O governo da China desde 2005 publica uma lista de indústrias que deseja encorajar, que deseja limitar e que seja banida do país. Na última versão houve a inclusão da mineração de criptomoedas dentre os potenciais setores eliminados. Isso é uma notícia péssima posto que a maior parte dos pools de mineradores está na China. A posição negativa da China a respeito das criptomoedas não é recente e já causou preocupação pelo mercado. Houve banimento de ICOs e exchanges no país asiático, porém a mineração representa mais que a limitação de um mercado, representa uma grande estrutura usada para a manutenção de moedas, em tese descentralizadas, imobilizada por uma única entidade governamental.
Entretanto, não há motivos para pânico só com base na lista. Ela está em consulta pública por 30 dias e ainda pode mudar. Nesse tempo, ainda há a possibilidade do governo chinês mudar sua posição a respeito da mineração. O governo chinês não é exatamente o menos corrupto do mundo, apesar dos eventuais mitos de “os corruptos morrem e as famílias pagam as balas”. De acordo com o índice de corrupção da transparência internacional, a China está na 87ª posição. Provavelmente haverá lobby e, se houver a percepção de que blockchains públicas podem vir a ser importantes para infraestrutura no futuro, então faz sentido manter a infraestrutura de mineração e investimentos no setor. O raciocínio seria basicamente que vale continuar nesse mercado para caso haja a necessidade de interferir em uma estrutura de transferência de capitais internacional, seja por motivos internos ou geopolíticos. Uma análise mais completa pode ser vista nesse artigo.
Podemos ver que, em todos os casos, banimento ou prosseguimento da mineração excessivamente concentrada num país não são desejáveis. Há já uma interação estratégica baseada nas vontades de um agente político que nem sempre se alinha com investidores e consumidores. Se as criptomoedas se pretendem trustless, isso é um problema razoavelmente grave. O mero FUD (período de Fear, Uncertainty and Doubt) ter ocorrido mostra que a concentração geográfica está sendo um problema já atualmente. Obviamente, isso é um risco de cauda e provavelmente nunca se concretizará, porém é uma fonte de preocupação que já se manifesta e pode representar algo análogo a um default para algumas criptomoedas.
Muitos partidários do maximalismo Bitcoin tendem a favorecer a mineração por placas ASIC. De certa maneira, elas têm muitos motivos para serem desejáveis. Em primeiro lugar, elas são mais eficientes. O sonho de “uma CPU, um voto” não é tão verdadeiro porque mesmo com CPUs e GPUs minerando há ganhos de escala de montar rigs mais especializados. Em segundo lugar, com CPUs minerando competitivamente, há chance de ataques por hackers que mineram usando computadores de terceiros. Há vírus especializados em minerar moedas ASIC-resistant usando máquinas infectadas. Isso também não é desejável, dando margem ao chamado botnet mining.
A ameaça da China, portanto, representa algo mais do que meramente uma ameaça no curto prazo. Ela sinaliza uma falha tecnológica que é um gigantesco risco sistêmico no setor nascente. Por agora, precisamos aguardar a resolução da China, apesar de que eu acho que o FUD é passageiro. Contudo, precisamos também estar atentos a longo prazo nas questões regulatórias chinesas. Elas são uma das principais fontes de incerteza sobre o setor. A China é um país pouco transparente, então essa tarefa é árdua. Dito isso, vale a pena acompanhar criptomoedas cuja segurança independe de questões geopolíticas para termos realmente o que nos propomos ao investir nessa tecnologia: a capacidade de transacionar ativos independentemente de confiar nas políticas de governos. Em breve, discutirei nessa coluna opções ventiladas nessa direção, em especial o protocolo Avalanche, Elixir e alguns outros em desenvolvimento.