Na macroeconomia dos anos 70, havia a tendência de modelos cada vez maiores serem utilizados para previsão. Pegariam-se dados do passado e, sem muita modelagem além da puramente estatística, eles seriam projetados para o futuro. Essa econometria básica tem utilidades e, muitas vezes, levam a conclusões extremamente úteis desde que haja uma investigação cuidadosa das premissas dos modelos. É difícil abrir uma edição do American Economic Review sem ver modelos lineares bem aplicados. Mesmo se tratando de séries de tempo, técnicas de previsão do tipo não costumam falhar em fenômenos simples e de natureza linear, e às vezes se aplicam na economia e no mundo das finanças.
Infelizmente, isso não serve para fenômenos mais complexos. Robert Lucas, da Universidade de Chicago, fez uma crítica que avaliar relações históricas entre variáveis não faz sentido quando a estrutura histórica muda. Se há alguma quebra na estrutura, como usar um modelo anterior para prever algo? De maneira geral, para se prever bem algo, não basta apenas modelar o fenômeno, precisamos saber também quando nossa previsão quebrou e deve ser ignorada.
Quando há uma variação gigantesca no preço, devemos saber se o modelo usado anteriormente ainda têm a capacidade de gerar essas variações. Em geral, por se tratar de modelos probabilísticos, sempre há uma possibilidade, mas será que essas variações gigantescas deveriam ocorrer tanto nesse framework? Nisso, toda quebra estrutural impõe a seguinte pergunta: “será que meu modelo faz sentido?”. Mesmo que ele acerte por algum motivo, ele seria capaz de explicar a realidade? Se não, quem garante que um dia ele explicará o fenômeno?
Mesmo modelos não estatísticos sofrem desse problema. Vamos supor que usamos análise técnica. Se testamos diversos indicadores, há pouco que prove que não simplesmente escolhemos o que deu mais certo no passado. Sem considerar fatores estruturais mudando, possivelmente eles darão certo. Caso uma mudança estrutural ocorra, não temos como garantir isso. Uma série de livros de análise técnica já tem incorporado testes para tornar modelos robustos a isso (por exemplo, ver esse livro). De maneira geral, compreender a realidade é fundamental para o trader e não podemos esquecer disso em qualquer mercado que operemos.
Nessa semana, a volatilidade voltou a atingir o mercado de criptomoedas. Contudo, esse mercado é movimentado majoritariamente por saltos, positivos e negativos. Pouquíssimos dias são responsáveis pelos maiores retornos, de acordo com o levantamento do Thomas Lee, da Fundstrat Global. Não temos como prever normalmente esse tipo de variação. Esses choques podem representar ou levar a quebras estruturais e, quando vemos uma grande variação, devemos pensar “será que somos capazes de saber para onde isso vai? Qual o pico e qual o vale?” Normalmente não sabemos e isso é normal. Devemos aceitar que vivemos sob incerteza e adaptar nossa estratégia para isso.
No fundo, há sempre elementos de sorte numa posição; por isso, devemos permanecer humildes nas possibilidades de trading. Após as grandes variações dos últimos dias no mercado de criptomoedas, há um certo oba-oba sobre retornos fortes e bull markets, mas pode haver saltos negativos análogos na espreita. Se o modelo de um trader sobre como o mercado funciona é falho, certamente ele sofrerá com surpresas. Há choques estruturais constantes no nosso mercado e elas não contam com explicações. Um bom modelo deve se provar robusto a esses choques e, por vezes, isso implica em posições menores em momentos de grande incerteza. Variar fortemente de acordo com o mercado não é necessariamente motivo para comemorar, é apenas fazer o que todo mundo faz quando aposta no mercado sem entender o que se passa.