Para esse artigo, quero explicar como a questão fiscal do governo, somado a um momento muito atípico na época, refletiu diretamente em nossos investimentos. Em setembro e até meado de outubro do ano de 2020, tivemos o título federal com rentabilidade negativa. A LFT, ou como conhecemos Tesouro Selic, é um título federal, emitido pelo governo para financiar suas despesas, com rentabilidade pós fixada com indexador na SELIC. Em suma, esse título persegue a rentabilidade da taxa SELIC.
Para quem já comprou Tesouro Selic, através do Tesouro Direto, já notou que o título é “SELIC + 0,XX%”. Ou seja, rende a Selic e mais uma porcentagem bem pequena, o que chamamos de prêmio do título, no jargão do mercado, spread.
No segundo semestre de 2020, mais precisamente entre o 3º e 4º trimestre, tivemos um momento um tanto quanto raro, que foi a rentabilidade negativa da LFT.
Primeiro é preciso entender o motivo do governo emitir títulos de dívida: Na necessidade de pagar despesas, quando a arrecadação é insuficiente para cobrir tais despesas, o governo se financia emitindo títulos de dívidas – também conhecido como títulos soberanos. E isso não é uma exclusividade do Brasil, é assim que funciona no mundo inteiro, em todos os países.
Diante disso, aqueles módicos 2% ao ano pagos aos investidores, já não estavam mais atrativos pelo alto risco de o governo não cumprir o próprio orçamento e na iminência de perder o controle das contas públicas.
Isso fez com que os estoques de títulos aumentassem, ou seja, a demanda por esses títulos caiu bruscamente pela exigência dos investidores por um prêmio maior para compensar o alto risco de problemas fiscais com as contas do governo. Então houve uma marcação a mercado desses títulos.
O título que era “SELIC + 0,02%” já não satisfazia o investidor, então o tesouro aumentou o prêmio para “SELIC + 0,10%”. Isso ocasionou uma desvalorização dos títulos que foram vendidos a “+ 0,02%”, ou seja, o mercado acabou precificando para baixo esses títulos, causando uma rentabilidade negativa para caso o investidor se desfizesse daquele título no dia. Em suma, o preço unitário do título é inversamente proporcional a taxa.
Essa queda no título da LFT (Tesouro Selic) trouxe preocupações ao mercado financeiro quanto a capacidade do Tesouro Nacional de rolar a dívida pública e o constante “flerte” do governo federal com o furo, na época, do teto de gastos. Isso fez com que aumentasse o risco desses títulos e o governo precisou oferecer mais juros para atrair os investidores, assim o prêmio da SELIC foi para “+ 0,3%”, causando uma desvalorização dos ativos na marcação a mercado.
Para mostrar o que foi dito até aqui, o gráfico abaixo mostra a queda na rentabilidade dos títulos:
E o que significou tudo isso? Eu deveria ter vendido meus títulos e voltado para a poupança?! Não. Mesmo isso acontecendo, ainda era, e é, o investimento mais seguro do mercado, com o menor risco possível.
Na época, o melhor a ser feito era ter comprado mais títulos LFTs, reforçando a sua reserva de emergência. Mesmo que, naquele momento, poderia ter assustado até os mais experientes, é uma janela muito pequena – e muito atípica – de tempo e de acontecimentos. Uma ocasionalidade, resultado de uma soma de fatores domésticos e externos, que levou a esse evento de rentabilidade negativa momentânea. Podemos entender que fora um “breve desentendimento” entre o emissor da dívida e o comprador dessa dívida.