Investir para o longo prazo é difícil por aspectos comportamentais e culturais. O esforço ocorre hoje, mas a recompensa só aparecerá daqui a 30, 40 ou até 50 anos. Com isso, tendemos a negligenciar os benefícios do investimento de longo prazo, “afinal de contas, lá na frente a gente resolve”. Aspectos culturais também jogam contra, em especial o imediatismo consumista ligado ao “querer, ter e financiar”, pois reduzem substancialmente a nossa capacidade de poupar para o longo prazo, bem como supervalorizam em demasiado a nossa demanda de curto prazo.
Aliás, esse equilíbrio entre o hoje (curto prazo) e o amanhã (longo prazo) é, talvez, o maior segredo da vida. Não há fórmula mágica, mas certamente nenhum dos extremos é o caminho certo. Por esse motivo, assim como em quase tudo na vida, o equilíbrio deve prevalecer, valorizando nossa felicidade presente sem jamais esquecer de planejar a nossa felicidade futura. E não podemos deixar que aspectos comportamentais e culturais sabotem esse equilíbrio!
POR QUE VALE (BVMF:VALE3) A PENA INVESTIR NO LONGO PRAZO?
Primeiramente porque, no longo prazo, estaremos em outra fase da vida e valorizaremos muito a tranquilidade e o tempo para aproveitar mais a vida. Claro que curtir a vida com 20 e poucos anos é incrível, mas acredite: ter tranquilidade e tempo para aproveitar a vida aos 60, 70 e 80 anos também é maravilhoso! E para conseguir isso lá na frente, via de regra, é preciso se planejar agora. Quanto mais cedo iniciar seu planejamento, mais fácil e tranquila será a sua jornada. É como alcançar o cume de uma montanha: você terá de subir a mesma altura, mas se puder iniciar a caminhada o mais longe possível, menos íngreme e mais fácil será a subida.
Entretanto, os argumentos não param por aí. Ao investir no longo prazo, o tempo e os juros estão ao seu favor. Com o maior tempo, os juros começam a trabalhar mais e mais por você, gerando ganhos extras, ou seja, acima do que você foi capaz de poupar. E aí está a maravilha do investimento de longo prazo.
QUAL É ESSA MARAVILHA DO INVESTIMENTO DE LONGO PRAZO?
A maravilha à qual me refiro é a forma de crescimento exponencial do seu dinheiro quando investido no longo prazo. Nosso subconsciente (sistema 1 de Kahneman) trata tudo de forma linear. E às vezes funciona, pois muitas coisas na natureza são mesmo lineares. Por exemplo, se em um dia de trabalho, um marceneiro é capaz de construir uma cama, em dois dias é natural que ele consiga fazer duas camas. Nosso cérebro não foi projetado para pensar exponencialmente: ele não consegue imaginar como os expoentes fazem um número crescer. E é justamente isso que está por detrás da maravilha do investimento de longo prazo, tendo em vista que o tempo aparece exatamente no expoente da fórmula matemática que determina quanto você terá no futuro:
Imagine que seu tataravô tivesse deixado R$ 100,00 (sim, apenas cem reais) investidos para você há cem anos. Claro que a moeda era outra, mas isso não faz muita diferença para o que quero ilustrar. Suponha que esse dinheiro tivesse sido investido a uma taxa real média de juros (portanto, acima da inflação) da ordem de 0,8% ao mês. Note que hoje esta taxa soaria elevada, mas ao longo dos últimos cem anos, convivemos por muito tempo com taxas de juros bem acima desta. Logo, a título meramente ilustrativo, tal taxa não é tão distante da realidade não. Você sabe quanto esses R$ 100,00 seriam hoje? Mais de R$ 1,4 milhão. Perceba a maravilha de transformar R$ 100,00 (cem reais!) do seu tataravô em um tataraneto milionário. Teria valido muito a pena, não?
A ideia que quis dividir com vocês é simples e nada inovadora, mas que infelizmente ainda não faz parte da nossa cultura: quanto antes você começar a investir para o seu futuro mais distante, melhor e mais fácil será acumular riqueza. Quanto mais tempo adiante você dispõe, mais os juros poderão trabalhar por você. Por que deixar “para quando chegar lá” e não contar com a ajuda dos juros exponenciais ao longo do tempo? Vou dar um exemplo matador!
Suponhamos dois irmãos gêmeos, Michel Jagger e Kate Richards, com os mesmos salários e padrões de vida. Eles sabem que o INSS não proverá renda suficiente para as suas aposentadorias, logo irão fazer uma poupança adicional para gerar renda extra a partir dos 65 anos, quando pretendem se aposentar. Entretanto, suas propostas para esta poupança de aposentadoria são diferentes. Kate Richards quer poupar R$ 200,00 por mês dos 20 aos 35 anos e depois simplesmente deixar o dinheiro rendendo até completar 65 anos de idade. Obviamente, para acompanhar o efeito inflacionário, ela atualizará o montante anualmente.
Por sua vez, Michel Jagger prefere iniciar a sua poupança de aposentadoria aos 35 anos e realizar, a partir de então, aportes mensais até o início de sua aposentadoria, aos 65 anos de idade. Como Michel pensa evoluir profissionalmente, acredita que conseguirá então aportar o dobro da quantia da sua irmã, ou seja, R$ 400,00 por mês (quantia essa que será devidamente atualizada pela inflação, claro). Michel acha que, por fazer sua poupança com o dobro do valor e ainda pelo dobro do tempo se comparada à sua irmã, conseguirá economizar uma bela quantia para sua aposentadoria.
Ambos os irmãos investem suas poupanças para a aposentadoria em um fundo multimercado bem diversificado e atrelado a um plano de previdência complementar conhecido pela sigla PGBL. Este plano possui benefícios fiscais interessantes, como por exemplo restituição fiscal (que pode chegar a 27,5% do montante aportado) e alíquota de IR de apenas 10% para os casos aqui analisados. Juntando os benefícios e as condições de mercado, eles imaginam uma rentabilidade real de 0,6% ao mês.
Ao completar 65 anos, Kate Richards, que aportou R$ 200,00 dos 20 aos 35 anos, terá acumulado um montante total de quase R$ 560 mil reais. Por sua vez, na mesma data e aportando o equivalente monetário ao dobro do que Kate aportou, dos 35 aos 65 anos, Michel Jagger acumulará pouco mais de R$ 510 mil reais, ou seja, 8,6% a menos do que sua irmã!
O resultado é surpreendente para quem não conhece a maravilha do investimento no longo prazo. Kate conseguiu acumular mais do que seu irmão porque começou muito mais cedo. Esse exemplo nos ensina que o mais importante não é o quanto você poupa, mas o quão cedo você começa a poupar para sua aposentadoria. Para se ter uma ideia da importância de se começar a poupar o mais cedo possível, caso Kate seguisse aportando até os 65 anos, ou seja, por mais 30 anos, ela acumularia cerca de R$ 815 mil. Mas se ela tivesse iniciado sua poupança com 15 anos e parado nos mesmos 35 anos, teria o potencial para acumular R$ 925 mil. Em outras palavras, os cinco anos dos 15 aos 20 anos de idade valem muito mais do que os 30 anos de sacrifício de poupança dos 35 aos 65 anos! Por essa razão, a pergunta correta não é QUANTO consigo aportar, mas sim QUANDO consigo iniciar meus investimentos de longo prazo.
Se você está ainda incrédulo, acredite: não há mágica nem erro nos cálculos, mas sim matemática. Outro ponto interessante é que não se trata de se esforçar mais ou por mais tempo ou ainda de ser “mão de vaca”. O segredo está no poupar da maneira mais eficiente possível, o que implica em iniciar o quanto antes. No exemplo ilustrativo, Kate acumulou 8,6% a mais do que seu irmão para a aposentadoria com a metade da contribuição na metade do tempo. Ou seja, multiplicando-se as metades, podemos concluir que Kate se esforçou apenas 25% do que Michel se esforçou, mas acumulou incríveis 8,6% a mais.
Para mim, soa mais do que natural incluirmos na educação financeira de nossos filhos a ideia do investimento de longo prazo, para que eles já tenham essa cultura e a iniciem o quanto antes para melhor se aproveitarem dos benefícios de se investir no longo prazo. Precisamos revolucionar a educação financeira de nossas crianças! Somente assim construiremos um país com mais educação financeira e, principalmente, com menos desigualdades sociais.
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* Carlos Heitor Campani é PhD em Finanças, Certificado pelo CNPI e Pesquisador da ENS – Escola de Negócios e Seguros. Além disso, ele é Diretor Acadêmico da iluminus – Academia de Finanças e Sócio-Fundador da CHC Treinamento e Consultoria. Campani pode ser encontrado em www.carlosheitorcampani.com e nas redes sociais: @carlosheitorcampani. Esta coluna sai a cada duas semanas, sempre na quinta-feira.