“O resultado direto e legal da consciência é a inércia, isto é, o ato de ficar conscientemente sentado de braços cruzados. Já aludi a isso há pouco. Repito, repito com insistência: todos os homens diretos e de ação são ativos justamente por serem parvos e limitados. Como explicá-lo? Do seguinte modo: em virtude de sua limitada inteligência, tomam as causas mais próximas e secundárias pelas causas primeiras e, deste modo, se convencem mais depressa e facilmente que os demais de haver encontrado o fundamento indiscutível para a sua ação e, então, se acalmam; e isto é de fato o mais importante. Para começar a agir, é preciso, de antemão, estar de todo tranquilo, não conservando quaisquer dúvidas. E como é que eu, por exemplo, me tranquilizarei? Onde estão as minhas causas primeiras, em que me apoie? Onde estão os fundamentos? Onde irei buscá-los? Faço exercício mental e, por conseguinte, em mim, cada causa primeira arrasta imediatamente atrás de si outra, ainda anterior, e assim por diante, até o infinito.”
É Dostoiévski, mas poderia ser Sextus Empiricus, nossa espécie de alma-mater, expoente do ceticismo pirrônico, para quem qualquer argumento carrega um contra-argumento de igual magnitude.
Este Day One poderia ser uma defesa da humildade intelectual e da inação. Talvez seja.
“The train of thought… (o trem do pensamento)” Há uma conversa imaginária que, em momentos como o atual, vem me visitar.
Warren Buffett exclama: “a diversificação é a arma daqueles que não sabem o que estão fazendo.” Ao que, na minha imaginação, Nassim Taleb responde: “pois então vamos mesmo diversificar, porque, na maior parte das vezes, nós não sabemos mesmo.”
Beirando o niilismo, o homem do subsolo de Dostoiévski nos lembra que somente a consciência limitada pode nos empurrar a uma determinada ação muito convicta, concentrada, alavancada.
Há inúmeras incertezas no horizonte. Depois do rali dos ativos de risco desde julho, em um dos maiores short squeezes da história, o que acontece agora?
Se é razoável supor que a inflação continuaria caindo e pavimentaria para uma expansão adicional dos múltiplos lá fora por conta do prognóstico de juros menores, é igualmente pertinente a visão de que as estimativas para os lucros precisariam cair, dada a hipótese de recessão.
E se Bolsonaro vem se tornando mais competitivo, o que tem alimentado os ativos de riscos brasileiro, incorremos em paralelo na possibilidade de uma vitória bastante apertada do ex-presidente Lula, renovando o temor do “Banana Republic Effect” ou chance de terceiro turno, com elevada contestação das eleições e mais volatilidade à frente.
O tal medo de ficar de fora virou quase um clichê das finanças comportamentais. O sujeito vê o cunhado ganhando dinheiro e, como um homem de ação vendo as “causas primeiras”, se joga na direção da Bolsa. Então, dispara contra si o risco de ser atingido por um dos erros de consequências mais substanciais, que é o overtrading, o excesso de mudança de posições que lhe empurra para comprar caro e vender barato, desafiando as noções elementares de finanças.
Ele vê as ações caindo e o CDI aumentando. Então, para interromper aquela dor psicológica, acaba saindo da renda variável para comprar um bom CDB. Vendeu na queda e, portanto, barato. Então, observa, num período posterior, as bolsas se recuperando. Quer participar da festa também. Aí, depois da alta, volta para bolsa, pagando mais caro, possivelmente na iminência de uma nova correção dos preços.
No "buy and hold” (compre e segure), você ganha dinheiro no “hold" (segurando) e não no trading.
Acho prematuro para sacramentarmos vitória sobre a inflação e/ou sobre uma eventual recessão global à vista, o que exigiria valuations comprimidos. O risco de estarmos, sobretudo lá fora, apenas diante de um bear market rally, ou seja, de um rali em meio a uma tendência de baixa mais ampla, existe e não pode ser desprezado.
Isso não significa necessariamente pessimismo generalizado, um argumento para corrermos para as montanhas ou qualquer coisa assim. Há vários ativos brasileiros com preços bastante convidativos e que aguentam desaforo. A resposta continuará sendo uma carteira devidamente diversificada, com proteções e sob a âncora de valuations suficientemente descontados.
Cosan (BVMF:CSAN3) negocia a 8x lucros para 2023, com um portfólio diversificado, uma gestão comprovadamente competente e com histórico impecável de alocação de capital. BTG Pactual (BVMF:BPAC11) está a 11x lucros, crescendo 30% (disclosure de sempre, talvez desnecessário a esta altura: estou obviamente conflitado neste caso). Banco do Brasil (BVMF:BBAS3) paga dividendos superiores a 10% ao ano, negocia abaixo do book e a 4x lucros.
Ao mesmo tempo, a renda fixa nos oferece a oportunidade de rentabilizar nossa carteira a um juro real próximo a 6% ao ano. Bonitos por natureza e abençoados pelo juro real de 6%.
Na dúvida entre a Bolsa e a renda fixa, fique com os dois.