Copom mais duro, minuciosamente descritivo em relação aos próximos passos, como nunca se viu.
Está mirando não só a inflação, mas também tentando compensar os sinais de descontrole fiscal.
Talvez o parcelamento dos precatórios realmente não tenha nada a ver com a proposta de um Bolsa Família de "mais de R$ 300". Mas certamente tem a ver com outra coisa, bem menos intuitiva: a reforma da Previdência.
Por que a reforma da Previdência foi tão importante para a melhora da percepção da dívida pública?
Os gastos com a antiga Previdência eram explosivos ao longo do tempo — uma curva convexa, apontando para cima. Com a reforma, achatamos a curva, retomando sua concavidade.
Mediante essa conquista institucional, o outlook sobre a dívida pública melhorou muito; não havia mais gastos explosivos no horizonte tangível.
O mercado se preocupa menos com o nível da dívida e mais com sua evolução ao longo do tempo. Em tese, tal evolução estaria domada, mediante a ausência de outras contas explosivas.
De repente, porém, notou-se um comportamento estranho das contas jurídicas, influenciadas pelos precatórios.
R$ 10 bilhões num ano viraram R$ 20 bilhões em um próximo ano, e assim por diante.
A previsão já incômoda de R$ 50 bilhões para 2021 ficou subestimada face a uma conta efetiva da ordem de R$ 90 bilhões.
Ironicamente, esse crescimento dos precatórios vai sendo avaliado pelo mercado como ainda mais perturbador que o antigo aumento dos gastos com a Previdência.
No caso da Previdência, pelo menos tínhamos a aritmética necessária para calcular o tamanho dos rombos futuros, ano após ano.
No caso dos precatórios, as previsões e atualizações parecem sempre sair de uma caixa-preta — e a ideia de parcelamento certamente não ajuda em um problema cuja escala é cumulativa e incógnita.
Fica a sensação de que os gastos públicos brasileiros jamais serão controlados, a despeito da implementação de um teto legal.
Ao fecharmos "N" vazamentos, inevitavelmente surgirá um vazamento "N+1", intangível.
Esse é o momentum corrente em relação às contas públicas — um momentum ruim, e aprofundado pela iminência das eleições, que costumam gerar gastos excepcionais.
Em contraponto, existem também surpresas positivas no controle dos déficits públicos, ainda não precificadas pelo mercado.
Ninguém pode dizer nada em relação ao timing, mas a assimetria de informações, do ponto de vista fiscal, parece tender a uma melhora dos ativos de risco.