É fato que a imprensa internacional declarou Joe Biden no sábado como vencedor das eleições americanas de 2020, concorrendo contra a reeleição de Donald Trump. Também é fato que o presidente Trump está questionando o resultado sob alegação de fraudes em diferentes localidades, pedindo recontagem de votos em outras tantas, na tentativa de mudar os resultados até aqui apurados.
Também é fato que inúmeras lideranças de países democráticos já reconheceram a vitória de Biden, independente dos questionamentos que possam existir e da demora que possa ocorrer para a declaração do vencedor oficial. Lideranças da Europa e latino-americanas, o vizinho Canadá, boa parte do mundo árabe e até o inimigo da hora, o Irã.
Em declaração de 9/11, o vice-presidente Mourão disse que o presidente Jair Bolsonaro reconheceria a vitória no tempo certo. Mas que tempo certo é esse, se até aqui ele cerra fileira em não cumprimentar Biden, juntamente com a Coreia do Norte, Rússia e China, expoentes do mundo comunista? Seria isso o certo? Bem que o presidente poderia cumprimentar Biden e, eventualmente, até fazer alguma ressalva sutil para o fato de amanhã os resultados serem modificados, situação que ninguém além de Trump e o estreito grupo de apoio acredita. Até mesmo uma boa parte da ala dos republicanos pressiona Trump para aceitar o resultado e deixar de enlamear a democracia americana com as denúncias de fraude.
Enquanto essa situação não se decide peremptoriamente, os investidores já adotaram Biden como o novo presidente, e os mercados reagem desde a semana passada positivamente. Nesta segunda-feira, a reação dos mercados por todo o mundo foi inequívoca.
A expectativa reinante é que Biden será mais suave e menos emocional em suas declarações, fazendo valer a crença no multilateralismo, ao invés do isolacionismo de Trump. Também será mais previsível em sua postura, ao invés da imprevisibilidade, ciclotimia e twitters polêmicos de Trump. Mas, certamente será pressionado por alas mais à esquerda de seu partido. A sorte é que a economia americana é como se fosse um grande transatlântico, cujas manobras, no geral, são lentas e os efeitos também.
Mas Biden já vem deixando claro há alguns meses que pretende revogar algumas decisões de seu antecessor, notadamente em temas como a contenção da contaminação pela covid-19 (nesse final de semana, em 24 horas, o recorde foi de mais de 120 mil contaminados), preservação do meio ambiente, a reinclusão no acordo de Paris sobre meio ambiente, Amazônia e também com empresas ESG (aquelas que possuem compromisso com a sustentabilidade ambiental, econômica e social).
Isso posto, o Brasil terá que mudar seu discurso perante o mundo para não ficar isolado de quase todo o planeta e ser deixado de lado pelos investidores. Querem um exemplo? O acordo entre a União Europeia e o Mercosul foi barrado exatamente por conta da postura brasileira na preservação do meio ambiente. Com razão ou sem (visão de Bolsonaro) é certo que isso aconteceu.
O nosso risco (Brasil) seria de, ao ficar isolado politicamente, que o presidente opte por reforçar a vertente contrária e adote políticas populistas para tentar buscar mais claramente a reeleição. Isso seria fantasticamente danoso para os ajustes essenciais na economia pós-pandemia, nos colocar no radar dos investidores internacionais e conseguir crescer de forma acelerada, reduzindo endividamento e tornando o país mais eficiente. Isso só será alcançado com reformas de vulto, redução do tamanho do Estado, marcos regulatórios factíveis, três poderes uníssonos e motivados por questões nobres e uma diplomacia eficiente e sem deixar que dogmas interfiram nas negociações entre Estados. Mas para que tudo isso ocorra, o presidente terá que estar à frente de tudo.
Os próximos meses serão cruciais para avaliar a direção tomada pelo governo brasileiro e definirão como será a vida dos brasileiros nos próximos anos.
Quem sabe faz a hora e não espera acontecer!
Alvaro Bandeira é sócio e economista-chefe do banco digital modalmais