Este artigo foi escrito exclusivamente para o Investing.com
- Coinbase é notificada pela SEC, comissão de valores mobiliários dos EUA
- Presidente da SEC é especialista em tecnologia financeira
- Proteger o público ou defender o status quo?
- Dinheiro: a fonte de poder
- Regulação deve aumentar; bifurcação no horizonte
A regulação é um assunto espinhoso para os ativos globais e os mercados onde são negociados. Antes da crise financeira de 2008, a regulação nos mercados de commodities não era o que é hoje. Os mercados futuros estavam regulados, e operadores americanos tinham que ter cautela ao atuar no exterior.
A Lei de Práticas Corruptas no Exterior de 1977 proíbe cidadãos e empresas americanas de oferecer propina a autoridades governamentais estrangeiras para obter benefícios comerciais. A lei deixou em desvantagem os operadores de commodities e produtores de matérias-primas dos EUA em relação a outros países.
Não existe separação entre governo e produção de commodities em muitos países. Portanto, a única forma de fazer negócios nessas áreas era violando a lei ou deixando os negócios nas mãos de outros players, principalmente a China.
A Lei Dodd-Frank endureceu a regulação além do mercado futuro, abrangendo as operações físicas e outras transações. Nos últimos meses, vários operadores foram multados ou condenados por prática de spoofing, além de outras violações envolvendo crimes de colarinho branco.
A abrangência regulatória se expandiu nas últimas décadas. É apenas uma questão de tempo para que isso também se aplique ao emergente mercado de criptomoedas. Além disso, as criptos representam uma ameaça à principal fonte de poder governamental: a oferta monetária.
Nossa expectativa é que a regulação do setor avance nos próximos meses e anos. Quanto mais subir a capitalização de mercado das criptos, mais rápido aparecerão as regras. Acabamos de testemunhar o que pode ser a primeira iniciativa nessa direção, quando a SEC, comissão de valores mobiliários dos EUA enviou à Coinbase (NASDAQ:COIN) um alerta contra a implementação de um produto envolvendo criptoativos.
Coinbase é notificada pela SEC, comissão de valores mobiliários dos EUA
Em 7 de setembro, quando El Salvador oficialmente adotou o bitcoin como sua moeda nacional, o preço da criptomoeda líder atingiu seu pico mais recente, antes de reverter para baixo.
Fonte: CQG
Como mostra o gráfico diário do bitcoin futuro, seu preço disparou até a máxima de curto prazo de US$53.125, onde reverteu e caiu até a mínima de US$43.704, formando um padrão de reversão baixista no gráfico diário e semanal em 7 de setembro. O bitcoin continuou em baixa e tocou a mínima de US$43.310 em 13 de setembro.
Uma das razões para a desvalorização de 18,5% do bitcoin em 7 de setembro foi o fato de a Coinbase, principal exchange de criptomoedas, ter recebido uma notificação da SEC, ameaçando processá-la por causa do seu programa Coinbase Lend. Esse programa permite que titulares de criptomoedas as emprestem a outros participantes do mercado, criando um rendimento ou taxa de juros para o bitcoin e outras criptos oferecidas na exchange.
A notificação alertou a Coinbase de que a companhia deveria pensar duas vezes antes de implementar o programa Lend. Seus efeitos, no entanto, transcendem a Coinbase e atingem todo o criptomercado.
Presidente da SEC é especialista em tecnologia financeira
O presidente da SEC, Gary Gensler, é ex-presidente da Comissão de Negociação de Futuros de Commodities. Durante seu mandato, ele permitiu que a CME e outras bolsas listassem os contratos futuros de bitcoin em dezembro de 2017. Embora a listagem tenha ocorrido após sua passagem pela CFTC, a solicitação foi submetida a ele. Como presidente da CFTC, Gensler pareceu abraçar a tecnologia financeira e a revolução das criptomoedas.
Antes de ser indicado à chefia da SEC, Gensler lecionou no Instituto de Tecnologia de Massachusetts. O assuntou foi justamente a fintech. As criptomoedas e a blockchain formam a essência da evolução da revolução da fintech.
Alguns participantes do mercado, logicamente acreditaram que a SEC, sob a presidência de Gensler, beneficiaria as criptos. No entanto, uma agenda política pode estar atrapalhando a evolução e aceitação da fintech.
Proteger o público ou defender o status quo?
A SEC e outros poderes em Washington declararam que desejam proteger o público contra um criptomercado desregulamentado. Muitos citam os usos nefastos das criptomoedas, inclusive sua utilidade para hackers que usam ransomware para atacar sistemas nos EUA e ao redor do uso.
Em 2021, já vimos invasões a sistemas da Colonial Pipeline e da maior processadora de proteína animal dos EUA. O governo dos EUA expressou a preocupação de que as criptos permitam que forças criminosas operem além do seu alcance, criando riscos para empresas e indivíduos.
O primeiro míssil regulatório foi lançado sob o pretexto de “proteger o público”. No entanto, trata-se mais de uma defesa do status quo.
Dinheiro: a fonte de poder
Todos já ouvimos falar que o “dinheiro é a raiz de todo o mal”, que vem de uma passagem bíblica, que diz que o amor pelo dinheiro é a raiz de todo o mal.
Para os governos, o dinheiro é a fonte do poder. A capacidade de expandir e contrair a oferta monetária se tornou muito mais fácil após o abandono do padrão-ouro. Durante a crise financeira global de 2008 e a pandemia de 2020, os governos expandiram drasticamente a oferta monetária para estabilizar a economia.
Se as criptomoedas vierem a substituir as moedas fiduciárias, limitariam ou acabariam com a capacidade governamental de enfrentar tais eventos usando a política monetária. Ideologicamente, a revolução das criptos é um desafio ao controle governamental sobre o dinheiro, na medida em que a emergente classe de ativos incorpora a filosofia libertária que busca devolver aos indivíduos o poder pertencente aos governos.
É ingênuo acreditar que os governos abrirão mão da oferta monetária. Na semana passada, o famoso gestor de hedge fund, Ray Dalio, disse o seguinte sobre o bitcoin e órgãos reguladores:
“Acredito que, no fim do dia, caso as criptomoedas tenham sucessos, as autoridades vão querer acabar com ele. E elas têm meios para tanto”.
Regulação deve aumentar; bifurcação no horizonte
Minha expectativa é que haja uma grande bifurcação nas criptomoedas, à medida que crescem as pressões regulatórias sobre o criptomercado. Não há dúvidas de que a tecnologia blockchain tem utilidade e aceitação geral. Já os tokens, nem tanto.
As criptomoedas estão no primeiro nível da escala de risco e devem receber o tratamento regulatório mais intenso. Bitcoin e ethereum, por seu papel de liderança, inserem-se nesse contexto. As moedas estáveis lastreadas em ativos reais e as moedas digitais emitidas pelos governos devem operar com um regime regulatório muito mais brando.
Eu considero que o alerta emitido pela SEC à Coinbase é o primeiro movimento regulatório no jogo de xadrez que se desenvolverá nos próximos meses e anos. O maior anseio dos governos é que as criptomoedas acabem a cada correção de mercado.
Mas elas sempre emergem mais fortes e atingem novas máximas, o que deve fazer com que entrem na mira de órgãos reguladores. Como a capitalização de mercado geral das criptos é de um pouco mais de US$2 trilhões, elas não oferecem qualquer risco sistêmico, mas a história muda caso superem uma marca expressiva, como US$10 trilhões.
Esses mísseis regulatórios devem gerar ainda mais volatilidade. A aceitação do mercado de criptos continua crescendo, mas os governos estão ideologicamente do outro lado do argumento.
O dinheiro é a fonte do poder, já que o controle do orçamento é um elemento crucial. Não espere que os governos ignorem a ameaça das criptos caso sua capitalização continue crescendo.