrato, com primeira carência em até 90 dias e prazo em até 6 anos. Crédito Reorganização Financeira, que permite ao cliente negociar os empréstimos e limites de conta em uma única operação (facilitando a vida de todo mundo). Recursos novos com condições especiais e renegociação de dívidas com clientes que estavam atrasados a mais de 90 dias, agora passaram a ter até 120 dias para começar a pagar e um prazo de 6 anos.
Pequenas e Médias Empresas: Continuou o financiamento da folha de pagamento por meio do programa PESE. Prorrogação para até 120 dias (antes 60 dias) do pagamento das parcelas de empréstimos e financiamentos para clientes em dia ou atraso com até 59 dias com taxa de juros mantida do contrato original. Reorganização Financeira para reorganizar os empréstimos, financiamentos e limites de conta em uma única operação, facilitando o controle do orçamento. Recursos novos e capital de giro FGI (Fundo Garantidor de Investimentos) administrado pelo BNDES.
Grandes Empresas: antes era só linha de crédito para capital de giro e prorrogação em até 60 dias do pagamento das parcelas de empréstimos e financiamentos. Agora, é financiamento da folha de pagamento, prorrogação em até 120 dias para pagamentos das parcelas.
Antes que muitos comecem a pensar: “Mas isso está ficando complicado para o banco. Tendo que dar tanto tempo e fazer tantas coisas, isso não pode acabar bem”. Pessoal, errado iria dar se o banco não fizesse nada, a crise e o isolamento social afetaram todos os setores e o setor que financia a economia não poderia ter dado outra resposta.
Vamos ao que interessa.
MAIS PROVISÃO
De cara já da para perceber que foi quase a mesma história do 1T20. Uma provisão gigante de R$ 8,8 bilhões que acaba por destruir o resultado da companhia quando chegamos no bottom line.
Mas notem o que eu marquei em vermelho: ROAE (Retorno Anualizado Médio) ficou em 11,9%, queda de 8,7p.p. vs 2T19. Porém, ficou estável e teve um leve crescimento frente ao 1T20, o que pode me indicar que não houve deterioração maior que no 1T20 (o que é muito bom).
Lucro Líquido caiu 40% vs 2T19 por conta de uma PDD maior, mas a Margem Financeira (que no caso é a receita do banco) cresceu 15% vs 1T19, com receitas de seguros/previdência/capitalização crescendo 5% vs 1T19 e quase 29% vs 1T20.
Total de Ativos também cresceu 11,3% vs 1T19, com destaque tanto para PF quanto para PJ que cresceram a níveis satisfatórios para uma pandemia e fizeram com que a carteira de operações de crédito encerrasse o trimestre com 15% de crescimento em relação ao mesmo período anterior.
Vamos olhar com mais detalhe para ver se realmente houve uma piora por incompetência do banco ou se foi simplesmente pelo fato de ele ter feito uma provisão realmente grande.
Já fiz questão de marcar em vermelho o que realmente impactou, uma PDD maior. Mas, ao mesmo tempo, notem que em azul eu coloquei o crescimento da Margem Financeira, que foi puxado pela melhora da carteira de PJ e das Operações de Seguro, Previdência e Capitalização. Todavia, se você passar olhando linha por linha comparando com o 2T19, você vai perceber que não houve nada de extraordinário que pudesse impactar o resultado além da PDD.
Olhando bem, despesas de pessoal e administrativas caíram, o que é bom. Outras receitas/despesas e despesas tributárias tiveram um aumento, mas nada absurdo. O que realmente pegou foi essa PDD maior.
MAIS PACIÊNCIA
Já que eu entrei na questão do PDD, vamos olhar ela melhor também?
A PDD expandida ficou em R$ 8,9 bilhões no 2T20. Isso quer dizer que acabou e o banco vai ter que arcar com todo esse crédito duvidoso? Claro que não. Como eu disse no 1T20 e volto agora a dizer...
Existe uma diferença entre reserva e provisão na contabilidade. Provisão é dado como algo certo e a companhia já está deixando esse dinheiro preparado para pagar seja o que for. Mas, neste caso dos bancos, ainda não aconteceu e a provisão é mais uma reserva… Isso acontece pelo seguinte motivo.
O banco lança o que seria o “risco real” de um calote acontecer, mas esse lançamento pode ir mudando com o passar do tempo. De forma bem rápida e resumida, parte desse PDD no próximo resultado pode ter sido pago ou renegociado, logo, ele volta para a DRE como “Recuperação de Crédito”, o que é positivo para o banco. O PDD é uma conta redutora de ativos do banco e, se acontece pagamento pela parte devedora, o PDD é reduzido e volta para o caixa do banco.
Então paciência, pessoal: se o banco fizer um bom trabalho, parte desse PDD pode voltar e nem tudo é o fim do mundo. Notem que desde 2018 o PDD ficava entre R$ 3,5-4 bi e, de repente, por causa da crise causada pela Covid, foi para até 2x mais o que eles provisionavam. Isso não é o “novo normal”, rs.
Para finalizar, vamos olhar para os três indicadores que dizem respeito a inadimplência, cobertura e performance dos seus ativos:
No 1T20, eu disse que isso era algo que me preocupava, pois tinha acontecido uma guinada na inadimplência, o índice de cobertura tinha caído e o NPL Creation tinha começado a subir. Mas parece que minha “preocupação” se provou errada e o banco soube contornar a situação.
Eu fico menos preocupado com a situação, mas temos que ser justos na análise. A inadimplência caiu porque o banco agiu e proveu liquidez, principalmente para as pessoas físicas e para a carteira de micro, pequenas e médias empresas. Isso é ruim? Não, mas também não é algo comum, entendem? Ela teve que prover liquidez para que muitos se readequassem ao novo cenário econômico.
Não acho ruim, acho até necessário, mas achei interessante chamar a atenção. Além disso, o que me chamou a atenção foi a melhora nas ferramentas de recuperação de crédito, com implantação de sistemas com algoritmos apoiados em big data e decisão em “tempo real”, permitindo ao banco reagir quase que instantaneamente às nuances da capacidade de crédito dos clientes. Isso corrobora para que uma recuperação de crédito lá na frente fique cada vez mais real.
O Índice de cobertura subiu para seu ponto mais alto desde março/19 com alta de 71,6p.p. e atingiu 299,5% ao final de junho de 2020. Este índice mede a relação entre reserva financeira e as despesas fixas do banco. Se a inadimplência de 90 dias sobe, isso piora o índice de cobertura, porque dificulta suas condições de manter um padrão de custos. Porém, houve uma melhora... e que melhora.
Finalizando com o NPL Creation, este indicador também teve uma melhora e encerrou em 0,5%. Além disso, no trimestre foram concedidos créditos que estavam em atraso e 100% provisionados, influenciando positivamente o indicador na carteira de pessoas jurídicas.
O NPL nada mais é que um índice que mede os “ativos não produtivos de juros” do banco, são empréstimos ou financiamentos que não são honrados. Esse índice também piora com o aumento da inadimplência e diz respeito aos ativos da companhia, pois empréstimos e financiamentos são onerosos para o banco.
MEU OUTLOOK PARA BBDC4
Continuo concordando que o cenário é desafiador e não tão claro ainda. O banco deve continuar tendo provisões grandes até o final do ano. Entretanto, estou começando a ver com outros olhos o case.
Eu comentei anteriormente que a recuperação de crédito já conta com ferramentas de big data em praticamente tempo real. Essa implementação de tecnologia não está sendo vista só neste vetor do banco…
É “tech” que vocês queriam? Para os críticos que diziam que os “bancões” seriam massacrados pelas “fintechs”. Nada como uma tempestade para te tirar da zona de conforto, não é mesmo?
O crescimento de usuários em mobile, transações mobile e abertura de contas mostram que o Bradesco não está a fim de ficar para trás. E digo mais, uma vez que muitas pessoas começam a se acostumar com o aplicativo, ela começa a entender que muitas das suas necessidades podem ser sanadas por ali e que não há necessidade de ir a uma agência.
É um trabalho lento e demorado, mas vai acontecendo, logo mais poderemos ver uma diminuição de agências e um crescimento maior nos aplicativos. Fica a reflexão.
Por fim, seus valuation continua atraente:
Olhando para 2021 vejo Bradesco negociando 9x Lucros e 1,3x P/VPA com um ROE de 15%. Quando olhamos para uns 6 meses atrás, essa relação entre preço e valor patrimonial estava em quase 2x… Bradesco não é o único banco descontado, mas continua com queda de 30% no ano. Operacionalmente, eu o enxergo como um dos melhores.
Hoje me parece continuar fazendo sentido pelo desconto em seus múltiplos ficar exposto aos bancos, mesmo que o carrego seja chato (e está sendo para alguns, rs). São setores mais defensivos também quando olhamos para crise, eles sofrem, mas tendem a sofrer bem menos que outros setores.
Inclusive, historicamente seu P/L fica na média de 11,8x e o seu P/VPA histórico dos últimos 10 anos continua abaixo de 1 desvio-padrão.
Logo, vejo que Bradesco tem condições de negociar na faixa dos R$ 30 reais (faixa azul da minha tabela).
Era isso, valeu!