É amplamente acordado que adeptos do Value Investing devem agir contra a maré, comprando enquanto a multidão vende e vice-versa, aproveitando as flutuações do mercado de maneira racional. Chamaremos as pessoas que agem contra o fluxo de “contrariadores”.
Claramente é fácil falar sobre a necessidade de se comportar como um contrariador no mercado de ações, no entanto, é muito difícil colocar em prática.
É importante salientar, portanto, que existem inúmeras características dos seres humanos que nos empurram para uma conformidade, afastando pensamento individual, prejudicando o raciocínio independente.
É bastante perceptível, e existem vários estudos no campo da psicologia (principalmente nas finanças comportamentais) que mostram como somos influenciados pelo meio externo.
Sobre isso, no livro “The Little Book of Behavioral Investing”, o autor James Montier traz um estudo que pesquisadores fizeram, no qual eles desenham quatro linhas verticais: uma na esquerda como referência, depois, outras três linhas, sendo uma grande, uma do mesmo tamanho da linha da esquerda, enquanto a terceira é a menor de todas.
Os pesquisadores perguntavam qual linha melhor se assemelhava à de referência. O objetivo do experimento era verificar a influência da opinião do grupo sobre o indivíduo.
Quando os indivíduos que participaram da pesquisa faziam o teste individualmente, geralmente observavam que uma linha era muito grande, outra era muito pequena, então, a melhor escolha seria a intermediária que, de fato, “casava” com o tamanho da linha de referência.
No entanto, quando eram colocados outros sete indivíduos (que trabalhavam para os pesquisadores) na sala, todos insistindo que a linha maior era a melhor escolha, o sujeito do teste acabava escolhendo a linha maior também, adotando a conclusão do grupo, embora ela estivesse claramente errada.
Além disso, Montier diz não importar o tamanho do grupo, desde que haja outros três ou mais membros, neste caso (de três membros) uma em cada três pessoas testadas começava a entrar em conformidade com o grupo.
Foram feitos também experimentos similares, porém mapeando as atividades cerebrais dos indivíduos em estudo.
Foi constatado que quando as pessoas concordavam com a resposta do grupo, parecia haver um decréscimo de atividade nas partes do cérebro associadas com o raciocínio lógico. Era como se apenas tivessem parado de pensar.
Como se não bastasse, neurocientistas também descobriram que quando um indivíduo toma um caminho que foi pouco “desbravado”, ele sente medo.
Isso porque o conflito com o grupo estimulou a amígdala – parte do cérebro responsável por processar emoções e medo.
Além disso, notaram estímulos na parte cerebral responsável pela dor física, indicando que fazer algo diferente do grupo gera algo semelhante a uma dor social.
Assim, precisamos investir apesar do medo, uma vez que, segundo Montier: “O princípio central dos investimentos é contrariar as opiniões gerais, baseado no argumento de que se todos concordam sobre os méritos do investimento, então ele é inevitavelmente muito caro e, portanto, pouco atraente”.
Quando um grupo age com muita conformidade, levando a decisões ruins, está se comportando conforme o chamado “groupthink”.
Tal comportamento, segundo Montier, leva à deterioração de eficiência mental, testes de realidade e julgamento moral.
O autor expõe oito sintomas deste comportamento prejudicial:
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Ilusão de invulnerabilidade: otimismo extremo leva a riscos extremos;
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Racionalização coletiva: ignorar avisos e não questionar as principais premissas;
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Crença na moralidade inerente: membros do grupo acreditam que estão certos sempre, ignorando consequências éticas e morais de suas decisões;
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Opiniões estereotipadas de grupos externos: o autor lembra da pressão sobre os administradores que se recusaram a entrar na bolha das “pontocom” (empresas de internet), no final da década de 90;
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Pressão sobre os que não concordam: membros do grupo são pressionados a não expor opiniões que podem minar a credibilidade do grupo;
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Autocensura: membros que se questionam sobre as ideias coletivas mantêm a opinião para si;
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Ilusão de unanimidade: a opinião da maioria é considerada unânime;
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“Guardas mentais”: alguns membros protegem o grupo e os líderes de informações opostas.
Não é difícil notar o quão prejudicial é pensar em conformidade com o grupo.
É importante aprendermos sobre várias visões, e tomar nosso posicionamento individual, sem depender do coletivo.
Trata-se de uma questão de autoresponsabilidade. Tal raciocínio pode ser transferido para vários âmbitos da vida, sobretudo, para o campo dos investimentos.
Sendo assim, podemos extrair três características essenciais dos “contrariadores” que os fazem pensadores críticos:
Primeiramente, coragem para ser diferente.
Michael Steinhardt, gestor de um Hedge Fund que alertou vários investidores para este ponto da coragem disse:
“A coisa mais difícil ao longo dos anos foi a coragem de ir contra a sabedoria dominante da época, ter uma visão diferente do consenso geral e apostar nessa visão”.
Em segundo lugar, a habilidade de ser um pensador crítico. Como Joel Greenblatt disse:
“Você não pode ser um bom investidor de valor sem ser um pensador independente – você está vendo valuations que o mercado não está acreditando. Porém, é crítico que você entenda o motivo do mercado não enxergar tal valor”.
Por fim, seja persistente e atenha-se aos seus princípios. Citando aqui o pai do Value Investing, Benjamin Graham:
“Se você acredita que a abordagem de valor é inerentemente sólida, então dedique-se a este princípio. Atenha-se a isso e não se deixe enganar pelas modas, ilusões e perseguições de dinheiro fácil de Wall Street. Deixe-me enfatizar que não é preciso ser um gênio para ser um analista de valor bem-sucedido, o que ele precisa é, primeiro, inteligência razoavelmente boa; em segundo lugar, princípios sólidos de operação; e terceiro, e mais importante, firmeza de caráter”.
Sendo assim, é importante saber ouvir e aprender com vários pontos de vista, porém, sempre com a capacidade de julgar se aquilo faz sentido de acordo com seus princípios, visando tomar um posicionamento individual que condiz com seus valores. É preciso, portanto, ter auto responsabilidade.