Primeiramente, vamos derrubar alguns mitos
No universo da análise fundamentalista de ações, não é muito difícil encontrar conteúdos sobre as técnicas de análise que te ajudam a descobrir uma boa ação para investir.
Contudo, algo que vai ajudá-lo a identificar um bom momento para comprar uma ação é bem mais raro de se encontrar. Por um bom motivo: sem recorrer à falsa segurança que a análise técnica passa, um bom momento para comprar uma ação, na perspectiva de um investidor fundamentalista, não é algo muito tangível.
Mas antes de falar sobre quais são os três momentos nos quais boas oportunidades de comprar ações costumam surgir, é preciso derrubar alguns mitos:
- Você não vai saber previamente qual ação vai subir mais e colocar todo seu capital nela.
- Você não precisa tentar prever o futuro, precisa apenas ter disciplina para investir somente em ações cujo potencial de valorização supera com folga as incertezas, riscos e até possíveis erros de análise (que vão acontecer na sua jornada de investidor) e ter paciência para aguardar que suas teses de investimento se concretizem.
- Você não precisa estar certo 100 por cento das vezes. Com a estratégia correta, o lucro dos grandes acertos supera em muito o prejuízo nos erros.
- Você não precisa procurar a tacada da vida, mas também não precisa ter medo de errar.
- Ignore completamente a dica quente da corretora (ela não quer o melhor para o seu patrimônio, só quer que você gire a sua carteira), do analista de ações que não é um analista de ações profissional (tenha certeza que um gestor ou “palpiteiro profissional” não te dá uma dica sem ter em mente alguma intenção de benefício próprio) e muito menos a recomendação que o seu vizinho ouviu de alguém que ouviu de alguém, é lógico.
- A análise gráfica ou a avançada análise estatística de preços passados não vai te tornar um investidor melhor.
Como esse é um tema polêmico, permita-me explorar com um pouco mais de profundidade a visão clássica da análise fundamentalista.
Em uma perspectiva de longo prazo, o preço da ação sempre será a média ponderada de todas estimas de valor para ela naquele momento. É o que todos os compradores e vendedores potenciais enxergam de valor, ponderado pelo número de ações que cada um estaria disposto a possuir.
O preço atual é formado de acordo com as informações disponíveis hoje. Se novas informações chegam, elas farão com que o preço suba ou caia de acordo com o impacto esperado no valor da empresa.
Logo, o preço passado de uma ação não tem relação nenhuma com o preço atual, muito menos com o futuro. Uma empresa hoje não é a mesma que foi ontem. Não faz nenhum sentido observar o quanto uma ação subiu ou caiu no passado para decidir se vale a pena comprar essa ação agora.
Assim sendo, um modelo econométrico ultra-avançado e complexo que analisa o que aconteceu com o preço da ação e te cospe uma previsão, mesmo que seja tecnicamente primoroso, no fim das contas, não vai torná-lo um investidor melhor.
Quando as oportunidades costumam aparecer?
Sem mais delongas, é hora de compartilhar quais são os três momentos em que boas oportunidades de compra comumente se abrem.
O primeiro deles é quando, por conta de um pessimismo generalizado (com a economia, com a política, com a bolsa, com um setor etc.), conseguimos comprar boas empresas a baixos preços.
O mercado é maníaco-depressivo. Em momentos de pânico, faz coisas absurdas. A ações de Itausa (SA:ITSA4), uma das mais sólidas e rentáveis empresas da bolsa, chegaram a negociar a menos de 5x lucros no começo de 2016 porque o mercado não era capaz de enxergar uma luz no fim do túnel para a recessão econômica na época.
Um segundo motivo que faz com que boas empresas negociem a baixos preços é quando elas passam por algum problema momentâneo. Nesses casos, é essencial que esse problema seja de fato solucionável (se for uma fatia de mercado que a empresa perdeu e nunca mais vai recuperar, devido à obsolescência de seu produto, por exemplo, não serve).
O objetivo aqui não precisa ser acertar o ponto de virada, é recomendável esperar que alguns sinais de melhora concreta comecem a aparecer nos resultados, mesmo que isso signifique abrir mão de um pouco de rentabilidade.
Por fim, ainda existem os casos em que não há nada de errado com a empresa (ela pode até ter excelentes resultados e perspectivas), mas por algum motivo o mercado erra feio na sua precificação.
Isso pode ocorrer porque a empresa ainda está fora do radar do mercado em geral, por conta de uma forte pressão vendedora (um grande acionista vendendo suas ações, por exemplo) ou às vezes sem nenhum motivo aparente.
Nesses casos, a regra é simples: compre assim que encontrar uma empresa em um bom momento e mal precificada. Aproveite-se do fato de que os movimentos das ações no curto prazo podem ser completamente irracionais (descorrelacionados dos fundamentos).
Por mal precificada, quero dizer negociando abaixo de seu valor com uma boa margem de segurança. Existem basicamente 3 fontes de valor em uma empresa (seus ativos, sua capacidade de geração de lucro atual e seu potencial de crescimento futuro); você precisa identificar adequadamente qual é a fonte de valor e, então, analisar se o preço do mercado parece errado. Logicamente, você vai investir em uma empresa quando sua ação estiver negociando abaixo do seu valor.
Para tal, é possível realizar um valuation – projetar resultados futuros e trazê-los a valor presente (não vou entrar nos detalhes sobre esse método de análise, pois seria necessário um curso apenas para isso) ou fazer uma análise de preço relativo – comparando as qualidades, perspectivas de crescimento e riscos de cada empresa com seus respectivos múltiplos para entender se o potencial de retorno é suficientemente atrativo.
Qualquer que seja a origem da oportunidade de compra, deixo um alerta: cuidado com o excesso de confiança – em si mesmo e em terceiros, numa narrativa criada, naquilo que não compreende ou simplesmente não é possível saber, na crença de inversão ou manutenção da tendência atual do ciclo etc.
E é claro que eu não poderia escrever sobre quando comprar uma ação e não compartilhar a minha visão em relação ao que todos sempre querem saber agora:
É um bom momento para comprar ações no Brasil?
Essa é a pergunta do milhão, e qualquer um que já estudou um pouco de economia vai adivinhar a minha resposta: depende.
Mas quando digo que depende, não estou me referindo a uma possível derrota na batalha pela austeridade fiscal ou de especulações sobre quem vai vencer (ou participar) da corrida eleitoral em 2022.
Na minha visão, são escassas as sinalizações concretas necessárias para que qualquer tipo de análise sobre esses temas leve a uma resposta que realmente tenha fundamento para embasar a sua tomada de decisão no momento.
Assim sendo, quando eu digo que depende, estou me referindo às empresas que fazem parte da sua carteira hoje.
São empresas que possuem dinâmicas próprias de crescimento para continuar se desenvolvendo sem depender majoritariamente do crescimento econômico do Brasil (ou de outro país)?
São empresas que possuem fortes planos de expansão, com saúde financeira e capacidade de execução para transformar planos em crescimento de lucros?
São empresas que estão se aproveitando de uma mudança de hábitos, uma forte tendência de mercado ou que estão crescendo por estarem atuando como consolidadoras de seus respectivos mercados?
As sinalizações do potencial de crescimento são concretas?
Se sim, então você pode aproveitar o recente mau humor do mercado para reforçar suas posições.
É isso que eu venho recomendando!
Um abraço