Tanto no Brasil como nos Estados Unidos, os mercados precificam altas nos juros e depois quedas nos juros. Se essas mudanças têm impacto no longo prazo e acontecem de forma gradual, por que subir os juros para logo depois voltar a caí-los? Se de forma tradicional esse tipo de precificação é sinônimo de erro de política monetária, por que ratificar essa postura? E principalmente, por que os mesmos players que desenham essa curva de juros continuam pedindo mais juros no curto prazo e menos no longo prazo?
No caso da nossa curva de juros, chega a ser quase surreal, termos altas nas próximas reuniões, de cerca de quase 125 pontos base precificados, o que colocaria os nossos juros em 13,00% ao ano daqui a dois encontros. Depois disso, temos uma sucessão de cortes de 250 pontos base ao longo das próximas reuniões, descendo esse patamar para próximos dos 10,50% ao ano em meados do ano que vem.
Isso se torna ainda mais incomum quando imaginamos que a maior parte desses cortes está concentrada depois da definição da corrida eleitoral, quando poderemos ter um presidente fiscalmente instável ou alguém que o mercado não se sinta confortável num primeiro momento. Aliás, também devemos ter um crescimento menor, talvez com uma chance de recessão, mas se os participantes do mercado estivessem vendo isso, por que não pediriam mais prudência do Banco Central (Bacen)?
Além disso, por que desde que o Bacen se tornou independente, ganhando duas novas metas de combate ao desemprego e fomento do crescimento econômico, a Ata de Reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), quem decide as taxas de juros, deixou o espaço para tocar em tais novos e importantes mandatos inalterados, continuando a focar toda a peça na inflação, como se fosse uma fotocópia de um modelo que fazia sentido antes dessas mudanças estruturais?
E por que o mercado americano, mesmo sem respaldo prático nenhum do presidente do Federal Reserve, Jerome Powell, precificou a maior alta de juros dos bonds curtos desde 1973, colocando a curva longa abaixo da curta, já precificando que, como aqui, essa alta que poderá vir será muito alta e os juros eventualmente cairão de novo, mesmo vendo a inflação subindo ainda mais e com um cenário bem complicado pela frente?
CONFIRA: Projeção da taxa de juros do Federal Reserve
As respostas de todas essas perguntas é que os preços nos mercados de renda fixa nem sempre refletem expectativas de políticas monetárias. Muitas vezes, num momento de movimentos bruscos dos ativos, sendo para o lado positivo como para o lado negativo, os mercados de renda fixa se tornam canais para fazerem apostas positivas ou negativas, sendo que por vezes, passam a refletir muito mais otimismo com o país ou com a classe de ativos do que, necessariamente, os caminhos da política monetária.
Além disso, os fluxos de capital, quando concentrados, também têm esse poder. Sejam eles de investimentos ou de emissão de um certo ativo. Em 2020, o Tesouro Nacional brasileiro emitiu tantos títulos pós-fixados (LFTs) que eles chegaram a operar abaixo do preço, refletindo em deságio. Isso, em nenhum momento, queria dizer que o mercado duvidava da capacidade de pagamentos do Brasil, como tal anomalia podia ser interpretada.
Ao mesmo tempo, durante meses, o Federal Reserve chegou a comprar 120 bilhões de dólares por mês de títulos de renda fixa, algo que recentemente acabou na última reunião do FOMC (o Copom americano), e que ainda poderemos ver os impactos nas curvas de juros.
E, por fim, estamos entrando em mares nunca antes navegados em termos de política monetária. Nesse mundo novo, os participantes simplesmente talvez não estejam conseguindo precificar com a mesma eficiência os movimentos das curvas de juros no futuro.