A Fitch está fazendo uma aposta ousada na China e no cobre. Mas os gráficos de Wall Street e do metal vermelho contam uma história diferente neste momento.
As fortes quedas que as ações e os mercados enfrentaram pela segunda vez nesta semana, comparáveis apenas à “Segunda-Feira Negra” de 1987, fizeram com que todos se esquecessem da aposta feita pela Fitch de que haveria um repique no cobre nos próximos meses, graças ao plano chinês de promover uma reativação econômica agressiva por causa do coronavírus.
Ao revisar seu preço-alvo do cobre em 2020 para US$ 5.900 por tonelada, em comparação com a previsão anterior de US$ 5.700, os analistas da Fitch acreditam que o aumento do estímulo do governo chinês em breve fluirá para projetos de infraestrutura, impulsionando a demanda de cobre tão necessária para reconstruir a segunda maior economia do planeta.
Os analistas afirmaram que esperam que a maioria dos centros industriais e cadeias de fornecimento fechados na China sejam liberados das atuais restrições relacionadas à pandemia até abril, preparando o caminho para uma elevação da demanda de cobre no final do ano.
Lógica vs. dinâmica de mercado
Parece lógico relacionar a iminente retomada do maior país comprador de commodities do mundo com o metal mais utilizado na indústria.
Mas havia um problema com a perspectiva da Fitch: ela foi publicada na última sexta-feira, horas antes do colapso das tratativas entre Rússia e Arábia Saudita, que visavam expandir seu acordo com a Opep+ para a realização de cortes de produção. A expectativa era que essas tratativas conseguissem elevar os preços do petróleo. Em vez disso, o fracasso nas conversas fez com que Riad, enfurecida, inundasse o mundo com todo o petróleo que pudesse, a fim de aumentar sua participação de mercado.
Os preços do petróleo derreteram 25% na segunda-feira, em sua pior queda em quase 30 anos, em razão da promessa saudita de gerar excesso de oferta. A liquidação no petróleo acabou influenciando as ações, que já haviam sido atingidas pela crise do coronavírus, fazendo Wall Street entrar em “bear market”.
No caso do cobre, o contrato com vencimento em três meses na Bolsa de Metais de Londres fechou a US$ 5.631,75 por tonelada na sexta-feira. Mas, na quinta, havia perdido mais de US$ 190, e no início do pregão desta sexta-feira na Ásia, girava em torno dos US$ 5.450. Só isso já faz com que a cotação do metal esteja US$ 500 abaixo do alvo da Fitch.
Gráficos do cobre não estão nada bons
“Geralmente, ao se discutir a probabilidade de uma recessão iminente e suas implicações nos mercados futuros, é comum ouvir sobre os spreads dos títulos do tesouro e as curvas de juros”, declarou Eric Scoles, estrategista de commodities na RJO Futures, em Chicago.
“No entanto, o aspecto mais importante no cobre para mim tem a ver com os gráficos” explicou Scoles, referindo-se aos gráficos de preço para os futuros do cobre negociados em Nova York, que, segundo o analista, apresentavam um grande padrão baixista de ombro-cabeça-ombro desde novembro de 2016 até os preços atuais. O mês de novembro de 2016 é crucial, pois foi quando o cobre negociado em Nova York atingiu a mínima anterior de US$ 2,20 por libra, em comparação com o fundo de US$ 2,40 desta semana.
“Como o cobre representa construção e indústria, sua demanda está fortemente correlacionada com a expansão econômica e o crescimento global”, declarou Scoles.
O analista complementou:
“Se o desenvolvimento desse padrão gráfico indicar a possibilidade de os preços do cobre caírem drasticamente por um longo período, não acredito que será por causa de uma explosão na produção do metal, mas devido ao encolhimento da demanda. Se a expansão econômica é capaz de aumentar a demanda e impulsionar os preços dessa commodity, uma recessão pode fazer sua cotação despencar”.
Apesar de suas credenciais como o metal líder mundial na indústria, os preços do cobre foram os que mais sofreram nas últimas duas décadas.
As estatísticas do Banco Mundial mostram que, embora a economia mundial tenha crescido 30% de maneira composta entre 2009 e 2019 – ou uma média de 3% ao ano – o cobre se desvalorizou 15%, deslizando de US$ 3,33 para US$ 2,83 por libra no mercado futuro norte-americano.
A China sozinha seria capaz impulsionar o cobre e o mundo?
Em sua perspectiva na última sexta-feira, os analistas da Fitch disseram esperar que a China amorteça o impacto da disseminação do coronavírus tomando medidas agressivas de estímulo, capazes de manter o objetivo Pequim de dobrar o PIB do país até o fim de 2020 a partir do seu nível em 2010.
O plano de estímulo chinês, que prevê projetos de infraestrutura e cortes tributários em benefício de setores vulneráveis, aumentará a demanda de cobre, segundo eles, elevando os déficits do metal nos setores automotivo e energético, o que também deve manter o suporte dos preços durante 2020.
A China já está se recuperando rapidamente da pandemia do que o resto do mundo, com apenas 21 novos casos e 8 mortes registradas na quinta-feira, em comparação com centenas de novas infecções e dezenas de fatalidades por dia nas primeiras semanas.
Mas será que a China sozinha será capaz de nos salvar de uma recessão, se houver uma desaceleração do crescimento no resto do mundo – principalmente nos Estados Unidos?
“Possivelmente”, afirma uma análise do Financial Times nesta semana, que ressalta a determinação da China de não deixar o coronavírus criar o primeiro trimestre de crescimento zero ou negativo desde que a revolução cultural de Mao Zedong.
Destacando a incrível recuperação do trabalho em andamento na China, o FT citou como exemplo o distrito de Qian’an em Tangshan, centro industrial localizado a leste de Pequim, na província de Hebei, que produz cerca de 10% do {{996702|aço} do país e foi uma fonte crucial do metal para os mercados mundiais.
“Os caminhões entram em Qian’an carregando carvão e minério de ferro e saem carregados de aço”, informou o FT.
“Se as fábricas do distrito conseguirem aumentar a produção rapidamente – à medida que as ações extremas para conter a epidemia de coronavírus na China são afrouxadas – é bastante possível que o curto e intenso choque à segunda maior economia do mundo desde janeiro possa muito bem ser seguido de um repique no segundo trimestre, formando a famosa "recuperação em formato V".
E não é apenas um repique na atividade industrial que está se configurando.
A Apple (NASDAQ:AAPL) anunciou na quinta-feira que reabriu todas as suas 42 lojas na China, que haviam sido fechadas no mês passado devido à pandemia. Para os observadores da China, a lição a ser tirada foi clara: o terceiro maior mercado da Apple estava de volta aos negócios. Isso só poderia significar uma coisa: a recuperação está tomando corpo.